terça-feira, novembro 29, 2005

Vouginha: do Metro do Porto ao TGV

Na quietude dos dias do século passado, o fumo do Vouguinha rasgava o lado poente de S. João da Madeira. Ainda hoje, apesar de ter deixado o vapor, nas tardes calmas de fim de semana ecoa o som do seu apito, quebrando o silêncio dos dias de descanso. O comboio da Linha do Vale do Vouga teve sempre direito a diminutivo, foi sempre tratado carinhosamente pelos habitantes da região. O movimento das locomotivas e suas carruagens surgiu em 1908, quando este caminho de ferro foi inaugurado, ligando numa primeira fase Espinho a Oliveira de Azeméis. Esta Linha tinha como propósito ligar Viseu ao litoral, objectivo conseguido em 1914. Em seis anos foram construídos 140 quilómetros de carris, aproveitando-se o vale formado pelo Rio Vouga, para ligar a Beira Alta ao litoral. Ao projecto inicial, entroncou-se em 1911, a ligação por via férrea entre Aveiro e Sernada do Vouga – freguesia do concelho de Águeda, que ficou conhecido pelo ramal de Aveiro.
Desde o final de 1989, o Vouginha já não ecoa no seu Vale. A linha resume-se agora à ligação de Espinho até Sernada, mantendo-se o ramal desta estação a Aveiro. Os carris são agora menos, apenas os 62 km de norte para sul, mais os 34 do ramal. Do tempo do vapor, resta agora o Museu, em Macinhata do Vouga.
Factores como a velocidade e os horários dos comboios são fundamentais nas opções de quem pode preferir este transporte. A linha do Vouga está dotada de automotoras herdadas da antiga linha da Póvoa, que atingem velocidades máximas de 70 km/h, caso o estado dos carris o permita. Pelo que pude constatar, de Oliveira de Azeméis para Sul o estado da linha está muito degradado, limitando o andamento das automotoras a 35 km/h. Por outro lado, os horários não são os mais adequados nem para quem trabalha na indústria, nem para serviços e comércios. Algumas estações e apeadeiros, além de estarem muito degradadas, obrigam a paragens do comboio para entrar um ou dois passageiros.
A reconversão desta linha em Metro de Superfície foi um projecto que surgiu há vários anos mas, nunca se concretizou. Na última campanha para as eleições autárquicas, o partido vencedor lançou de novo a ideia. Não cheguei a perceber qual o alcance territorial deste Metro. Se o objectivo único é promover a mobilidade na Região Entre Douro e Vouga (EDV), penso que o projecto não terá viabilidade. Outras regiões, ou agrupamento de concelhos estão a reavaliar os seus projectos de Metro de Superfície, como é o caso de Coimbra e o seu Metro para a Linha da Lousã. Para quem pode, o automóvel próprio é sempre a opção mais rápida e o transito na EDV não é muito intenso, com excepção da ligação de Santa Maria da Feira a S. João da Madeira. As pequenas deslocações dificilmente se farão por Metro.
Caso a opção seja aproveitar o limite do percurso da linha do Vouga, inaugurado em 1908, mas com horários regulares, havendo partidas de quinze em quinze minutos ora para Norte, ora para Sul, poderá ser vantajoso para algumas pessoas deslocarem-se por Metro. No entanto, isto não me parece suficiente para a viabilidade deste projecto. Um Metro a Sul da Área Metropolitana do Porto (AMP) faria certamente pressão suficiente para ligar Espinho a Vila Nova de Gaia e desta forma, expandir o Metro do Porto. Os concelhos do Sul teriam um transporte muito mais rápido e envolvente com o centro da grande cidade e claro, muito mais cómodo.
Penso que a entrada de S. João da Madeira para a AMP, só fará sentido quando este concelho deixar para trás a região híbrida do Entre Douro e Vouga e se envolver plenamente nos projectos comuns com os seus novos parceiros, não desperdiçando nem recursos, nem energias em projectos virtuais.
Apesar desta ser a solução mais lógica, penso que devia ser dada mais dimensão ao Metro. Se a Norte um novo rumo pode ser dado ao “Vouguinha”, o que dizer a Sul? Dado o consenso da estação ferroviária de Aveiro como ponto de paragem tanto do Alfa Pendular, como do comboio de Alta Velocidade, no caso de construção da linha vulgarmente designada como TGV, é imperioso ligar toda esta região a esse rápido e “fashion” transporte, sobretudo para quem se desloca para a capital . Obviamente que o trajecto actual não serve. A passagem por Águeda retira rapidez na ligação a Aveiro. O ideal seria ao trajecto actual S. João da Madeira - Oliveira de Azeméis - Albergaria a – Velha construir um troço entre esta cidade e Aveiro. A viabilidade seria conseguida, claro está, com horários complementares à paragem do comboio rápido em Aveiro mas apenas nas sedes de concelho.
Os próximos tempos serão decisivos em matéria de opções do governo sobre os grandes investimentos públicos. O regresso às ligações ferroviárias, quer em Alta Velocidade, quer em velocidade média, está de novo na ordem do dia. Paralelamente, deviam ser lançados estudos sobre a viabilidade da reconversão da linha do Vouga em Metro de Superfície. Nos últimos tempos, Portugal discutiu muito sobre esses investimentos e adiou a construção da ligação ferroviária em Alta Velocidade a Espanha. À nossa escala, não podemos cometer os mesmos erros, a reconversão do Vouginha devia começar já.