terça-feira, junho 27, 2017

da Madeira

                José Mattoso, prestigiado historiador português, desenvolveu a tese que alguns nomes das localidades derivam da sua principal atividade económica. Porto é o mais significativo e serve como exemplo. Do mesmo modo, a concentração de artesãos em determinada rua, ou mesmo, localidade, serviu como designação das mesmas. Neste sentido, tal como já o escrevi anteriormente neste jornal, S. Paio de Oleiros, S. Félix da Marinha e S. João da Madeira, seriam nas terras medievais de Santa Maria a localização de artífices da olaria, da pesca e do trabalho em madeira.

                Esta tese fundamenta a apetência histórica da indústria de S. João da Madeira.

Em época anterior ao aproveitamento do vapor como fonte de energia, a transformação de madeira servia essencialmente para a construção civil, mobiliário e armazenamento de alimentos. Ficou na toponímia da cidade o lugar do Orreiro, vocábulo associado à trave que entra na cavidade das lajes de certos moinhos, ou seja, um termo de edificação. É certo que em épocas tão remotas, o trabalho em madeira cingia-se à serração para tábuas e ao debaste através da enxó. Pode-se ainda pressupor que dessa madeira, cortada nas oficinas da povoação, conseguia-se produzir tamancos, socas e chancas, no que terá sido a génese da indústria do calçado. A toponímia, também aqui, tem um papel importante, pois identifica-se, precisamente, uma Rua dos Tamanqueiros, no norte da cidade, numa artéria perpendicular à Rua do Condestável.

                Não há transformação de madeira sem árvores e continuando pela designação de nomes de ruas ou lugares de S. João da Madeira, é possível identificar espécies como castanheiros (através do topónimo Largo do Souto, sendo este o nome coletivo para um conjunto destas árvores, o que é uma evidência histórica do arvoredo existente outrora na localidade), carvalhos (a existência de um lugar nas imediações chamado Carvalhosa, prova a presença antiga destas árvores, embora, tenha apreciado umas fotografias antigas de um belo carvalhal na zona de Fundões), além da Devesa-Velha, cujo significado indica lugar cercado por árvores, ou noutra versão, alameda ladeada por árvores. 

Tudo mudou com a revolução industrial.

Primeiro com o consumo de lenha para alimentar as caldeiras. Aumentado a procura nas imediações dos novos centros industriais.

O que acredito ter tido repercussões no negócio dos artesões da madeira foi a construção do caminho-de-ferro, com o fabrico de traves para as linhas e o facto das próprias locomotivas serem alimentadas a lenha. As serrações passaram ter outra capacidade de produção e como o produto tinha muita procura, a maior parte destas pequenas indústrias começaram a formar-se na proximidade da principal linha ferroviária do país, a linha do Norte.

                As serrações mais distantes da ferrovia foram-se especializando em outros produtos. É certo que a construção e o mobiliário continuavam a absorver muita madeira, no entanto, a especialização e por outro lado, a reconversão dos artesãos locais, fizeram com durante o século XX, ainda assim, vigorassem em S. João da Madeira algumas serrações, a produção de urnas, associadas à indústria de outros artigos funerários, como a cera, a produção de tábuas de passar a ferro e noutra perspetiva, os lápis de madeira, que ainda hoje são produzidos. 

A história da indústria da madeira muda com a chegada da eletricidade e mais tarde das locomotivas movidas a diesel e claro, com a introdução do betão na construção civil. Aqui, a transformação de madeira teve que descobrir outras soluções: caixas para acondicionar frutas ou legumes foi uma delas e após à utilização de polímeros naquelas embalagens, a produção de paletes tornou-se a solução ideal para quem trabalha no sector da madeira. Outra solução passou por painéis em platex, mdf, ou outros aglomerados.

                A produção florestal está associada à procura da indústria transformadora. Das espécies autóctones evoluiu-se para pinheiros, por insistência do Estado Novo (desenvolvendo-se a industria resineira e o aproveitamento do pinho para os mais variados fins) e mais tarde para as manchas de eucaliptos, alimentando-se as celuloses, que são hoje os principais clientes da floresta.

O desenvolvimento urbano da cidade, com a inerente industrialização, confinou a pequenas manchas as espécies florestais. Não é por isso que S. João da Madeira fica indiferente aos trágicos acontecimentos vividos na pretérita semana nos concelhos do interior do país.

