sexta-feira, dezembro 27, 2013

O ano em revista

         Na última edição de 2013 proponho-me a fazer o balanço de um ano que foi muito marcado pelas eleições autárquicas de Setembro.

            Recordando as edições impressas dos jornais locais, houve importantes inaugurações, nomeadamente da Casa da Criatividade e da Oliva Creative Factory, incluindo a devolução à cidade dos espaços da torre da antiga metalúrgica.

            O poder autárquico prosseguiu com a ampliação da zona industrial e com a renovação do parque escolar, finalizando a modernização da Escola básica das Fontainhas.

            Os feitos desportivos dos atletas, das mais variadas associações locais, receberam o devido destaque. Sendo importante referir que tanto em modalidades tradicionais, como em modernas sem ainda reconhecimento olímpico, os desportistas da cidade conseguiram excelentes desempenhos, a nível regional, nacional e internacional. Um sinal compensatório para quem se dedica diariamente ao treino, abdicando do conforto doméstico, comprovando a essência do ecletismo no desporto local.

            Voltando ao tema político, o período da pré-campanha às eleições de Setembro começou antes da nomeação de Castro Almeida para secretário de Estado. A sua substituição causou perplexidade. O vereador, eleito como número dois em 2009, assumia democraticamente a presidência da Câmara. Ricardo Figueiredo, um mês após ser anunciado como candidato do PSD à autarquia, atingia o lugar, sobre um coro de incompreensíveis protestos.

            A pré-campanha continuou a merecer o destaque da imprensa, até ao mês de Julho. A apresentação dos seis candidatos ocupou outras tantas semanas, não se destacando um discurso diferente, normal neste período, das promessas vãs, para captar descontentes.

            Uma sondagem lançada no princípio de Agosto retratava os meses antecedentes. Nos primeiros dias de Setembro tudo mudou. Ao jeito da fábula da formiga e da cigarra, os partidos e movimento independente passaram a fazer o trabalho de campanha, o porta-a-porta, a criar factos para manchete dos jornais, a apresentar candidatos, programa eleitoral e a mostrar capacidade de mobilização. Um trabalho sério que alterou o sentido de voto, como ficou demonstrado na sondagem publicada, quatro dias antes das eleições, pelo jornal labor.

            Os resultados eleitorais comprovaram a aproximação prevista na última sondagem. Perante tal cenário, à boa moda nacional, todos reclamaram vitória. Os que ganharam, os que perderam, os que foram eleitos e os que não foram… Um facto que condicionou o período pós eleitoral.

Os dois meses seguintes à eleição têm sido intensos. A atividade partidária intensificou-se. Os acontecimentos das reuniões de Câmara, da Assembleia Municipal e até da Assembleia de Freguesia provocaram comunicados, esclarecimentos e troca de acusações. Esgrimiram-se argumentos, num tom pouco saudável, para os leitores ajuizarem. Um clima pouco pacífico, surgindo num texto uma acusação de fascismo a um partido de esquerda. Algo inédito na democracia portuguesa, que não mereceu qualquer repúdio veemente dos dirigentes locais desse partido, ao contrário de outras picadelas, com acusações menores.

A guerrilha política prolongou-se para as páginas on-line dos jornais locais. Comentários anónimos surgiram antes da eleição a apoiar uns e a repudiar outros. Longe dos olhos da maioria dos leitores, estes comentários são uma forma cobarde de fazer política. O refúgio no anonimato, ou num falso nome, demonstram uma falta de carater para quem usa essa técnica para atacar os outros. A sua publicação não isenta de culpa as redações dos jornais, que optam por dar cobertura a esta forma de atuar, não colhendo qualquer benefício deontológico, apenas promovem um clima de conspiração, a roçar a provocação e perto do insulto.

A contrastar com tudo isto, temos a atitude silenciosa do Presidente da Câmara. Sem se esquivar ao confronto, Ricardo Figueiredo vai-se habituando a viver sem maioria, uma estratégia que coloca demasiada pressão sobre a oposição. Escrevo sem saber em que ponto está a aprovação do Orçamento para 2014, no entanto, a maioria dos eleitores espera o cumprimento do mandato até 2017. Qualquer antecipação das eleições, um cenário desejado por muitos, pode ser penalizador para quem cobiça, no entanto, a estratégia de fazer oposição quatro anos, pode trazer resultados catastróficos, como o verificado entre 1997 e 2001, pelo atual partido da oposição. Um cenário em que viveu o PSD de 1985 até ao final do século.

Dilemas…

Já entrei em capítulo de projeção, por isso, é o momento de desejar um Excelente 2014 aos leitores.

Recordo as minhas palavras da semana palavra, a edição destes meus textos passará a ser irregular, por isso, além dos votos acima enviados, aproveito para me despedir da mesma forma que outros dois cronistas do labor: um abraço e até já…   

                 

(a publicar no dia 27/12/13)

quarta-feira, dezembro 18, 2013

No prelo

            Alfredo Mendes, professor de história, prepara os fundamentos do seu estudo acerca das capelas imperfeitas. As inacabadas do mosteiro da Batalha. A inviabilização da sua conclusão, ao longo dos séculos, parece-lhe um absurdo histórico. A degradação do Panteão do rei D. Duarte atormenta-o, induzindo-o a preparar um ensaio sobre a incompreensão nacional, perante o herdeiro do Mestre de Aviz.
            As suas pesquisas são efetuadas entre o lecionar de aulas e a vida doméstica. A vida em família torna pacato o dia-a-dia, na companhia da esposa Helena e dos seus dois filhos. Helena, por sua vez, é professora de português, na mesma escola de Alfredo, sendo caraterizada pela sua sensatez. Os silêncios de Helena caraterizam-na, assim como, o seu belo rosto e um corpo cuidado, em que a idade parece não passar.
            Alfredo reencontra Augusto, antigo colega de curso de Helena, amigo da família que faz muito tempo não frequenta a casa deles. Três anos, precisa Augusto, sem mais explicações. Augusto é jornalista. Afastado do rebuliço da redação, procura temas alternativos para as suas reportagens, a publicar em suplementos semanais de um jornal nacional de grande tiragem.
A acompanhar Augusto, está Prezado, também ele seu colega de curso. Prezado é convidado do seu amigo durante um fim-de-semana. Procurou-o a fim de recolher informação sobre os escritores Júlio Dinis e Ferreira de Castro, visitando as suas casas museus. O seu objetivo é lançar uma ideia, a nível do país, para perpetuar o nome e as obras dos escritores nacionais.
Augusto nesse fim-de-semana vive uma série de peripécias que lhe condicionam as suas relações. Além do reencontro com Alfredo, no qual sente o desafio de obter uma explicação, para um dado inserido no prospeto de um monumento, Augusto é cumprimentado por uma desconhecida, corredora matinal como ele. Compenetrado, o jornalista responde-lhe, sem reter o passo. Ao aperceber-se do lapso, procura-a pelo perímetro do parque e não a encontra. Para completar as peripécias, Augusto, por não ter comunicado a presença de Prezado, evita a sua namorada. Ana é enfermeira, amiga confidente de Helena e uma troca da folga no hospital, coloca-a inesperadamente no mesmo centro comercial que Augusto (…)
Estas personagens vão ocupar-me nos próximos tempos. Os momentos de escrita vão ser passados em torno do enredo atrás descrito. Augusto procurará desesperadamente a corredora enigmática, vivendo com a sombra de Ana e da amiga de ambos, Helena. A aproximação a Alfredo Mendes, devido às incursões na história, fá-lo estar próximo do casal, como nos tempos da pós-graduação, fazendo reviver momentos não muito bem ultrapassados, entre Augusto e Helena. Para complicar mais a vida de Augusto, Prezado instala-se mais vezes em sua casa, não lhe dando sossego para ponderar a sua vida, nem para prosseguir a sua investigação, com fundamentos de pesquisa histórica.
Semanas, meses, muito será o tempo em volta de pormenores narrativos, dando às personagens uma configuração humana, dentro da tipologia pretendida. Por isso, a escrita no jornal passará a ser de periodicidade descontínua e não prioritária. Não fecho a colaboração, apenas interrompo a regularidade, como a mantida no presente ano.
Os meus votos, adequados à quadra natalícia, são devidamente enquadrados no suplemento deste jornal alusivo à época. Convido o leitor a percorrer essas páginas.
Para todos, votos de Bom Natal. 
 
