A ideia de se construir um Centro de Alto Rendimento Desportivo (CAR) em S. João da Madeira ainda não me entusiasmou.
O grau de exigência dos habitantes de uma cidade com qualidade de vida vai aumentando com o passar dos tempos e por isso, é perfeitamente natural a reacção de desconfiança, relativamente ao anúncio deste projecto.
Confesso, como antigo dirigente desportivo, que nutro bastante simpatia pelo conceito do desporto de alta competição. Desde o anúncio do CAR, analisei as várias opiniões emitidas, dos cépticos aos alinhados e não fiquei convencido com os argumentos apresentados. É certo que até ao próximo ano (esta fase de execução do plano de pormenor tem a duração de 12 meses), podem surgir uma série de factos ou factores, que me podem convencer da utilidade e importância para o concelho de tal empreendimento.
Vejamos então, quais as minhas dúvidas sobre a oportunidade deste projecto, que se resumem a três: urbanísticas, desportivas e investimento público.
A inauguração do Parque Urbano do Rio Ul trouxe um dado concreto por parte do projectista. Segundo o Arquitecto Sidónio Pardal, um Parque Urbano demora uns trinta anos a consolidar-se. Se olharmos para os últimos trinta anos, verificamos que a cidade ganhou três espaços verdes. Primeiro através da “doação” de terrenos e árvores, para o Parque Municipal Ferreira de Castro, há alguns anos o Jardim na Avenida da Liberdade e agora com este aproveitamento das margens do rio, em terrenos consagrados na reserva ecológica do concelho.
Para as gerações futuras, os terrenos municipais que restam são poucos. Ao longo das próximas três dezenas de anos, para se continuar a viver com qualidade de vida, é necessário proceder-se à abertura de novos espaços verdes, ou ampliação dos existentes. É certo que os terrenos agrícolas, no lado poente da cidade, poderão dar lugar a um novo parque urbano. Mesmo com esta reserva equilibrada, de longo prazo, parece-me que a natural procura por parte dos munícipes do novo parque do Rio vai obrigar a, no imediato, surgirem soluções de lazer, de forma a enraizar os hábitos urbanos da população. Neste sentido, salvaguardar-se, a médio prazo, os terrenos adjacentes a norte, para aí se estudar hipóteses de implantar novos conceitos de cidades criativas, do conhecimento e da cultura, seria o aconselhável.
Essencialmente, para que não fique apenas o conceito da modernidade, os vinte e quatro hectares consagrados para o CAR seriam suficientes para albergar um parque temático, direccionado para o conhecimento. Exemplos que me ocorrem de espaços semelhantes: Visionarium de Santa Maria da Feira, ou Fluviário de Mora.
Nos últimos anos, os investimentos municipais em equipamentos desportivos, além de proporcionarem melhores condições de treino e jogo aos atletas locais, visaram, sobretudo, a componente de manutenção desportiva, permitindo aos munícipes alugar espaços para a prática de exercício físico. Ao investir num equipamento que não servirá no imediato os habitantes da localidade é, digamos, trocar o bem-estar das pessoas por um cartão-de-visita do município.
Tenho muitas dúvidas, em matéria de ocupação pelas diversas federações desportivas, de quais realmente precisarão de um novo espaço. Existem várias modalidades que devido ao treino em condições específicas, como canoagem, remo, ou vela, estão a desenvolver, em locais apropriados, centros de alto rendimento em determinados pontos do país, com condições naturais para a prática desses desportos. Em Sangalhos vai nascer um CAR associado ao ciclismo, em Rio Maior um para a Natação, o do Jamor vai ser preparado para o atletismo, Mirandela tenta o de ténis de mesa.
O CAR das Travessas poderá estar ocupado, durante vários dias, pelas mais variadas federações e desta forma como se articulará a actividade das colectividades locais? Retirar essa hipótese aos munícipes, implica uma redefinição na política desportiva da cidade.
Em matéria de investimento municipal, as prioridades parecem-me ser outras. Em primeiro lugar, pela falta de capacidade do município. Em 2008 para terminar com os jeitos na rua dos mesmos e com o túnel da Rua 5 de Outubro, a autarquia teve que recorrer à banca. Nos próximos anos, deveria avançar para a transformação do cinema Imperador em Casa das Artes do Espectáculo, o que por si só implica um grande investimento. Caso não haja comparticipação imediata, terá que se recorrer a outro empréstimo.
Penso que tudo poderá ser amenizado, com a lógica das mais-valias para o município, associada aos vários planos de pormenores lançados recentemente. Onde actualmente existe um gaveto, uma empenha de um prédio, um terreno, idealiza-se a edificação, a construção, com toda a possibilidade de criar receitas para o município, através de taxas, impostos e quejandos.
Esta visão empresarial provavelmente é a mais correcta para o concelho mas, confesso que me assusta, pela ausência de políticas centradas nas pessoas, nas suas necessidades e nas suas susceptibilidades.
Na década de 90, do século passado, S. João da Madeira discutiu durante anos a possibilidade de abertura na cidade de um pólo universitário. Várias tentativas foram ensaiadas, desde instituições privadas, até a acordos com a Universidade de Aveiro. Nas eleições autárquicas de 2001, apareceu um candidato que rompeu com a ideia. Tratava-se precisamente do actual Presidente da Câmara Municipal, Castro Almeida.
Sete anos depois, a cidade está de novo focalizada num projecto externo e desenraizado. Corresponderá isso ao fim de um ciclo eleitoral?
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