quarta-feira, março 25, 2015

Botas, edredões e outros excessos

                É reconhecida a pouca confiança que os portugueses têm nos seus políticos.

                Os acontecimentos dos últimos quatro meses, envolvendo um ex-primeiro ministro e o atual, traduziram-se na evidência do enriquecimento pessoal – num caso supostamente ilícito e no outro, assumidamente para pagar dívidas antigas – contribuindo para aumentar a desconfiança dos eleitores perante os eleitos.

O descrédito da classe é tal que um estudo publicado nos últimos dias, indicou o comentador professor Marcelo Rebelo Sousa, afastado das questões partidárias há 16 anos, como o político em que os portugueses mais confiam.

A partidarização da democracia portuguesa é apontada por muitos, como a principal causa do atraso da nossa sociedade.

                Para atenuar este argumento, aponta-se as justificações históricas, baseadas na pouca idade da democracia, procurando-se desculpar todos os erros dos militantes partidários na condução do Estado Português.

                Atualmente, surgem teses justificando a pouca preparação desses militantes, explicando-se que a opção pela militância partidária, é extremamente semelhante à escolha pelo clube de futebol. Existe todo um lado irracional, evidenciado no comportamento dos militantes. Pela observação das bancadas parlamentares, quer assistindo a debates televisivos, ou mesmo acompanhando algumas autarquias e jornais locais, chega-se à conclusão que na maioria das vezes, a militância não respeita o adversário… tal como as claques de qualquer clube também não o fazem.

Não sendo certo que possa ser apontado como postulado: a primeira escolha ainda na infância é clubista. Só com o avançar dos anos e em idade mais madura, é que a política começa a interessar e a identificação com algum ideal passa a realizar-se. Também aqui, é possível justificar a reduzida exigência política da sociedade portuguesa, pelos anos da ditadura militar, em que os cidadãos podiam simpatizar com um clube e não tinham as mesmas hipóteses em questão de militância, salvaguardando-se a clandestinidade.

Se por um lado, a detenção de políticos devido à mediatização dos processos, oferece hipótese aos defensores dos direitos dos reclusos, de fazer pressão junto do poder legislativo para alterar essas condições, tornando-as mais humanas, não existe a mesma pressão da sociedade civil exigindo uma moralização no acesso à carreira política.

A crise moral em que Portugal mergulhou obriga a condicionar a carreira política.

Qualquer cidadão para fazer negócio com o Estado, é obrigado a apresentar uma certidão de isenção de dívidas ao fisco e à segurança social. Não se entende, como qualquer candidato a deputado, ou mesmo a autarca, não tenha que fazer a mesma prova.

   Se o enriquecimento ilícito precisa de ser legislado, é obrigatório que o dia-a-dia dos nossos governantes seja mais moderado. Não se entende como qualquer Secretaria de Estado tem carro “preto”, com vários motoristas, com direito a viagens para o fim-de-semana, entre outras mordomias. 

Aliás, este é o ponto.

Os excessos da Administração Pública jamais foram sujeitos a contenção, nos últimos 4 anos. Enquanto isso, os portugueses…

 

(a publicar no dia 26/03/15)

quarta-feira, março 11, 2015

Danças e cantares

                A identificação das regiões de Portugal sempre se baseou em conceitos geográficos, históricos e climatéricos. Na caracterização dessas regiões sobressaía a pronúncia da população, as tradições etnográficas, as habitações, a gastronomia, entre outras.

                Num país pequeno, a diversidade entre cada região causa perplexidade. Viajando poucos quilómetros, a paisagem natural altera-se, a oferta culinária torna-se diferente e os vinhos têm uma denominação de origem própria.

As diferenças não ficam por aqui, embora hoje em dia não sejam fáceis de identificar.

Pesquisando-se, encontram-se as antigas tradições de cada região: as habitações adaptadas ao clima e à atividade económica; o vestuário típico; as ancestrais industrias ou as manufacturas; ou simplesmente a artesanal agricultura; não se esquecendo as danças e os cantares, além dos contos populares e outras formas orais de transmissão de histórias.

O perpetuar dessas tradições encerrou-se em museus etnográficos ou industriais, numa ou outra habitação reabilitada, posteriormente requalificada e nos grupos de folclore existentes pelo país fora.

    A recolha destas tradições musicais, começou a ser efectuada por etnomusicólogos oriundos de outras paragens e mesmo estrangeiros. O mais conhecido foi Michel Giacometti, oriundo da Córsega, que iniciou na década de 60, do século passado, a gravação de músicas populares, percorrendo, para isso, o país. Ficou para a História a apresentação, durante a década de 70, do seu programa “Povo que canta”, exibido pela RTP, durante 3 anos.

Desde o inicio do presente ano, a RTP, no seu segundo canal, exibe o programa “Povo que ainda canta”. O seu autor, Tiago Pereira, repetiu, mais de quarenta anos depois a fórmula da recolha da tradição popular.

Além de aspetos regionais, agrupados por programas temáticos, explicando a introdução do fandango no Ribatejo, ou a introdução do acordeão no corridinho algarvio, existem pesquisas reveladoras da diversidade musical de cada região, em especial, com a exibição de instrumentos rudimentares, produzidos por verdadeiros artesãos e com tocadores apenas dessa determinada área.

Por outro lado, a difusão de alguns instrumentos, como a concertina, na música popular do norte ao sul do país, identifica a ligação de um povo com a sua música. Existem outras características comuns como o cantar ao desafio, conhecida a norte como desgarrada e a sul como despique.

No programa televisivo, em cada nova edição, aparecem sempre factos surpreendentes.

Numa nova era, num século novo, com o turismo a ser um grande contributo para a economia nacional, esta pesquisa musical, pode ser um grande contributo para a oferta turística de cada região. Um complemento ao pacote fornecido, podendo-se intercalar viagens ao interior, com experiências musicais únicas, incluindo-se provas de degustação, contemplação de paisagens e conhecimento dos hábitos humanos, mencionando-se os laborais, de um povo que por infelizmente ter vivido isolado, conseguiu preservar a sua cultura.

Finalizo, informando que o programa é exibido à 5ª-feira, pelas 23 horas. Ou seja, no dia da publicação do jornal.

Divirta-se ao som dos cantares nacionais.  

 

(a publicar no dia 12/03/15)