(a publicar no dia 19/12/13)

sexta-feira, dezembro 13, 2013

Natal

                Quem escreve um texto alusivo ao Natal corre sempre o risco da apreciação moral. Existe uma curiosidade do leitor em descobrir as intenções espirituais do autor do texto, ou em descobrir hábitos familiares. A exposição de alguma privacidade dos rituais das festividades, como, por exemplo, a ementa da ceia ou os presentes trocados durante a noite são predicados de fanfarrice, que são relevados para um plano secundário na quadra natalícia.
                 A tendência de quem escreve é encontrar uma originalidade, uma forma criativa, para fugir aos estereótipos dos textos da época, sem cair na fórmula simples dos apelos às tradições simples, ao lado religioso, ao espirito solidário e fraternal do Natal, sem esquecer a festa da família.
                Fazer uma citação é outra das fórmulas de escrita possível. Evocar a propósito o Papa Francisco, o pontífice apreciado pelos descrentes, sempre prontos para apontar erros expiados e encontrar nas ações e palavras do cardeal argentino a originalidade esquecida do cristianismo, é uma referência pouco original.
                Explicar que mesmo em época de crise, a troca de presentes não é um ato discriminatório e pode ser um incentivo à economia e à melhoria da condição dos comerciantes, bem como, de alguns produtores, todos eles empregadores nacionais, é uma posição demasiado redutora para um texto, que se pretende diferenciador.
                Por isso, se o leitor não espera encontrar nada do que atrás mencionei, pode continuar a leitura.
                Vivi sempre a noite de consoada, distante da minha terra natal. Primeiro, nos anos da infância, da adolescência, incluindo os de conflito geracional e os de indiferença religiosa, mais alguns enquanto adulto, num ritual que começava no dia 24, depois de almoço e terminava a 26. Depois já casado e agora com filhos, apesar da mudança de destino, o Natal foi sempre passado em harmonia familiar, em convívio das várias gerações.
Para mim, o Natal não se resume à festa familiar. Sou daqueles que ainda envio sms aos amigos, pela noite fora, por sentir a distância da fraternidade. Recordo o jantar de 23, com um saudosismo especial. A ceia de amigos, com momentos disparatados, em restaurantes inesquecíveis. Quando tenho oportunidade, ainda corro nessa noite para S. João da Madeira, à procura de todos, encontrando alguns.
Nunca vivi as tradições comunitárias. A pouca frequência da aldeia da minha mãe, confinava-me para o interior da casa. Agora, durmo numa aldeia que não habito, estando sem raízes. Por isso, o Natal é casa.
É a festa do lar.
Os preparativos, desde o início do advento, a espera durante a tarde, assistindo ao filme infantil, ou a uma grande aventura, até à chegada dos primeiros membros da família. Aconchegados, cumprimos os rituais da quadra, à volta da mesa, que conforme o número de familiares presentes a cada refeição, tanto se estica, como se encolhe, obedecendo também à lei natural da vida.
Qualquer alteração ao guião natalício é sempre atendida com desconfiança. Ainda assim, das propostas que vão surgindo, assistir à missa do galo é um desafio tentador. Uma curiosidade que tenho desde criança, da época em que o sapatinho se enchia durante o sono noturno e apenas na manhã do dia 25 se procuravam os presentes.
Épocas diversas, o mesmo conceito.
Comunidades perdidas, religiosidade alterada, sempre com as famílias presentes e reestruturadas. No fundo, é esse o contributo do Natal, o reforço do principal pilar da sociedade.
Bom Natal para todos.
 
(a publicar em suplemento do jornal labor, no dia 19/12/13)
 

quarta-feira, dezembro 11, 2013

O princípio das causas atuais

                A regressão industrial, verificada na cidade nos últimos dez anos, permitiu melhorar a sua qualidade ambiental.
                A diminuição da pressão industrial teve como consequência a libertação de espaços no perímetro urbano. A legislação ambiental, por seu lado, cada vez mais rigorosa, implicou o encerramento de empresas com práticas poluentes, ou obrigou à deslocalização para zonas industriais.
Hoje, poucas são as indústrias existentes no centro da cidade. Das que existem, não são visíveis emissões gasosas, nem descargas de efluentes. Apenas subsistem os resíduos sólidos para os quais o Estado criou soluções de recolha, tratamento e valorização.
Está presente nas imediações da Oliva Creative Factory a cor ferrugenta, que a antiga metalúrgica emitiu nos seus últimos anos de laboração. Ficaram para o passado as cores, os vapores e os odores da ribeira da Buciqueira, no trecho situado a jusante da antiga Empesa Nacional de Chapelaria.
Do outro lado da cidade, existe um esforço municipal na despoluição das águas do rio Ul.
A circunscrição da atividade industrial às zonas existentes no lado nascente e sul da cidade, ficou bem definida com instalação, numa das margens do rio Ul, do parque municipal e com o futuro aproveitamento de outros troços ribeirinhos.
Dois exemplos de boas práticas ambientais promovidas pela autarquia, às quais se deve juntar a valorização dos resíduos separados nos ecopontos e a captação de fundos comunitários, para diminuição do consumo de energia elétrica em equipamentos públicos.
Reciclagem e redução, dois dos princípios da sustentabilidade ambiental.
O equilíbrio ecológico atingido na cidade marca o fim de uma era de industrialização descontrolada, sem cuidados com os recursos naturais, com contaminação de solos, com emissão de partículas poluentes, com o depósito de resíduos industriais e de outros provenientes da construção e também resíduos domésticos em qualquer floresta de acesso fácil.
Boas práticas poderão desenvolver a cidade para patamares ecologicamente sustentados. Idealizando-se a frota municipal maioritariamente com veículos híbridos, por exemplo. Por seu lado, os equipamentos públicos da cidade, a continuar o investimento gradual para a diminuição do consumo energético, podem tornar-se pouco dependentes. O mesmo pode acontecer com a iluminação pública noturna, a combinação entre sensores, painéis solares e micro aerogeradores serão suficientes para garantir a independência energética.
Projetos a longo prazo.
A reutilização é a chave do triângulo ecológico. Hábitos antigos que se perderam nos tempos modernos. O novo supera o reutilizado. Gastando-se recursos, ou não os aproveitando. Veja-se a água pluvial, entubada e encaminhada para o coletor intermunicipal, sem qualquer processo de decantação. Separadas, tratadas e armazenadas, essas águas poderiam servir para rega de jardins e relvados municipais. Ou mesmo, garantir o abastecimento às futuras hortas do projeto municipal, em tempos ventilado.
                O aproveitamento de algumas fontes é outra boa prática perdida no tempo. Um levantamento dessas nascentes é um regresso às origens rurais da povoação. Permitindo que se mantenha viva a história de S. João da Madeira, recordando as suas tradições, os seus costumes, que não se iniciaram no ano da emancipação concelhia.
                O mesmo acontecendo com o nome dos lugares. Bastou-me, no texto publicado na semana passada, ser um pouco mais provocante, na procura do lugar Escarigo em S. João da Madeira, que fui logo informado, que entre Casaldelo, Fontainhas e as Corgas, onde hoje se situam as ruas do Brasil e de Angola, ou seja abaixo de S. Estevão, esse lugar tinha precisamente o nome de Escarigo. Uma descoberta simples, possível de confirmar através da enciclopédia luso-brasileira da Verbo. Relativamente à ponte mencionada nas inquirições de D. Afonso III, vou tentar perceber a lógica dos lugares da cidade, para perceber a localização, no entanto, descobri que a palavra “terrenha” provém do latim e ao contrário do que eu pensava significa “luta”, o que muda todo o sentido do documento histórico.
                Feito o esclarecimento, resta agradecer a paciência dos leitores, pois tal como eu referi, as minhas investigações históricas são atabalhoadas. 
 
(a publicar no dia 12/12/13)

quarta-feira, dezembro 04, 2013

Aquilo que não escrevi

 

            Ao ler o jornal da semana, não deixo de espreitar a página da necrologia. Ao deparar com uma fotografia, um nome, de alguém conhecido, de quem não fui informado do óbito, não deixo de expressar a surpresa.

            A particularidade de antever textos para a edição da semana seguinte, coloca-me perante o desafio de alinhavar umas linhas, ao jeito de homenagem para com um desses falecidos - o obituário com o meu cunho.

            A atualidade sobrepõe-se, na maioria das vezes, ao texto imaginado e adio a referência, escrevendo um texto diferente do inicialmente previsto, deixando para uma melhor oportunidade as palavras de tributo. Por vezes, sucedem-se os outros assuntos e as semanas passam, ficando tais textos por editar.

