quarta-feira, dezembro 07, 2011

Eu e o Vouguinha


Rumei a sul. Segui pela auto-estrada até Albergaria-a-Velha. Apanhei outra e continuei até ao rio Vouga. A partir daí, fui circulando por estradas secundárias, orientado pelas indicações de Museu Ferroviário. Cheguei a Macinhata do Vouga. Atravesso a passagem de nível, sem guarda e observo a bitola. Em simultâneo, uma automotora grafitada chegou à estação. Espantosa coincidência. Poucos passageiros. Rapidamente o comboio fica vazio e parado. O condutor abandona o seu posto de trabalho e dirige-se para o fim do comboio. Está feita a inversão de marcha. O Vouguinha está pronto a arrancar para Aveiro. O interesse desperta a curiosidade acerca do horário. Duas horas depois parte. Nem procuro saber a hora de retorno.


Concentro-me no motivo da visita. Volto atrás. À entrada para o largo da estação, uma locomotiva a vapor de cor preta, aparentando bom estado de conservação, mostra-se aos visitantes. Caminho para a entrada do Museu e a porta fechada ostenta um pequeno aviso. Visitas só por marcação. Espreito pelos vidros, observando as peças recolhidas. Despacho de mercadorias, com todos os utensílios e objectos burocráticos reunidos no átrio. Locomotivas ou carruagens tinham visibilidade condicionada. Espreitei pelo meio de traves. Vi o que pude. Voltei à entrada da estação e contentei-me com a locomotiva preta.


Escrevi várias vezes sobre o Vouguinha, expliquei a sua história, mencionei a beleza da ponte de Santiago, fiz referência ao Museu e quando me decido a visitá-lo está fechado.


Sigo de automóvel sem voltar para trás. Desorientado. Esqueço o entroncamento em Sernada do Vouga. O ramal sul vindo de Aveiro a encontrar-se com o troço Espinho – Viseu. O único local largo na linha de bitola estreita. Fica para a próxima.


Perdi a linha ferroviária de vista. O rio Vouga faz uma curva larga à minha direita. Observo a larga planície. Na estrada, à esquerda uma placa indica a estação arqueológica do Alto do Cabeço de Vouga. Subo. O gradeamento de segurança impede o acesso. Ao domingo está encerrada ao público. Detenho-me um momento ante das grades a observar. As construções arredondadas e ao fundo o rio Vouga.


De volta à estrada. Uns metros depois, estou no IC2. Lamas do Vouga. A ponte medieval do Marnel. Uma bateira, no meio do campo alagadiço, justifica a construção histórica. Na ponte, sinais de uma portagem. As taxas que nos acompanham desde a fundação da nação.


Regresso a casa. Para norte. Estrada nacional ou auto-estrada. Escolha múltipla. Duas hipóteses para cada tipo. A nascente, os carris do Vouguinha reclamam interessados. Um quarto de século ao abandono.


“Na quietude dos dias do século passado, o fumo do Vouguinha rasgava o lado poente de S. João da Madeira. Ainda hoje, apesar de ter deixado o vapor, nas tardes calmas de fim de semana ecoa o som do seu apito, quebrando o silêncio dos dias de descanso (…)”. Relembro as minhas palavras, alinhadas a outro propósito.


Um dia hei-de escrever sobre essas tardes calmas.



(a publicar dia 08/12/11)