quarta-feira, fevereiro 22, 2017

Volatilidade

                Com o aproximar do final de Fevereiro, era suposto haver alguma divulgação acerca dos candidatos à Câmara Municipal de S. João da Madeira. A pouco mais de seis meses das eleições, se descontarmos o mês de Agosto, habitual período de férias, o tempo começa a ficar apertado para os novos candidatos. Para adquirirem credibilidade eleitoral, aquelas etapas iniciais, de apresentação pública, visita prévia às instituições locais, contacto com a população nas ruas e espaços públicos da cidade, terão que ser planeadas de forma acelerada, com prejuízo para os candidatos pouco conhecidos, relativamente a quem já está instalado na política local, sendo por isso, perfeitamente assimilados pelos eleitores.

                Surpreendeu por isso, por ser em contraciclo, a divulgação, em período pré-eleitoral, do auto afastamento, por renúncia de mandato, de dois vereadores do partido da oposição ao executivo municipal. Podendo tal facto significar a impossibilidade de se tornarem candidatos em Setembro deste ano, o que resultaria no abandono da vida política local ao fim de quatro anos. Ora, tal facto, para quem em tempos foi assessor do executivo de Castro Almeida, índicia uma prática de relação com a vida comunitária apenas na ótica partidária.

                A dicotomia política não se resume à separação ideológica entre esquerda e direita, ou vice-versa. O centro encontrou uma fórmula nova: a distinção entre progressistas e conservadores. O candidato independente às eleições presidenciais francesas, Emmanuel Macron, encontrou aqui a sua tábua de salvação para contrariar os extremismos que a velha dicotomia originou, com as respetivas derivas populistas e que estão a lançar o pânico no mundo Ocidental.

Na política local, as diferenças são outras e a maioria das vezes podem-se resumir à volatilidade versus cristalização. Nada melhor do que um exemplo para ajudar a perceber esta classificação. O falecido professor Josias Gil foi candidato autárquico em 1997 e em 2001. Quando terminou o seu mandato, continuou a participar na vida comunitária, quer lecionando, quer participando no grupo de teatro, ou através da vida associativa – foi presidente da delegação local dos Rotários (opto pela designação abreviada, para poupança de carateres), ou escrevendo nos jornais e editando livros. Poderia prosseguir, recordando o seu regresso à política ativa e o reconhecimento pela maioria dos agentes da política local, do seu desempenho enquanto Presidente da Assembleia Municipal. Um exemplo de uma longevidade política e um grande envolvimento na comunidade.

Existem mais casos e vários exemplos de membros de vários partidos com uma longa carreira política, associada à sua vida profissional e à participação em várias associações locais. São, portanto, os políticos enraizados na sociedade, que dão garantias de continuidade aos partidos em que militam e promovem uma política de proximidade para com a população, por participarem ativamente na sua vida comunitária.

A tal vertente de cristalização, em contraste com a volatilização. Esta última definida, de modo simples, pela ação dos políticos que à primeira oportunidade desaparecem da participação na comunidade. Há aqueles que prosseguem a sua carreira política com outras ambições e desempenhos, quer em cargos nacionais ou internacionais, que não podem ser confundidos com outros que desaparecem ou fim de alguns anos, não deixando rasto, nem se envolvendo nas Associações de Pais, ou nas desportivas, ou culturais, ou de solidariedade social. Ou mesmo criando outras formas de intervenção, pondo em prática muito daquilo que defenderam durante os anos precedentes, só que desta vez com ação.

As comunidades têm sempre lugares para todos. Haja vontade em permanecer e contrariar o julgamento popular, que se pode reduzir pela frase repetida exaustivamente ”eles o que querem é um tacho”.

(a publicar no dia 23/02/17)

 

quarta-feira, fevereiro 01, 2017

O Comboio Urbano

A expansão do cartão “andante” para outros transportes da Área Metropolitana do Porto, incluindo o Vouguinha, poderá ser o primeiro passo para a hipotética reabilitação da antiga linha do Vouga.

O Vouguinha carateriza-se atualmente pelos dois ramais dos seus extremos: Espinho – Oliveira de Azeméis a norte e Aveiro – Sernada do Vouga. Longe vão os tempos da ligação da cidade vizinha ao sul e ainda mais longínqua é a memória da viagem até Viseu, serpenteando o rio que batizou a linha. Do passado permanece a bitola de via estreita, de largura métrica, praticamente a única do país, que tem como enraizada a distância entre carris de 166 centímetros, a chamada bitola ibérica. Outra caraterística desta linha são as suas composições, agora grafitadas, com as imagens suburbanas em movimento, como bem o expressou a pintora Maria João Gabriel.