            Não vão enumerar as minhas omissões.

As publicações de agências funerárias de freguesias vizinhas, permitem recolher informações sobre muitos dos que por S. João da Madeira trabalharam.

Descobri outro interesse, nessas publicações.

A divulgação de nomes de lugares ou de ruas das freguesias vizinhas, que para a maioria dos leitores nada significa. A utilidade dessa informação é poder cruzar com outros dados de pesquisas históricas, a que me dedico de forma atabalhoada e por auto recreação, servindo muitas vezes, para explicar a toponímia da cidade, a sua história, a origem de alguns vocábulos, que por vezes, serviram para batizar lugares e as próprias localidades.

Ninguém se deve lembrar de um texto meu, intitulado Ascarigo, publicado a 19/01/2012. Resumidamente, nesse texto, mencionava que as Inquirições de 1251, no reinado de D. Afonso III, referem a existência de uma ponte terrenha em Ascarigo, aqui em S. João da Madeira.

Ascarigo, pelo que eu conheço de S. João da Madeira, seria um lugar cujo nome se perdeu com o tempo. “Asks” refere o historiador José Mattoso, remetendo para um estudo etimológico, é um prefixo bélico – heroico de origem germânica, significando lança de freixo.

E escrevi mais uma linha de considerações, pensando que o nome do lugar poderia ter evoluído, ou adaptando outro nome, ou eliminando a forma germânica, sugerindo implicitamente o uso popular da designação mais simples para o atual lugar da Ponte.    

Uma possível forma de evolução de Ascarigo, seria Escarigo, existindo, na época em que escrevi o texto, duas freguesias em Portugal com esse nome.

Algumas pessoas tentaram-me convencer que Ascarigo teria evoluído para Escariz e que eu estava errado na análise. Acontece que as mesmas Inquirições também referem aquela freguesia de Arouca, sem relacionar obviamente com S. João da Madeira.

Este ano, descubro nas referidas páginas de necrologia do jornal labor, a existência de uma rua em Milheirós de Poiares chamada precisamente de Escarigo. Pelo que pude perceber situa-se no lugar de Pereiró.

A proximidade deste Escarigo a S. João da Madeira permite relacionar os dois dados e claro, deduzir tratar-se do mesmo Ascarigo, mencionado nas Inquirições de 1251.

Este dado é interessante em termos históricos, para perceber qual o traçado da estrada real, ou mesmo da via romana, que atravessava S. João da Madeira, o que poderá ser útil para o estudo da evolução da povoação ao longo dos anos.

De qualquer forma, sem prejuízo para a freguesia vizinha, depreende-se do documento histórico, que os limites das duas freguesias, em Terras de Santa Maria, nem sempre foram os atuais.   

            Um argumento que poderia ter sido útil, nos dias que se seguiram ao referendo organizado em Milheirós de Poiares no ano passado.  

 

(a publicar no dia 05/12/13)

quarta-feira, novembro 27, 2013

O decote

                - Respiro o vazio, doutor.
                O psiquiatra levantou os olhos, interrompendo a leitura da ficha do cliente. Havia cumprimentado o paciente e passara a ler o seu processo, para recordar a respetiva ficha clínica. Sintomas e medicamentos receitados, estava tudo ali escrito. Ainda não se rendera à informática, preferia os velhos ficheiros personalizados, cheios de notas, que consultava sempre que tinha uma marcação. Procurava ao reencontrar um cliente, verificar sintomas do seu estado de espírito. Ao olhar para Orlando, encontrara o mesmo de sempre. Um alheamento, sem queixas padronizadas, um caso difícil, no entanto,
- Respiro o vazio,
despertara a atenção do médico.
Uma queixa, diferente das habituais de outros doentes. Das dores, das visões, das perseguições, das incompreensões, era uma novidade.
Orlando explicou o vazio. Não tinha interesses. Limitava-se a sair do emprego e a ficar em casa. Não convivia, o seu círculo de lazer era o sofá de casa, esperando pela hora de deitar. Não seguia televisão, lia o jornal da última para a primeira página e ouvia música. Desistira de ver filmes, através do aluguer no vídeo clube, pois o mais próximo de casa fechara. Jamais perdera tempo com a internet, muito menos aderira à era dos computadores pessoais.
O médico ficou atónito. Escolheu dar conselhos e suspendeu a medicação. Propôs-lhe em desafio, que encontrasse nas suas atividades, aquela recordação que o fizesse despertar sentimentos antigos.
Orlando escutou, sem reagir.
Procurou com dificuldade um disco antigo. Ouviu a voz de Richard Buttler, entoando “Pretty in Pink” e nem um sorriso esboçou. Voltou aos CDs de música clássica, a Rossini, tal como nos meses anteriores. Não fez mais nenhum esforço. Nem com um livro, nem procurando rever um filme. Olhava desinteressado para a televisão e limitava-se a ler o jornal diário.
Um final de tarde, a secção cultural do jornal anunciava um festival de cinema italiano, para uma cidade do interior de Portugal. Orlando leu o corpo da notícia, como sempre fazia com as informações culturais. O propósito, da organização deste festival, era trazer a Portugal uma diva do cinema italiano. Para a edição deste ano, a convidada de honra seria Donatella Damiani. Ao ler este nome, Orlando teve dificuldade em reconhecê-lo. Prosseguiu a leitura e encontrou a chave do mistério no parágrafo seguinte, a atriz italiana contracenou com Marcelo Mastroianni num filme de Fellini de 1980, tendo desaparecido do grande ecrã meia dúzia de anos depois.
Na memória de Orlando correram várias imagens dos filmes de Fellini, até que se lembrou de uma rapariga de pele branca, de cabelo escuro e liso. Ficara mais conhecida pelo seu peito generoso e pela sua meiga personagem no filme “A cidade das mulheres”.
Era uma oportunidade.
Conseguiu ligar para o organizador do festival, ofereceu um patrocínio pessoal, com a condição de poder conviver com os convidados de honra. O organizador, de início, recusara a ideia. Quando Orlando informou a quantia que estava disposto a oferecer-lhe, o discurso mudou. Ele próprio, organizador, o acompanharia e faria de tradutor, durante o tempo que Orlando quisesse.
Na véspera do festival, Orlando foi convidado para a sessão de abertura. Pediu para ser apresentado a Donatella Damiani. O organizador aproximou-se de Orlando, acompanhado por uma senhora morena, com um lindo vestido decotado. Aquela cara lembrava-lhe alguém, Orlando não identificava. O organizador falava italiano e ele nada entendia. A italiana sorria-lhe, expressando as suas rugas. Até que o tradutor a apresentou, como Donatella Damiani.
Orlando olhou para ela, sem expressar qualquer sorriso, nem movimento. Olhou de novo para o tradutor e disse-lhe:
- Deve haver engano. Eu procurava a filha e não a mãe.
A italiana interrogou o organizador. Este encolheu os ombros e traduziu. Falavam os dois, muito depressa, argumentando cada um para seu lado, sem olhar para Orlando. Este olhou em redor à procura da jovem atriz italiana. Encontrou um espelho, que refletia a sua imagem e a da senhora italiana. Ao ver os dois corpos, envelhecidos, Orlando interrompeu a conversa:
- Respiro o vazio, Donatella.
O organizador repetiu em italiano. Ficaram os três em silêncio.
Donatella avançou para Orlando e abraçou-o. Sentiu-se apertado. As suas mãos tocaram nas costas da italiana. Orlando sentia o aconchego daquele abraço. Uma sensação de alegria percorreu o seu corpo. Aquele afago durou uma eternidade. Orlando sentiu o forte peito de Donatella a respirar junto ao seu. No momento da separação, os olhos fixaram o decote da italiana. Orlando não podia fugir à tentação.
O tradutor lançou um grito de espanto pela ousadia do patrocinador.
Orlando esperava uma má reação de Donatella mas, para seu espanto, esta soltou enorme gargalhada, ao sentir as mãos, daquele ser estranho, agarradas aos seus seios.
 
 
(a publicar no dia 28/11/13)

quarta-feira, novembro 20, 2013

Espaços novos, problemas antigos

                A cultura foi manchete nos jornais locais nos últimos meses.

As inaugurações dos requalificados edifícios emblemáticos da cidade, intercalaram atenções com a sustentabilidade financeira de um deles e com o enquadramento orgânico das estruturas de ensino, ou de formação, de índole municipal.

            A elevação qualitativa da oferta cultural é o resultado do forte investimento municipal em estruturas físicas. Em simultâneo, desenvolveram-se competências na área das artes cénicas e tornou-se efetivo o protocolo de cedência da coleção de Norlinda e José Lima.

