terça-feira, julho 26, 2016

O ano ficou resolvido

                Em Dezembro, no último dia do mês, vaticinei que 2015 não tinha ficado resolvido. Havia alguns assuntos que tinham sido adiados para o presente ano.

As eleições intercalares locais, logo em Janeiro, trouxeram mais tranquilidade política à cidade, com a saída de cena de alguns instigadores de politiquice, tendo como lema opor-se a projetos municipais, apenas numa lógica partidária e pouco progressista.

Sensivelmente no mesmo mês, dentro da mesma desarmonia partidária - apesar do parecer, solicitado ao Tribunal de Contas, considerar no mínimo inócuo para o Estado, a devolução da gestão do Hospital à Santa Casa da Misericórdia de S. João da Madeira (SCM) – anunciou-se a reversão da restituição, sem se estudar a fundo as vantagens, ou desvantagens, de outros acordos de gestão hospitalar com outras Misericórdias do País.

De âmbito diferente, de carater mais desportivo, no mesmo texto, fazia votos para que em 2016, a ADS subisse de divisão em Basquetebol, o que veio a verificar-se.

Por fim, o outro assunto abordado, estava relacionado com a natação e com a hipótese de Ana Pinho Rodrigues voltar a ser atleta Olímpica, nos Jogos do Rio de Janeiro.  

A semana passada, no dia 20, ao anunciar os atletas participantes neste grande evento desportivo, que se inicia no próximo dia 5 de Agosto, no Brasil, a Federação Internacional de Natação deixou de fora a atleta sanjoanense, apesar de esta ter alcançado mínimos B. Refira-se que o tempo de prova alcançado abaixo de um determinado valor predefinido são considerados tempos de admissão às competições, designando-se na gíria deste desporto como, mínimos A, correspondendo à entrada imediata nas eliminatórias das provas de Natação dos Jogos Olímpicos. Para os atletas que ultrapassem aquele valor, existe uma segunda barreira de admissão, os mínimos B. Nestes casos, o número de vagas vai depender do número de atletas que tiverem obtido os mínimos A, ou de outros critérios da Federação Internacional, como, por exemplo, os convites para atletas de países emergentes na modalidade.

Sendo certo que Ana Rodrigues ficou de fora dos Jogos do Rio de 2016, é importante enaltecer que a sua performance no último fim-de-semana no Campeonato Nacional Absoluto / Open de Portugal não ficou minimamente afetada por tão má notícia. A atleta da AEJ conquistou três medalhas de ouro e duas de bronze. Subiu cinco vezes ao pódio nas cinco provas que disputou. Numa delas, 50 metros livres, bateu o recorde nacional e nos 100 metros livres obteve um tempo, 55 segundos, que lhe permitiria estar presente no Rio de Janeiro, caso este Campeonato ainda fosse considerado para o apuramento. Um final de época fantástico, com 3 títulos de Campeã Nacional, que não retiram a amargura por não se repetir a façanha de estar presente nos Jogos Olímpicos.  

Desta forma, ao encerrar o período de escrita para as merecidas férias, verifica-se que os assuntos do passado estão praticamente encerrados.

O pouco que se pode esperar deste ano de 2016, já terá um cheirinho a 2017.

Na política local o desenlace das eleições locais, legitimou o executivo a proceder aos investimentos necessários para a execução de obras e outras melhorias, algo que está já a decorrer e assim permanecerá, até ao próximo ano, que como se sabe, terá eleições autárquicas. Este processo ganhará a partir de Outubro uma enorme atenção, com a definição e apresentação dos candidatos e condicionará o quotidiano da imprensa local.

Relativamente ao hospital, nada está concluído. A transferência da sua gestão para a SCM recebe cada vez mais apelos, mesmo escritos, por os cidadãos não se reverem no modelo criado pelo Estado.

O investimento de um grupo económico numa clínica, acrescentando mais interesse privado na área da saúde em S. João da Madeira, retira argumentos aos detratores do acordo da SCM. Aliás contínua a ser redutor para esta instituição, que tem vários protocolos com o Estado, através dos seus Ministérios, julga-la apenas pelo serviço de assistencialismo, ou mesmo de Misericórdia. Relembre-se que a SCM iria fazer a gestão hospitalar de acordo com as exigências do Ministério da Saúde e com uma verba menor.