                Sendo a produção de eucaliptos a principal fonte de riqueza da florestal nacional, pelo seu rápido crescimento até ao abate, parece-me importante, que não esteja sujeito a ações de vilipendiação, como fogos. Todas as ações de prevenção são importantes, assim como, recuperar os ensinamentos do passado: limpeza, acumulação de águas pluviais, evitar as monoculturas, introduzir pelo meio do pinhal ou do eucaliptal várias espécies autóctones, com maior resistência ao fogo e desta forma evitar a sua propagação por extensões tão elevadas. No fundo, é necessário reverter os erros dos últimos cinquenta anos e procurar encontrar um desenvolvimento sustentável na floresta.

 

(a publicar no dia 29/06/17)

terça-feira, junho 13, 2017

Os estáveis e os instáveis

Na passada semana prosseguiram as entusiasmantes eleições em alguns países europeus.

Em Março, na Holanda começou a esboçar-se o desmoronamento do populismo da extrema-direita nacionalista. Seguiram-se as eleições presidenciais franceses. Uma primeira volta, com grande incerteza sobre quem seriam os dois candidatos mais votados, que permitiu fazer-se toda e qualquer especulação sobre a política francesa. Mesmo após a vitória de Emmanuel Macron, na eleição definitiva, surgiram vários reparos: o fim da dicotomia “jacobinos” e “girondinos”; o voto “útil” republicano contra a Frente Nacional (FN) da família Le Pen, empolando-se o resultado desta força política, afirmando-se precipitadamente ser o maior partido de França; a impossibilidade do presidente eleito poder governar, pois o parlamento a eleger em Junho ser-lhe-ia hostil.

Chegados ao dia 11 de Junho, os resultados eleitorais de França permitem chegar a conclusões diferentes das premissas ventiladas após as eleições presidenciais. Em primeiro lugar, o novo partido “social-liberal” fundado em torno das convicções do novo Presidente passou a ser a maior força do parlamento, garantindo assim, a governabilidade da França. Em segundo lugar, a dispersão de votos pelos restantes partidos, fazendo com que a FN seja apenas a quarta força eleitoral, à frente do Partido Socialista (PSF), mas atrás do Partido Republicano e da esquerda insubmissa de Mélenchon. Por último, como se pode ver pelas linhas anteriores, o PSF perdeu completamente o seu eleitorado.

Ainda falta apurar os resultados definitivos das eleições legislativas, a segunda volta, a decorrer no próximo Domingo, no entanto, dá para perceber que o PSF está a ser penalizado pela péssima atuação do anterior Presidente da República Francesa e o seu indeciso governo. O PSF, mesmo com a sua deriva ideológica à esquerda, solução encontrada para evitar processos eleitorais semelhantes aos socialistas gregos, ou mesmo, holandeses, não cativou. Desta vez, o seu eleitorado preferiu o discurso claro, integrador e pró-europeu de Emmanuel Macron, optando por apoiar um partido central.

Um partido “social-liberal”, como se definiu o “A República em Marcha”, pode ser novo em França, no entanto, em Portugal já existe há alguns anos, precisamente o PPD / PSD, que alterna entre a ideologia liberal e a social-democracia de inspiração cristã. Curiosamente nos gráficos dos resultados eleitorais do passado Domingo, nos órgãos de comunicação social franceses, os resultados do partido de Macron apareciam a laranja.

A estabilidade eleitoral francesa, a sua opção europeia, contrasta com a instabilidade inglesa. Ambos os países tinham resultados nas eleições europeias semelhantes – uma clara vitória de partidos que pretendiam uma saída da União Europeia (em França, a FN e no Reino Unido, o UKIP). Para agravar a posição dos britânicos, no referendo sobre a permanência na Europa, o voto foi dividido, com ascendente para o “Não”. Com o “Brexit” na agenda, a primeira-ministra britânica forçou eleições antecipadas, para garantir maior capacidade negocial, baseando-se em sondagens que eram favorável ao seu partido, o Conservador. Uma campanha eleitoral com várias contradições, um discurso pouco claro, com pouco apoio dos jovens, não permitiu a Theresa May alcançar a maioria absoluta e corre o risco de governar com uma oposição maioritária no parlamento, caso não consiga fazer uma coligação séria com algum partido.

Por seu lado, o Partido Trabalhista conseguiu o melhor dos resultados dos últimos anos. Com um discurso, apelidado de retrógrado, do seu líder, Jeremy Corbyn, que agradou sobretudo ao eleitorado mais novo, o que não deixa de ser uma curiosidade. No meio da instabilidade inglesa, parece plausível afirmar que a convicção do líder Trabalhista foi o único argumento estável das eleições britânicas.