            O deslumbramento, transmitido pelas várias obras expostas, transportam-nos para outras dimensões, ficando a curiosidade em conhecer o restante espólio destes nossos conterrâneos.

Boas práticas, as de quem partilha e as de quem apetrecha um espaço municipal, com obras tão importantes da arte contemporânea.

A concretização, nos próximos meses, de outras valências do projeto da Oliva Creative Factory permitirão enquadrar a sua atividade cultural num patamar bem alto, ao nível das principais capitais de distrito do nosso país.

O atual estado inacabado da OCF confere-lhe um enorme potencial para a organização de eventos. Um promotor nacional, que me acompanhou na visita, projetou 15.000 pessoas em três dias, calculados para um festival de índole, digamos, gastronómico.

 O sucesso latente da reconversão dos pavilhões e arruamentos da antiga metalúrgica não esconde os problemas antigos da animação cultural da cidade.

Na mesma semana, em que o Doutor Manuel Pereira da Costa, com o seu reconhecido mérito cultural, enalteceu o trabalho do programador da Casa da Criatividade, Fernando Pinho, os jornais locais relatavam os propósitos da nova vereação relativamente a esse profissional. O contraste, entre os elogios do prestigiado escritor local à atividade do programador e as desconfianças patenteadas pela vereação, foram evidentes.

De um lado a sensibilidade artística, o gosto em comum pela arte dramática, o reconhecimento pelas capacidades de encenação, com encomendas de peças para Inglaterra, do outro o ataque político, o imiscuir-se na programação, o aniquilamento de um agente da cultura.

Não se pode exigir sustentabilidade financeira a um espaço cultural, quando este tem seis meses de vida, estando ainda a verificar o seu público-alvo, a verificar o tipo de concertos ou espetáculos adequados à população e tudo isto, dentro do enquadramento orçamental anunciado há mais de dois anos.

Existem várias equações no modelo da sustentabilidade financeira da Casa da Criatividade. Não nos podemos esquecer da conjuntura económica atual, da constante oferta de concertos de entrada gratuita promovidos por autarquias e comissões de festas, que limitam a procura a espetáculos de ingresso pago. Acredito que os 400 lugares da CC poderão não ser suficientes para gerar a receita suficiente para a despesa, em alguns espetáculos.

Por isso, considero prematuro o julgamento a que está sujeito Fernando Pinho, lembrando outras perseguições a que no passado foram sujeitos outros agentes culturais da nossa cidade. Nomeadamente Helena Cruz, após um excelente trabalho de democratização da Biblioteca Municipal Renato Araújo, permitindo o acesso à literatura nacional contemporânea, divulgando prosadores e poetas nacionais. O seu trabalho, em lugar de reconhecimento, foi reprimido pelas suas opções políticas, uma atitude pouco democrática e intolerante, afastando-a da sua atividade profissional.

  À semelhança de Nelly Santos Leite, interessada em divulgar música, em formar alunos, dentro dos exigentes padrões reconhecidos pelo Ministério da Educação e constantemente posta em causa, por algo a que não deveria estar sujeita, a gestão financeira da Academia de Música. Neste caso, de meritório desempenho pedagógico, o enquadramento orgânico desta estrutura de formação municipal, deveria ser outro. Para a Academia de Música de S. João da Madeira devia-se encontrar uma solução jurídica autónoma, atendendo às suas instalações próprias, ao seu objeto, ou fim a que se destina. Obviamente que a parceria com a Câmara Municipal deve ser mantida e privilegiada, conseguindo-se uma solução que afaste a Academia dos problemas financeiros, a que infelizmente tem estado submetida. Uma maximização de receitas, instituindo quotizações, entre outras medidas, poderão libertar a Academia de Música da asfixia a que tem sido sujeita nos últimos anos e transmitir a tranquilidade a todos os seus profissionais, incluindo a sua diretora. 

 

(a publicar no dia 21/11/2013)

quarta-feira, novembro 13, 2013

A Estátua de Cosme Damião

                Eu voto em Lisboa.
                Não como eleitor, como é óbvio.
(Reconheço que gostaria de votar em António Costa. Aguardo a oportunidade, esperando que tal aconteça num futuro próximo).
Voto no orçamento participativo da capital.
Vou explicar porquê. Estou na rede de contactos de uma Organização Não Governamental (ONG). Recebo uma série de comunicados e em outubro do ano passado, fui convidado a votar no projeto dessa ONG, inserido na iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa, intitulado Lisboa Participa. Por curiosidade política, procedi à minha inscrição no site da Câmara e procedi ao meu voto. Fiquei incrédulo com a facilidade encontrada. 
Em janeiro deste ano, tive a oportunidade pública de confessar o meu ato, sem contrição, à vereadora da edilidade lisboeta, Graça Fonseca. A possibilidade de qualquer cidadão espalhado pelo país votar do orçamento participativo de Lisboa, foi assumido pela referida vereadora como um risco calculado, significando apenas 5% dos votos totais.
Na interpelação, alertei para o facto, de posteriormente ao orçamento de 2012, essa mesma ONG ter promovido uma petição para impor um estudo de impacto ambiental a um investimento imobiliário e ter recolhido 20.000 assinaturas, o que poderia significar que em próximas edições, o orçamento participativo poderia estar sujeito à capacidade de mobilização de cada projeto concorrente, podendo conseguir-se votos maciços e externos a Lisboa. Como tal jamais tinha acontecido, nas anteriores cinco edições, tal situação não foi encarada como um fator adulterante do processo.
Na edição de 2013 voltei a repetir a graça. Processo idêntico. Recebi o apelo da mesma ONG, acedi ao projeto proposto para este ano. A edição deste ano tinha uma novidade, o voto por SMS gratuito, procedi à votação calmamente.
A participação facilitada trazia maiores riscos, pois a origem de alguns votos não podia ser controlada. Fiquei curioso para saber os resultados. Estes foram divulgados a semana passada.
Houve vários vencedores, dois para valores acima de 150.000 euros e catorze para a categoria até ao mesmo valor.
Nenhum deles recebeu o meu voto.
Segundo a Câmara Municipal de Lisboa foram contabilizados 35.952 votos, a maior participação de sempre.
Entre os projetos vencedores, na categoria com menor orçamento, encontra-se a estátua de Cosme Damião. Para os mais distraídos, Cosme Damião é o fundador do Sport Lisboa e Benfica. Importa referir a oportunidade proporcionada por esta iniciativa da autarquia lisboeta e aproveitada pelos adeptos do referido clube, através de pouco mais do que 1.000 votos, o que motivou uma reação de protestos de clubes antagónicos.
Uma sovinice, poderia defender o adepto Ricardo Araújo Pereira, ou como em tempos escreveu António Lobo Antunes, continua-se com falta de sentido estético.
A deturpação do orçamento participativo surgiu por onde eu menos esperava. A participação de projetos associativos é um risco a calcular, podendo este exemplo servir de alerta, para quem quer lançar-se em atos semelhantes de envolvimento da população na gestão do município.
 
(a publicar no dia 14/11/2013)

quarta-feira, novembro 06, 2013

A posse

                A finalização do processo do eleitoral autárquico é consumada na tomada de posse dos eleitos.

                Tenho seguido aleatoriamente alguns desses processos, com a devida atenção, num exercício de curiosidade social e política.

As coligações, ou entendimentos pós eleitorais, para os executivos municipais são notícia de âmbito nacional, atendendo à dimensão das autarquias e às parcerias conseguidas. Assim, exemplificando, foi badalada a coligação em Sintra, entre PS, PSD e CDU. Do mesmo modo, que no Porto, a lista de Rui Moreira teve necessidade de entendimento com o PS local. Para finalizar, em Gaia, o partido vencedor, o PS, para formar executivo maioritário, convidou uma vereadora do PSD, que nos anos anteriores tinha exercido essas funções, numa confortável maioria liderada por Luís Filipe Menezes.

A necessidade de entendimento pós eleitoral é transversal à democracia portuguesa, em consequência do pluralismo político existente.

Destas eleições de 2013, em consequência da reorganização administrativa territorial autárquica, à qual aludi faz quinze dias, é interessante recolher informação do processo de instalação dos órgãos eleitos. Em causa, além dos resultados eleitorais, está o entendimento democrático resultante da agregação de freguesias. Sabendo-se que nalguns casos, as listas eram encabeçadas por elementos de freguesias vizinhas, é importante perceber socialmente, como evoluiu o bairrismo, dentro da nova realidade jurídica territorial.