Para os passageiros do Vouguinha, a expansão do “andante” só terá significado se houver ligação direta à cidade do Porto. As particularidades da linha, como vimos, são limitações para a sua integração na rede de transportes da Área Metropolitana do Porto. O terminar a Norte em Espinho é um contratempo, obrigando a um primeiro transbordo de transporte, que não é muito prático, para quem quer deslocar-se para o Porto, com o tempo contado.

Durante anos, o deslumbramento da região Entre Douro e Vouga foi transformar a linha do Vouga num metro de superfície. A hipótese de expansão do Metro do Porto para sul e o aproveitamento do corredor Espinho – Oliveira de Azeméis, tal como se fez com a linha da Póvoa (e chegou a projetar-se para a linha da Lousã, nas imediações de Coimbra) era a hipótese mais ventilada. Só que o Metro do Porto estacionou em Santo Ovídeo e o seu avanço para sul não é certo que seja para o litoral – o próximo passo será muito provavelmente chegar a Vila D’Este, com 17.000 potenciais clientes. 

Descartada a aproximação do Metro, é importante dar outra dimensão ao que resta da linha do Vouga, ou se quisermos ser mais precisos, ao seu ramal Norte. Enquadrar esta linha dentro dos comboios urbanos que servem a cidade do Porto é a solução mais lógica. Atualmente temos 4 linhas urbanas: a de Aveiro (coincidente com o troço da linha do Norte), a de Braga, a de Guimarães e a de Marco Canaveses. Acrescentar uma linha Porto – Oliveira de Azeméis é a opção mais fácil de entender e provavelmente a com menor custo de execução.

A existência de um traçado e de estações definidas permite enquadrar a futura procura desta ligação ao centro do Porto, com base na população residente nos concelhos ao longo do percurso e chega-se com facilidade a uma população alvo de aproximadamente 200.000 habitantes.

A distância entre a Linha do Norte e o Vouguinha, em Espinho, é menos de 100 metros. O início do túnel ferroviário, que carateriza Espinho, a sul, é precisamente encostado à estação da linha que une os concelhos do Entre Douro e Vouga. Significa isto que a ligação entre as duas linhas não será onerosa e não tem habitações entre elas. Existindo traçado, não é necessário expropriar. Além disso, já estão definidas as pontes, as passagens de nível e outras particularidades ferroviárias e como o alargamento entre bitolas é de 66 centímetros, não é de todo impossível incorporar composições mais rápidas, devendo para isso eliminar-se algumas anormalidades como a passagem de automóveis sem cancela e sem guarda, em curvas de baixa visibilidade.

Mesmo o aumento de composições na Linha de Norte, entre Espinho e Porto não deve constituir problema para a CP, sempre solícita a responder aos pedidos dos adeptos dos clubes de futebol, no frete para deslocação a jogos. É importante referir que a Norte da cidade do Porto os comboios urbanos, das três linhas mencionadas, seguem pela mesma via, até Ermesinde, desviando-se nesta localidade a linha do Marco. E mais a norte, em Lousado dá-se a bifurcação para Guimarães. Mesmo a linha que segue para Braga, surge de uma bifurcação em Nine, situada na Linha do Minho (Porto-Vigo).

Ora, se a norte do Porto foi possível conciliar várias linhas, também a sul não haverá problemas em acrescentar alguns horários ao tráfego ferroviário da Linha do Norte, fazendo uma bifurcação em Espinho.

Uma rede de transportes ferroviária, a sul do Porto, é vital para a integração na Área Metropolitana do Porto da população residente nestes concelhos mais periféricos. A facilidade de movimentação da população, com transportes mais rápidos, sem necessidade de utilizar o automóvel, ou uma sucessão de transportes coletivos, permitirá fixar mais residentes nestes concelhos da região do Entre Douro e Vouga.   

A evolução da linha do Vouga para comboio urbano, será o fim do suburbano Vouguinha no norte do distrito de Aveiro. Ficará consignado às ligações de Águeda à capital de distrito. Contudo, pela sua importância, terá um lugar na memória coletiva da população sanjoanense. 

 

(a publicar no dia 02/02/17)