Pela diferença de posições dos partidos da esquerda moderada, em França e no Reino Unido, podemos verificar que as derivas ideológicas não correspondem exatamente aos mesmos resultados eleitorais. Cada país é diferente de outro, havendo sempre voto penalizador para discursos e atos pouco claros. Acontecendo o contrário, quando a convicção é grande, quer seja ideológica, quer seja inclusivamente pragmática, ou pró-Europeia, o eleitor prontifica-se a premiar a coerência.

A terminar, umas palavras para as eleições autárquicas em S. João da Madeira. Após a recusa de Ricardo Figueiredo em ser candidato pela coligação PSD/CDS-PP, recordo a ideia democrática portuguesa baseada nos partidos políticos. Cada vez mais me convenço, que o caminho dos independentes é seguir o exemplo de Rui Moreira: pela cidade, sozinho e quem quiser apoiar… não fica com os “louros” políticos.

 

(a publicar no dia 14/06/17)

quarta-feira, junho 07, 2017

O convite

                A aproximação temporal às eleições autárquicas e o desconhecimento dos candidatos de alguns partidos contrasta com o período que antecedeu o sufrágio de 2013.

                Sendo certo que em 2016,ano de eleições intercalares, a agitação partidária culminou com a vitória com maioria absoluta da coligação PSD / CDS-PP, no presente ano, o processo eleitoral ainda permanece em “banho-maria”.

                Durante os quatro anos alguma coisa mudou.

                Um balanço autárquico pode ser efetuado por três indicadores financeiros: despesas com o pessoal; endividamento e investimento efetuado. Na apresentação do relatório de contas referente ao ano de 2016, a autarquia de S. João da Madeira anunciou a redução da dívida municipal, para quase metade do valor de 2013, informando simultaneamente que em igual período o investimento tinha sido de 20 milhões. Sobre as despesas com o pessoal, confesso não ter retido nenhum número no último ano e recordo que em tempos houve a tentativa de empolar os números dos funcionários municipais, por parte de um antigo vereador, posição contrariada e demonstrada pelo executivo liderado por Ricardo Figueiredo.

                Aos três indicadores tradicionais, deve-se acrescentar um quarto: capacidade de atrair investimento para o município. Neste ponto, a reabilitação urbana financiada através de fundos comunitários (PEDU), com o consequente investimento privado em torno da Rua Oliveira Júnior ajudam a quantificar o montante global de euros a investir, que transformarão a entrada norte da cidade. No presente ano, a existência de uma grua naquela zona da cidade, é um sinal que os tempos são de mudança.

Outra forma de se fazer um balanço autárquico, é verificarmos a capacidade de resolução de assuntos herdados do executivo anterior. Se Castro Almeida, em oito anos, conseguiu resolver problemas antigos: pontão no Orreiro, túnel na Rua 5 de Outubro, restauro no Palacete dos Condes, finalização do arranjo da rua dos “jeitos”, acrescentando-se ainda o Jardim na Avenida da Liberdade, o Parque Urbano no Rio Ul, o Museu da Chapelaria, os Paços da Cultura, rematando a lista com a diminuição da dívida municipal, muito suportada pela venda de terreno para centro comercial.

Para o futuro presidente subsistiriam as inaugurações da Casa da Criatividade e da Oliva Creative Factory. Restauros com financiamento garantido, ficando Ricardo Figueiredo com a tarefa facilitada. O mesmo não aconteceu com a Piscina projetada por Souto Moura, com o desfecho conhecido de todos, que não vou relembrar.

Pelo caminho, neste mandato com intervalo eleitoral, concretizou-se o Museu do Calçado, enriquecendo o núcleo museológico da cidade, apoiou-se o empreendedorismo com a diversificação de incubadoras de empresas, lançaram-se obras para inaugurar antes do final do mandato, tendo em vista a melhoria geral da cidade e da sua população.

É certo que estes anos ficarão lembrados pela reabertura da Urgência do Hospital de S. João da Madeira. Desfecho que conheceu vários episódios, com duas resoluções diferentes, uma revertendo a outra. 

A partir do próximo ato eleitoral, haverá a necessidade de intervir de novo na Praça Luís Ribeiro, para emendar erros do passado. Há a necessidade de dar ocupação aos edifícios municipais devolutos (Palacete dos Condes e Casa do Rei da Farinha). Será imperioso resolver o problema da sobrelotação da piscina municipal. E para finalizar, haverá necessidade de se continuar a apostar na animação da cidade.

Neste sentido, o convite endereçado a Ricardo Figueiredo para se recandidatar, pela capacidade política demonstrada, pela resolução de problemas, pelo lançamento de projetos para a cidade, faz todo o sentido.

 

(a publicar no dia 08/06/17)