É evidente que a notícia do jornal O Regional, da semana passada, relatando o desentendimento entre eleitos na vizinha Arrifana, para a constituição da junta de freguesia, permite verificar que o problema não se limita às freguesias agregadas.

Outros casos, como na União das freguesias de Lobão, Gião, Guisande e Louredo, da qual fui recolhendo informações, a junta não é instalada por incompatibilidades de eleitos… oriundos da mesma freguesia.

Ou seja, não é conclusivo, por ora, quais os efeitos da União de freguesias nas relações sociais dos habitantes de localidades vizinhas.

A consequência da falta de entendimento político e pessoal é o ultrapassar do prazo – 20 dias – para a instalação do órgão, de acordo com a lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais, o que implica a marcação de eleições intercalares, para um prazo de seis meses.

No próximo meio ano vamos ser bombardeados com notícias dessas eleições.

Em S. João da Madeira, o erro processual da Junta de Freguesia levantou questões e insinuações acerca da irregularidade na eleição da Mesa, nomeadamente pelo não cumprimento do prazo para instalação do órgão. Entre a lei reportada e o regimento próprio, todas as dúvidas devem ser esclarecidas, para o melhor funcionamento dos órgãos autárquicos locais e obviamente para a legalidade permanecer.

 

 

(a publicar no dia 06/11/13)

 

quarta-feira, outubro 30, 2013

Ser Lou Reed por um dia

Existe um limite a partir do qual a cultura norte - americana deixa de fazer sentido. Longe dos tops, das listas de mais vendidos, afastada dos holofotes da ribalta, das multidões de seguidores, sem a perseguição de fãs imitadores, ou irritantes. O modo de criação surge, o gosto pelas artes é disperso e a vida privada é recatada, sem aparecimento público digno de registo, com exceção, numa qualquer atuação própria, ou em parceria artística. São os anti— heróis norte - americanos. Das mais variadas artes, com carreiras extraordinárias, com reconhecimento mundial, que convivem com a fama, vivendo longe dela, procurando ter espaço para criar, para produzir arte, sem a obrigação comercial inerente.
Um dos mais conhecidos artistas desta forma de estar americana, foi Lou Reed. Faleceu domingo de manhã, ironicamente, o título da sua mais bela música.
A carreira do músico foi revista por estes dias. Referências ao seu início musical, em especial, à fundação nos anos 60 dos Velvet Underground, uma banda mítica, inspiradora de correntes musicais nas décadas seguintes, provando ser o falecido músico um precursor na cena musical. A sua carreira a solo começou da melhor forma, em 1972 lança dois álbuns, um dos quais, “Transformer”, contém os 3 êxitos musicais, pelos quais Lou Reed é mais conhecido: Walk on the wild side, Satellite of love e Perfect day.
Os quarenta anos de carreira posteriores foram profícuos, com mais de vinte álbuns de estúdio. Uma edição regular, longe da ribalta, com exceção do encantador “New York”, um dos 20 melhores discos representativos da década de 80, segundo a insuspeita revista Rolling Stone.
Este foi o seu disco que mais me marcou. Comprei-o em 1989, poucas semanas depois da sua edição mundial. Ouvi o lado 1. Virei-o. Devo ter limpo o vinil, coloquei a agulha na posição correta. Tocou o lado 2. Não havia um refrão para trautear. Ouvi novamente os dois lados. Nada para fixar e no entanto, o conjunto era encantador. Tocou vezes sem conta no hi-fi familiar. Cheguei a emprestá-lo a amigos, para as reproduções em cassete, ou a gravá-lo para quem mo pedisse. Práticas bem balizadas no tempo, provavelmente não entendidas na era mediática atual. Com “New York” a minha noção da música norte-americana redefiniu-se e comecei a ser consumidor seletivo de outras produções artísticas daquele país, com todo o preconceito cultural inerente.
O fascínio de Lou Reed, ao longo destes anos, pode-se resumir no seu feitio difícil, excêntrico. Pode ser mencionada a sua rebeldia, o seu não alinhamento cultural. O ser esquisito ou estranho, como foi catalogado. Será recordado, é certo, como um excelente músico.
Emir Kusturica, realizador… vá lá… Sérvio, a propósito do título do seu filme Underground, explicava a alegoria dos seres que viveram 30 anos em subterrâneos Jugoslavos, sem saber que a 2ª Guerra Mundial tinha terminado. Para vincar a ideia refere que, também Lou Reed viveu sempre “underground”, uma referência à sua origem musical e obviamente à sua forma de estar.  
Lou Reed cantou pelo respeito pelas diferenças, escreveu pela indiferença à realidade, pela irreverência ao quotidiano burguês, pela necessidade de expressão da clandestinidade urbana e conseguiu na sua longínqua carreira, ser admirado por ser sempre fiel a si próprio, vivendo à margem do sucesso.    
 
(a publicar no dia 31/10/13)

quarta-feira, outubro 23, 2013

A necessidade

                As eleições autárquicas do dia 29 de Setembro foram o culminar do processo de reorganização administrativo do território das freguesias.
                Suportada na lei n.º 11 / A de 2013, publicada em 28 de Janeiro, a agregação de freguesias foi sancionada pela população de forma pacífica e ordeira.
                É necessário recordar que em 2012, quando foi publicada a lei n.º 22, a 30 de Maio, seguiram-se manifestações, em vários pontos do país, contestando-a, além de um mega encontro de protesto na capital do país, em que vários indignados juravam que jamais a reorganização seria aceite pela generalidade da população. Recorreu-se a providências cautelares e vários presidentes de junta de freguesia prometeram organizar boicotes às sucessivas eleições.
                Um ano depois, não foi isso que se viu.
                Na união de freguesias, entendido o conceito, as estruturas partidárias organizaram as suas listas, tendo o cuidado de indicar nomes de candidatos provenientes das várias freguesias e com normalidade o assunto foi esquecido.
Em alguns casos, apesar da união de freguesias, houve partidos que apresentaram os candidatos às freguesias, como se as mesmas não estivessem unidas, tentando contornar algum descontentamento… certamente de algum candidato.
                No dia das eleições, esperava ouvir falar em boicotes e fiquei surpreendido pelo pouco número dessas ocorrências. Pelo que me apercebi, apenas uma freguesia da Covilhã, agregada numa outra, promoveu o boicote. Em Ourondo, a população entendeu não votar, protestando pela não inclusão de qualquer habitante da localidade, nas listas partidárias candidatas na União com Casegas. Na semana seguinte, a eleição repetiu-se. Votaram 10 eleitores. Só um voto foi válido. Fosse qual fosse a adesão e o número de votos, o resultado final não seria alterado, devido à diferença populacional entre as duas freguesias.
                Os próximos meses e anos serão decisivos para se perceber o funcionamento dos novos territórios das freguesias. A distribuição de serviços pelo novo território, a boa utilização das estruturas físicas e dos recursos humanos disponíveis, permitirão verificar se a proximidade à população estará garantida e então veremos, se os eleitos foram capazes de contornar uma lei, que demonstra reversas sobre a capacidade organizativa da administração local do nosso país. 
                Infelizmente continuam a existir concelhos com pouco mais de 2.500 habitantes – número utilizado para definir a necessidade de agregar freguesias. São apenas 4. No entanto, existem 37 concelhos com menos do que 5.000 indivíduos, valor pretendido para a agregação de freguesias. Os números, da distribuição da população pelo território autárquico, identificam 115 concelhos, ou seja, um terço do total de autarquias do país, com menos de 10.000 habitantes. A maioria deles situa-se no interior do país.
                  Perante estes dados, atendendo à continuada crise financeira do país, seria de promover a redução do número de autarquias, através de uma eficiente reorganização da administração local, utilizando-se uma fórmula semelhante à da agregação das freguesias. Pelo passado recente, percebe-se que a população aceitará essa reorganização e compreenderá tal necessidade, se isto se efetivar numa redução da despesa do Estado. A contestação será orquestrada pelos agentes da política mas, tal como se viu na questão das freguesias, tudo será aceite, quando as listas partidárias para as candidaturas autárquicas estiverem a ser elaboradas.             
 
(a publicar no dia 24/10/13)
 

quarta-feira, outubro 16, 2013

Segunda Geração

                Subo à Torre da Oliva, para assistir ao decorrer do Torneio de Xadrez da Associação Estamos Juntos. Enquanto venço os degraus, apercebo-me da grandiosidade do local e penso na relação do espaço físico com o jogo de xadrez.