Convém recordar que o Estado, na assistência de saúde que garante aos seus funcionários, através da ADSE, tem acordos com vários hospitais privados e segundo vários especialistas na matéria, caso não existissem esses protocolos, muitos desses estabelecimentos não estariam a funcionar. O desmascarar desta hipocrisia poderá ser o caminho para inverter a reversão. Só que isso, já não será para este ano.

Para o regresso em Setembro, a cidade estará concentrada nas comemorações do nonagésimo aniversário da elevação a Concelho.

Até lá, votos de boas férias.

 

quarta-feira, julho 20, 2016

Do léxico da política

                Ao escrever o comentário político, dou por mim a utilizar várias vezes as palavras regeneração, requalificação, reabilitação e também, revitalização.

                Pensei tratar-se de alguma deformação pessoal, aplicada à escrita. Passei a estar mais atento aos textos dos outros. Verifiquei que ao ler a imprensa local, vejo várias vezes os agentes da política a pronunciarem aquelas palavras. O mesmo acontecendo com outros articulistas. Nas peças de jornalistas é também frequente a referência aos vocábulos.

Mesmo nas notícias da imprensa nacional sobre as mais variadas autarquias é usual aparecem aquelas quatro palavras, que pressupõem ação.

Ainda julguei tratar-se de um fenómeno da política local, no entanto, com maior atenção, verifiquei que a generalidade dos políticos utiliza verbos começados por “re”. Exemplo, o termo mais usado em 2016, na política nacional, tem sido “reverter”. Outro exemplo, a constante alusão à necessidade de “reformar” o Estado. Além destes exemplos mais comuns, utiliza-se circunstanciado os verbos repensar e recriar. Em matéria ambiental são usualmente referidos ações para reduzir, reutilizar e reciclar.

Existe, portanto, na generalidade da política nacional a propensão para a utilização de verbos com prefixo “re”. Há um léxico político, com o tal prefixo de origem latina. Ora, investigando o seu significado, chega-se ao seguinte resultado: “para trás”, ou seja, repetição. Esta evidência provaria que a linguagem política é tudo menos progressista, ou seja, está imbuída de uma tendência para a regressão.

Neste sentido ao analisar-se o vocábulo “revolução”, cuja origem está relacionada com a Astronomia, ou seja, com o tempo que um astro demora a percorrer a sua órbita, voltando, portanto, ao ponto de origem, verifica-se que o seu uso em ciências como a Geometria e a Física é semelhante, no entanto, em matéria política e social, tudo se altera. Neste último contexto, a revolução pressupõe uma mudança radical dentro de uma sociedade e em termos políticos é uma alteração violenta das instituições de um país.

A evolução do termo revolução, ou os seus diferentes significados, poderia traduzir-se em igual desenvolvimento nos usuais vocábulos da política. O prefixo latino “re” serviria como indutor de mudança. Não bastando qualificar, nem habilitar, nem vitalizar uma área, uma praça, uma rua. Ao introduzir-se o prefixo, está a transmitir-se a ideia de que algo de novo vai surgir, que tudo vai começar do zero – o tal inicio da órbita.

Em contrapartida, analise-se outro termo de origem latina: redundância. Repetições de ondas, no original. Nos dias de hoje pode ter vários significados: pleonasmo; repetição inútil, repetição desnecessária de termos para expressar a mesma ideia; vício de linguagem que consiste em dizer, por formas diversas, sempre a mesma coisa; insistência desnecessária nas mesmas ideias.

Neste sentido, muitas vezes uma reconstrução ou restauro, seja de um espaço ou de um edifício público não se traduz em mais do que isso. Admitir tal pressuposto é redutor, daí que qualquer anúncio de projeto de intervenção política, implica sempre a utilização de uma das quatro palavras mencionadas no primeiro parágrafo, para a ação a desencadear, quando na prática nada disso acontecerá. A redundância será evidente anos depois, pela inutilidade da intervenção.

O léxico da política anda em torno da repetição. A repetição pode estar associada ao começar de novo, ainda assim com tendência para manter trajetórias ou, por outro lado, ao insistir desnecessariamente nas mesmas ideias.

A melhor conclusão é que a política precisa de um dicionário novo.

 

(a publicar no dia 21/07/16)

quarta-feira, julho 13, 2016

O cisne negro

                Resisti durante um mês a escrever sobre o Campeonato Europeu de futebol. Semana após semana, desde 10 de Junho, fui adiando qualquer texto, sobre o desempenho das várias seleções, incluindo a de Portugal. Tento sempre escrever um artigo coincidente com estas provas desportivas de maior visibilidade. Falhei o Mundial de 2014, sobretudo, devido ao prematuro naufrágio Português mas, em compensação, a 10 Setembro de 2015, a propósito de um jogo França – Portugal, ainda que amigável, não tive problemas em evocar o direito de desforra, por todas as derrotas sofridas desde 1984, passando pelo ano 2000 e por 2006.