Um torneio numa torre, um torneio numa peça de xadrez, um torneio num dos símbolos da cidade.

O xadrez é composto por figuras medievais desde há alguns séculos: Reis e Damas, clero, cavaleiros nobres, os castelos e suas torres, mais os numerosos peões, a sempre necessária infantaria. As torres a definirem os contornos do tabuleiro, a limitarem a batalha, a serem agora o espaço para os jogos, para o Torneio.

Ao entrar na sala do Torneio, na qual se alinham três longas filas de mesas, verifico a enorme capacidade instalada. Percorro o piso, vejo mais uma antecâmara adjacente e ainda mais um salão, com iguais dimensões à primeira. Começo a olhar para os intervenientes, os jogadores de xadrez, à procura de caras conhecidas, quase quinze anos depois do último torneio jogado. A custo identifico-os, sem me lembrar do nome. Verifico a mesa correspondente onde se senta cada um dos rostos identificados e recorro à tabela de emparceiramento afixada na entrada. Atualizada a memória, cumprimento pelo nome os conhecidos, que circulam pelo hall, compreendendo a sua dificuldade em se lembrarem de uma cara, esquecida num torneio de há década e meia.  

                As instalações impressionam pela qualidade. É a opinião recolhida. Expressa por mais dois espaços, onde estão montados tabuleiros para uso extra torneio, além de mesas onde cada um usa o seu portátil, os pais esperam os filhos, ou os mais novos se dedicam aos trabalhos escolares de fim-de-semana.

                As conversas entre jogadores pouco mudaram – nos intervalos, ou nas pausas, fala-se de jogos, de posições das peças nos tabuleiros, para a qual a capacidade descritiva é suportada nas coordenadas do tabuleiro; revê-se lances e alternativas, tudo sem as peças à frente. A capacidade de cálculo a exacerbar-se. 

                Vivo o momento.

                Revejo os passos dados pela secção para se chegar ao presente. A década de 90 comigo, os quinze anos seguintes, até ao presente, com o Albino Faria. Passos sequenciais, pequenos, com avanços e recuos, sempre com o mesmo objetivo desinteressado de servir a modalidade, permitindo o acesso a todos os interessados.

                A Associação Estamos Juntos é hoje um notável clube de xadrez. Organiza torneios acolhedores, tem um prestígio competitivo apreciável, figurando na segunda divisão nacional, podendo sempre espreitar a primeira, como aconteceu há duas épocas. Desperta simpatia, pois são os jogadores que escolhem jogar pelas suas cores, como é o caso do próprio presidente da Federação Portuguesa de Xadrez, Francisco Castro, que se prepara para continuar a praticar a modalidade pela AEJ, por mais uma época. Além destes fatores, a AEJ continua a apostar na formação dos seus jovens jogadores. Tem escola montada, ensina os seus jogadores e conseguiu, na época que agora terminou, excelentes resultados, como o campeonato nacional de sub-18 em partidas semi rápidas, conquistado pelo Cláudio Sá. Este mesmo jogador confirmou o seu estatuto, ao terminar o nacional de partidas lentas, do mesmo escalão, em 5º. De igual modo, Rodrigo Ribeiro ao tornar-se vice-campeão nacional de sub-08, alcançou a mais brilhante classificação em provas lentas de um jogador deste clube. Estes dois jovens são filhos de jogadores que ingressaram na AEJ nos princípios da década de 90.

                Para mim, ver a atividade do xadrez da AEJ, é gratificante. Tal como ouvir o presidente da Federação Portuguesa de Xadrez a projetar a organização de futuros Campeonatos Nacionais, para a Torre da Oliva, ou seja, uma recuperação de uma faceta da AEJ na década de 90, sendo também uma tradição de S. João da Madeira, já que em 1978, o Clube de Campismo organizou o Campeonato Nacional Absoluto, de tão boa memória.

 

(a publicar no dia 17/10/2013)

quarta-feira, outubro 09, 2013

Cucujães

                Durante o sono, recebo visitas inesperadas.
                Acordo sobressaltado, sinto o rápido bater do coração, abro os olhos, situo-me na escuridão e ponho-me a rever o sonho.
                Das primeiras vezes, procurava uma sombra. Duvidava das minhas certezas. No entanto, com o tempo fui ficando tranquilo, deixei de considerar estas aparições pesadelos e após umas horas de insónia, voltava a dormir.
As visitas trazem-me memórias pessoais. Momentos vividos com familiares, amigos e colegas de trabalho, reavivados durante o sono profundo.
Uma tia que ainda me sorri, outra que me fala das lágrimas derramadas ao ler um texto meu, sobre a sua casa de infância, a dos meus avós maternos. Tudo tão presente que parece ter sido vivido nesse dia.
O irmão mais velho do meu pai insistiu, algumas noites intervaladas, com as virtudes de Churchill.
Uma chefe de equipa, de uma fábrica de componentes de automóveis, esperava pelo programa de produção, ou por saber o seu posto de trabalho, já que a morte prematura, não lhe permitiu conhecer as alterações introduzidas nesse ano na empresa.
Por estes dias, do atual emprego, uma colaboradora falecida num trágico fim-de-semana, surgiu sempre silenciosa a executar as suas tarefas. Uma confusão de imagens. E de consciência.
Ainda insiro moeda numa jukebox manhosa, no 2.000 - na antiga casa de máquinas que em tempos funcionou ao lado do edifício do parque América - selecionando uma música dos Men at work, esperando pelo Paulo Lisboa.
Desde há muitos anos, vou várias noites ao antiquíssimo Pé de Salsa, do tempo em que era num só piso, com duas alas e ali me encontro com o meu amigo Marcos.
Histórias mal resolvidas. A satisfação do prolongar da memória. Uma continuação da amizade.
Uma cigana colou-se a mim em Coimbra. Leu-me a sina. Eu sereno com todas as afirmações ou provocações. Lá pelo meio da lenga - lenga, surgiram os meus mortos, havendo um que me protege.
Sorri-lhe.
Rumo quando necessito a Cucujães. Não tem periodicidade certa. O motivo é espiritual. Vou sozinho. Estaciono o carro do lado da gráfica das Missões. Atravesso a estrada. Observo a banca de venda de velas, ainda distante do dia dos finados. Dirijo-me ao portão mais a norte do cemitério. Atravesso-o, olhando para nascente. Algumas mulheres limpam e enfeitam as campas, com afinco. Nem lhes vejo as caras. Olho para a paisagem, antes de virar à direita. Pelas ruelas cimentadas e asseadas, chego à campa pretendida.
Verifico que apenas está lá uma placa, cujo nome identifico como antepassado do meu amigo. Ali, espero não encontrar o nome de quem partilhou comigo as brincadeiras de infância, as tontarias da adolescência. Ali, parado, com os olhos humidificados, faço a viva voz uma salvação e permaneço o resto do tempo calado.
Saio de Cucujães, com a certeza de que a conversa seguirá numa destas noites, no Pé de Salsa dos anos 80.
 
(a publicar no dia 10/10/2013)

quarta-feira, outubro 02, 2013

Sob o signo dos independentes

Existem várias formas de analisar os resultados numas eleições autárquicas:

a)      Pela tendência de voto nacional, olhando-se para o maior número de câmaras municipais conquistadas por um determinado partido - chamando-se ao efeito onda, colorida conforme a cor do partido dominante na eleição.

b)      Pela tendência de voto regional, existindo zonas geográficas com um grande número de câmaras conquistadas sucessivamente pelo mesmo partido.

c)       Por outros motivos externos à eleição, como absentismo, votos nulos e brancos.

d)      Pela diferença de votos nos vários órgãos autárquicos.

e)      Pelos votos conquistados nas várias urnas.

 

Qualquer análise é plausível para justificar as tendências de votos, adaptando-se ou não, ao real resultado dumas eleições.

Se verificarmos os resultados em S. João da Madeira, não podemos falar em onda rosa, como se evidenciou no país, nem em vitória regional do PSD, pois no Entre Douro e Vouga, Arouca foi ganha pelo PS e Vale de Cambra, pelo CDS-PP.

Outros fatores externos: apesar do valor elevado de abstenção em SJM, de 50,7%, superior à média nacional, que foi 47,4%, ou seja uma diferença de 3,3%, que é um valor mais ou menos equivalente à percentagem que separou o PSD e PS na eleição da Câmara Municipal, não se pode chegar a qualquer conclusão, por não sabermos qual a intenção de voto destes absentistas.

 Ao verificarmos a diferença de votos entre os vários partidos ou movimentos, na eleição para a Câmara Municipal e para a Assembleia Municipal de S. João da Madeira, temos os seguintes valores: PSD + 334 votos; PS + 75 votos; AD SJM + 27 votos; CDU – 173 votos; CDS/PP – 89 votos; BE – 105 votos. Diferenças a demonstrar que o candidato do PSD foi buscar os seus votos de vitória aos partidos que não elegeram vereadores.

Um voto disperso por órgão autárquico, uma forma democrática dos eleitores demonstrarem o seu (des)agrado aos vários partidos, ou pelo contrário, um sentido de voto a premiar o melhor candidato?

A fazer fé na sondagem do labor, editada na semana passada, os eleitores confirmaram a sua preferência, pois o estudo indicava que entre os dois candidatos, melhor posicionados para a vitória, Ricardo Figueiredo tinha a preferência dos auscultados.

Poder-se-ia ainda analisar os votos conseguidos em cada mesa, verificar se existe uma tendência de votos nos eleitores mais antigos na cidade e outra na juventude, ou nos eleitores recentemente recenseados. Confesso que ao seguir a emissão da rádio local, fiquei com essa ideia, no entanto, não consegui verificar tais resultados, por isso, não posso apresentar tais conclusões. Provavelmente na presente edição do labor, serão publicados os resultados parciais e assim, será possível intuir o que significa o somatório de votos de cada urna.

Ricardo Figueiredo saiu vencedor da noite de domingo. Não venceu sozinho, no entanto, encontrou um PSD demasiado confiante na vitória, provavelmente encantado pelos valores apresentados na sondagem de Agosto, o que lhe causou dissabores, ao perder maioria e freguesia. Os próximos tempos, atendendo à composição do executivo, serão de negociação democrática, na qual o perfil empresarial do presidente eleito poderá ser decisivo para a eficácia do seu mandato e consequente melhoria da cidade.

Luís Miguel Ferreira perdeu-se. A fragilidade do adversário, ao assumir os erros da gestão do seu antecessor em matérias como a Praça ou das rendas sociais, não foi aproveitada de forma assertiva. O discurso rondou sempre a politiquice, pouco cativante para 334 eleitores e há rótulos que são difíceis de mudar. No entanto, a concelhia do PS apresentou-se nestas eleições em grande forma, com mobilização interna e o resultado foi melhor do que há quatro anos, aumentando a votação em mais 500 votos, o que é significativo.

Jorge Lima foi outro dos vencedores da noite. Confesso que sempre fui cético relativamente a esta candidatura. Só quando as 1200 assinaturas recolhidas foram aceites pelo tribunal, é que passei a respeitar a vontade deste conterrâneo. Depois seguiu-se a campanha e os números que iam surgindo previam a eleição de um vereador. Como não conheço muitas pessoas e influenciado por relato de amigos conservadores, possíveis eleitores votantes em Jorge Lima, até previ um excelente resultado, com a eleição de um segundo vereador, suportado por uma hipotética sondagem que não vi, nem sei se chegou a existir.

Por fim, a terceira vencedora da noite. A independente Helena Couto venceu, pelo PS, a Junta de Freguesia. Um resultado extraordinário, premiando quem fez campanha para o órgão, apresentando ideias e programa eleitoral próprios. Antevejo um mandato de reforço e de redefinição das competências da Junta de Freguesia, algo que é reclamado há muito, assim como a dotação financeira, estabelecida na lei, essencial para o cumprimento do orçamento. A realização de um bom mandato, poderá projetá-la para outras lutas em 2017, a bem da cidade e da dita igualdade.       

 

(a publicar no dia 03/10/13)

quarta-feira, setembro 25, 2013

Mobilização

                A quatro dias das eleições autárquicas, não posso deixar de apreciar a capacidade de mobilização das mais variadas forças políticas, durante a campanha eleitoral.

As campanhas eleitorais estão mais ou menos padronizadas. Visitas aos aglomerados populacionais, com o intuito de falar com os moradores dos vários prédios, são hoje prática corrente. Do mesmo modo surgem as visitas às instituições e associações da cidade, assim como, a algumas repartições Estatais mais emblemáticas. Comum é também a visita a empresas, alguns autorizados a conhecer o interior e outros ficando à porta, distribuindo brindes, sorrisos e propaganda. Por fim, temos as arruadas, umas bandeiras, uma troca de palavra com os transeuntes, a entrada em algum comércio e a visita ao mercado municipal.

Tudo isto foi visto e revisto pelos demais eleitores.

A capacidade de mobilização varia entre cada força política.

Com o recurso às redes sociais, os candidatos vão divulgando fotos, procurando demonstrar o trabalho efetuado. Alguns espalham-se ao aparecerem praticamente sozinhos, em locais pouco movimentados, em dia de jornada laboral para a maioria dos trabalhadores. Para contrariar esta tendência, publicam várias fotos, de vários acontecimentos, retirando importância aos momentos menos felizes e procurando esconder a pouca mobilização extra partidária.

Existem as forças políticas que enchem espaços públicos recuperados da cidade, ou que promovem concertos gratuitos, ou que promovem convívios com fila para a merenda. Isto é demonstrativo do magnetismo dos candidatos e significa votos no dia das eleições.

Este é o cerne de uma campanha eleitoral.

Há indicadores curiosos: gestão do orçamento da campanha e apreciações globais positivas no facebook – neste campo, convém referir que por motivos exógenos, a campanha do CDS / PP, no dia 18 de Setembro, alcançou uma visibilidade nacional incomparável.

Voltando ao raciocínio, aqueles dados poderão acalentar alguma surpresa no resultado final das eleições, na disputa pelo segundo lugar, já que a lista independente, do movimento AD SJM Sempre, apresenta-se em qualquer dos dois indicadores mencionados, uns furos acima do principal adversário.

A acontecer, isto penalizará a incoerência política de alguns candidatos, pela não realização de um debate sério sobre a Praça, afastando a campanha do centro, optando por ações populistas maioritariamente nos bairros periféricos. A apresentação de soluções avulsas para a Praça, algumas após a divulgação do programa eleitoral, assemelha-se a atos desesperados ao jeito dos candidatos a presidentes de clubes de futebol. 

No domingo, a contagem de votos será esclarecedora.

Será um serão com um ouvido em S. João da Madeira e outro em Setúbal, onde João Ribeiro concorre à autarquia local, com uma certeza, atendendo ao número de eleitores daquela cidade, será o conterrâneo a obter mais votos nas eleições de 2013.

 

(a publicar no dia 26/09/13)

 

quarta-feira, setembro 18, 2013

Opiniões

                Nas páginas do labor destinadas às crónicas, vai imperando o pluralismo. Nos tradicionais artigos de opinião, juntam-se textos de militância com artigos de cidadania. Esta salgalhada evita o unanimismo. Havendo críticas para ambos os lados, trocando-se argumentos e sugerindo-se ações.

                Eu leio com particular atenção os artigos dos meus companheiros de páginas. Não tenho o hábito de publicamente tecer comentários mas, por vezes, comunico diretamente com alguns deles, quando verifico ser necessário.

                No contexto eleitoral que atravessamos, este equilíbrio de publicação de artigos de opiniões, é quebrado com os textos dos candidatos.

Por estes dias, as páginas dos jornais enchem-se de campanha eleitoral. Além das várias reportagens sobre as ações dos vários partidos, surgem textos de opinião, nos quais alguns candidatos discorrem sobre temas, por eles considerados plausíveis de apreciação.

Para os leitores mais distraídos, um artigo assinado por um colunista não usual nas páginas dos jornais, confere-se sempre de novidade. Se não reconhecer aquele rosto, há sempre a tendência de leitura do texto, para conhecer a opinião do autor. É claro, que ao fim de algumas linhas, o mistério está desvendado e o colunista identificado com algum partido político, o que pode refrear o entusiasmo do leitor, ou pelo contrário, aumentar o interesse, conforme as opiniões e sensibilidades de cada um.

Alguns articulistas identificam-se, juntando à fotografia e nome, o seu estatuto de candidato. Uma opção honesta para com o leitor, que pode assim, escolher previamente a leitura ou não do artigo assinado. 

                Em democracia, todas as opiniões são válidas. 