                Neste Euro fui-me segurando. Apesar das primeiras imagens de França serem semelhantes a episódios que antecederam a Primeira Guerra Mundial, com europeus orientais a atacarem europeus ocidentais e vice-versa, resisti a fazer qualquer analogia histórica, criticando os excessos nacionalistas, associados às claques de futebol. Apesar de a UEFA ter abandalhado o Campeonato, dando entrada a 24 seleções, quando há 20 anos, disputado por 8, era sem dúvida, o Campeonato mais competitivo do planeta, abstive-me de fazer comentário, até porque Portugal beneficiou com este sistema, devido ao apuramento com o 3º lugar na fase grupos. Ainda nesta fase, embora seja agora mais fácil escrevê-lo, tive o pressentimento que poderia haver um “outsider” a vencer o Campeonato, saindo esse hipotético vencedor de um lote de seleções em que incluía Croácia, Bélgica, Portugal e País de Gales - estes apenas pelo equipamento, claro… enfim, nem as cores galesas me convenceram a quebrar o silêncio.

                Com o apuramento garantido à Italiana, com um naipe de jogadores experientes, esqueci o desalento dos primeiros empates da seleção Portuguesa e passei a sentar-me em frente à televisão com outro espírito. Habituei-me a ver o cinismo transalpino, germânico (e mesmo o argentino) e fui defendendo em tertúlias de amigos, que só a defender bem é que Portugal teria hipóteses de vitória. Depois foi dada a oportunidade ao miúdo da Musgueira e a emoção superou a racionalidade, dando comigo a terminar os jogos de pé colado ao televisor, quer fosse em casa ou em estabelecimentos abertos ao público, recebendo conselhos de desconhecidos, para me acalmar.

                No dia da Final, durante o jogo, recebi um sms às 20h 52m, portanto, no intervalo do jogo, com o teor que me surpreendeu, “o Éder vai entrar nos últimos quinze minutos e vai marcar o golo da vitória. É a história do patinho feio”. Eu ainda estava preocupado com o meio-campo sem velocidade a defender, com as grandes defesas do Rui Patrício, sabia que ainda faltava uma bola no ferro e já tínhamos o Cristiano Ronaldo lesionado, contudo, achei que sim e partilhei a informação com quem assistia ao jogo comigo. Ouve quem se risse, quem não acreditasse e muitos disseram, “se calhar”. A fezada era igual à de muitos, sobretudo daqueles que, como eu, tinham defendido o rapaz da Adémia, de ataques tardios sobre a sua capacidade de ser selecionável, contra-argumentando com a boa época por si efetuada no campeonato nacional de França, com seis golos marcados, além de ter sido considerado a melhor aquisição no mercado de inverno pelo seu desempenho naquele campeonato.

                Tudo isto terá pesado a Fernando Santos. A partir da última substituição, o jogo de Portugal ficou mais estendido. A emoção redobrou e a querença, sempre que Ederzito tocava na bola, passou a dominar o momento. Todos queriam ver a sua metamorfose no belo cisne negro.

                Podemos argumentar sempre que o fado lusitano se repetiu: infortúnio – com a lesão de Ronaldo; sorte – com a bola no ferro no último minuto; e audácia – um remate inesperado a surpreender o adversário.

Com outra visão, podemos verificar outras qualidades nas nossas vitórias: excelente rigor táctico – 4-4-2, com dois avançados móveis, bem executado, não dando espaço ao adversário, evitando a aproximação à nossa baliza; grande união entre os jogadores – nunca se viu uma discussão em campo e qualquer golo era festejado efusivamente por toda a equipa; boa preparação física – 3 prolongamentos em quatro jogos, jogados em quinze dias; excelente liderança em campo – e até fora dele, como se viu no prolongamento da Final – pelo capitão; magnifica leitura do jogo do selecionador – substituições arriscadas e conseguidas, operando-se mudanças tácticas eficazes, confiando-se nas capacidades dos jogadores lançados.

                Portugal vingou o passado. Ao tornar-se Campeão Europeu de futebol, virou uma página do desporto nacional e a forma como foi conquistado o título, permite encarar as próximas competições com outra motivação e com expetativa elevada.

 

(a publicar no dia 14/07/16)