                Não consigo classificar do mesmo modo os argumentos esgrimidos. Apreciações pessoais utilizando-se proveniência social e guarda-fatos são extremamente penalizadores para quem as utiliza. Do mesmo modo, agitar com o bairrismo, numa época em que os oito quilómetros quadrados da cidade não são suficientes para a população local, que necessita de trabalhar ou dormir fora do concelho, é um argumento redutor. Já questionar a independência política, quando no geral, todos os partidos têm candidatos e cabeças de lista aos demais órgãos na mesma condição, não é percetível.

                Esperava-se mais dos textos políticos publicados. Acreditava-se que fosse esclarecido o programa eleitoral dos vários partidos. Promessas esmiuçadas. Medidas tangíveis, com números concretos associados a cada uma. Já para não falar do cabimento orçamental. Do ganho associado, indicando o valor de investimento de cada promessa.

Sobre isto nada li.

Ingenuamente, aguardava uma campanha eloquente, sem se utilizar a arma do ataque ao adversário, com alegação básica. Uma campanha esclarecedora, sem procurar a vitimização. Uma campanha com debates de ideias, sem a preocupação de promover manchetes dos jornais.

Provavelmente terei que esperar mais alguns anos…

Enquanto isso, vou continuando a seguir os textos do Artur Nunes, do Pedro Neves, da Joana Costa, do Fernando Moreira, já que a partir de Outubro… só estes me acompanharão na edição do jornal labor.  

 

(a publicar no dia 19/09/13)

quarta-feira, setembro 11, 2013

Ambição

                A nova piscina municipal tem sido tema recorrente nos meus textos. Sempre me manifestei contra, atendendo a que considerava ser possível fazer uma adaptação das atuais instalações, economizando-se uns largos milhares de euros.
Sobre o assunto escrevi várias vezes, idealizando um plano B, caso não fosse garantido financiamento para a nova piscina, através de fundos comunitários.
                Não vou repetir os argumentos de outrora.
Nem mudei de opinião.
Perante a possibilidade, cada vez mais real, do financiamento ficar garantido, é necessário olhar-se para o projecto com outros olhos.
Longe de mim criticar o projecto vencedor e muito menos o seu autor.
Acontece que, por linhas tortas, o dono da obra vai pedir ao autor umas pequenas alterações.
Esta abertura deve ser aproveitada.
A flexibilidade da Câmara Municipal de S. João da Madeira, em pretender dotar o complexo de uma vertente de apoio à natação de alta-competição regional, permite apresentar algumas considerações desportivas. 
Sendo eu um optimista e ambicioso, nada me impede de escrever as seguintes linhas.
A natação, como actividade desportiva e física, engloba cinco fases distintas:
- adaptação ao meio aquático
- ensino
- manutenção física
- treino
- competição  
A estas, deve-se acrescentar a utilização da piscina por aqueles que procuram momentos de lazer: uns mergulhos, umas brincadeiras refrescantes e uma boa dose de diversão.
                Tendo tudo isto presente, o caderno de encargos da nova piscina solicitava soluções para todas utilizações: um tanque para adaptação; um tanque para lazer e outras actividades físicas; uma piscina de 25 metros, com duas pistas de 50 metros acopladas, permitindo o ensino, o treino e também a manutenção física.
                De fora ficava a componente competitiva, pois para receber provas homologadas pelas entidades competentes, é necessário uma adaptação, ficando, para o efeito, a piscina com apenas com 25 metros, o que não permite receber todo o tipo de competições.
                Convém referir que os Campeonatos Nacionais de Natação, em qualquer escalão, atraem centenas de participantes, familiares e demais apreciadores da modalidade, como S. João da Madeira teve oportunidade de verificar no segundo fim-de-semana de Julho passado, na piscina exterior.
                Se for construída como projectada, a nova piscina ficará amputada. Gastar cinco milhões e não construir bem será um erro. Além do desperdício de verbas comunitárias.
                A maior ambição de S. João da Madeira será construir um equipamento público diferenciador. Ora, tal só será conseguido através de uma piscina que englobe todas as vertentes da natação, incluindo a possibilidade de receber, no Inverno, provas nacionais e internacionais homologadas.
                A melhor forma de o fazer é construir uma piscina multiusos.
Tal como os pavilhões modernos, a ideia será dotar a nova piscina com todas as 8 (ou 10?) pistas com 50 metros de comprimento, permitindo adaptar o plano de água às reais necessidades: no dia-a-dia aulas, treinos, horário de actividade física para idosos e espaço de lazer; quando necessário, todas as divisões seriam retiradas e todo o volume de água seria destinado à realização de provas de competição, ou para qualquer outra actividade.
Ressalvo, para evitar erros de interpretação, que sou favorável à construção do tanque de adaptação ao meio aquático, tal como idealizado no projecto vencedor. A grande alteração, seria a fusão dos outros dois num só, repito-me para vincar a ideia.  
                A quinze dias das eleições autárquicas é de estranhar que os vários candidatos ignorem este assunto, não se referindo a ele de forma objectiva e clara. É um grande investimento, espera-se que seja co-financiado, no entanto, vai obrigar a autarquia a contrair um empréstimo, a aumentar a sua dívida e pela cidade espalham-se cartazes partidários e nem uma só palavra sobre o assunto.
                Um debate que não surge, evidenciando que o resultado da sondagem publicada em Agosto, não é fruto do acaso.
                A Câmara Municipal de S. João da Madeira, caso queira, poderá construir na cidade uma piscina ao nível das melhores no país, agradando aos seus habitantes, à comunidade da natação e a todos os forasteiros que a procurem, para os mais variados fins.
                Acredito que será esse o caminho.
 
(a publicar no dia 12/0913)
 

quarta-feira, setembro 04, 2013

Fim de Agosto

Para o regresso, quatro breves apontamentos do mês findo:

1.            A sondagem publicada no jornal “O Regional” condicionou as próximas eleições autárquicas. Em especial, por ser divulgada a menos de dois meses da data agendada para o escrutínio e ao ser publicada na última edição, antes das férias de Agosto.

Ao não permitir qualquer reacção política, nem comentário, nem estudo contraditório, nem acção de mobilização dos eleitores, por coincidir com o mês em que a maioria da população está de férias, existe a forte convicção que as eleições já estão decididas.

                Os números divulgados, a confirmarem-se no dia 29 de Setembro, permitem antever uma folgada vitória de Ricardo Figueiredo, uma disputa curiosa pelo segundo lugar, entre o candidato do PS e a candidatura do Dr. Jorge Lima e uma feroz disputa entre as restantes três forças políticas – CDS/PP, CDU e Bloco de Esquerda – pelo quarto lugar, ou pela fuga à menos votada.

                A sondagem confirma a ideia, expressa anteriormente, da população local se identificar com a independência política. Entre a entrega desinteressada à causa pública ou a luta partidária, os eleitores preferem a primeira, assim como, optam pela elevação argumentadora em detrimento do ataque insultuoso. São sinais democráticos bem visíveis por todo o país e a maioria da população sanjoanense reconhece-se neles. 

2.            Uma notícia do Jornal Notícias, sobre a hipotética devolução de alguns hospitais aos respectivos núcleos concelhios da Santa Casa da Misericórdia, evidenciou outra forma de fazer política: a assertividade. Um comunicado curto, vincando uma ideia antiga, a necessidade de o Hospital de S. João da Madeira permanecer no Serviço Nacional de Saúde. Em contraste, uma longa lista de acusações, esquecendo a necessidade de racionalizar meios do Estado, tão correctamente apregoada durante os anos 2005 a 2009.

3.            As características essencialmente urbanas do concelho de S. João da Madeira permitem encarar a época de incêndios com alguma distância. Apesar de muitos fogos serem em freguesias de concelhos vizinhos, as chamas raramente incomodam a população local. O fumo, esse faz-se sentir e permite visualizar ao longe a desgraça que outros estão a viver. Neste contexto, a notícia da detecção de um eventual incendiário, oriundo de S. João da Madeira, não possibilita encarar todo este processo sem se questionar o falhanço da educação e da acção cívica comunitária.

4.            A exposição de Joana Vasconcelos no Palácio Nacional da Ajuda com 235.000 espectadores, a grande maioria durante o mês de Agosto e a exibição do filme “A Gaiola Dourada”, ao qual assistiram em Portugal no último mês, o da estreia, 430.000 espectadores, demonstram a capacidade dos criadores nacionais em atrair público. Contribuí para esses números, intervalando os banhos e as sessões de leitura, para, em família, visualizar as concepções de Joana Vasconcelos e a divertida história filmada pelo luso-francês Ruben Alves. Depois do sucesso da exposição em Versailhes da artista portuguesa, temos outro bom exemplo da exploração do filão: comunidades portuguesas.