quarta-feira, julho 09, 2008

Principezinho

 

            Na já longa história do Campo de Férias Estamos Juntos existem vários episódios, acontecimentos ou factos, que foram determinantes para a sua longevidade e actual sucesso.

Não consigo precisar em que ano, nem em rigor, qual a edição desse evento de ocupação das férias das crianças e jovens, que perdura desde 1982, em que um participante surpreendeu todos os restantes e demais monitores ou organizadores.

            A passar férias em casa de família, o jovem distinguia-se dos demais, por se fazer acompanhar por um bloco de papel e alguns riscadores. Escusado será comparar esta particularidade com as comuns, entre os jovens, bolas ou outros apetrechos desportivos (raquetes ou bicicletas), ou consolas de jogos, ou até leitores das datadas cassetes.

Este era diferente. Desenhava. Bem, acrescento eu. Resumia os seus trabalhos a bonecos. “Desenho bonecos”, dizia com uma simplicidade e alegria contagiante. Ao longo desse mês a actividade do Campo de Férias ficou retratada, caricaturada pela mão deste pequeno ilustrador. 

A qualidade dos seus trabalhos extravasou o Campo de Férias e uma galeria de arte em S. João da Madeira reconhecendo o seu mérito, expôs alguns dos seus quadros.

Curiosamente, seria através da música que este jovem se afirmaria.

Refiro-me em concreto, a Manuel Cruz. Celebrizado no panorama musical nacional como vocalista dos Ornatos Violeta e Pluto e tendo agora lançado o seu primeiro trabalho a solo.

Poderia continuar este texto, invocando as suas capacidades musicais, no entanto, vou-me restringir à sua passagem singular pelo Campo de Férias. Possivelmente única.

A presença do Manel naquele Campo de Férias foi decisiva para o sucesso de organizações futuras da AEJ. O interesse por ele demonstrado e sobretudo, a sensibilidade para a diversão nas férias, sempre com vontade de participar em todas as actividades propostas e sugerindo outras, foram extremamente importantes.

Existia até aquela data, a ideia de proporcionar férias essencialmente desportivas aos participantes. Aulas de natação, de modalidades colectivas e de outros desportos individuais eram as principais actividades. Além disto, havia outro factor preponderante para esta opção, as novas instalações desportivas da cidade: a piscina interior e o pavilhão das Corgas.

Tal como Saint-Exupéry alterou a sua vida pelos desenhos de uma criança, os bonecos de Manel Cruz cativaram toda a essência da AEJ. A partir daquele ano, reconheceu-se definitivamente que as actividades a propor às crianças e jovens, deviam envolve-los de acordo com a sua vontade, motivando o seu interesse e participação.

A imaginação ganhou lugar cativo nos anos seguintes. O principal interesse de quem organizava as actividades era proporcionar um mês de férias único aos participantes. Ali era tempo de esquecer as aulas, a rigidez dos horários, as matérias estudadas, enfim, eram férias, com outras atenções.

O sucesso e a longevidade do Campo de Férias passaram por esta forma de estar, que agradava aos participantes. Muitas vezes contrariando a vontade dos próprios pais, como muitos reconheciam.  

Durante vários anos, o mediatismo da AEJ no contexto da cidade era conseguido apenas no mês de Julho. Os bons resultados desportivos dos atletas eram ainda poucos e isolados. Das actividades com mais visibilidade, a Festa Final na Praça Luís Ribeiro era a sua principal montra. Assisti a representações ousadas de vários jovens, que eram o culminar de um mês de participação interessada. Destaco o sapateado de um jovem luso - francês, cujo nome não me recordo; a capacidade de mobilização de Paulo Cavaleiro; a disposição para o palco de Pedro Nuno Santos; entre vários outros, que não vou nomear para não tornar a lista longa.

Existirão actualmente outros jovens que se destacam, no contexto da actividade da AEJ e do próprio Campo de Férias. É a dinâmica normal de uma Associação de Jovens, que se vai calmamente renovando em termos de idade dos seus dirigentes, mantendo os princípios de organização e o seu propósito.  

Nunca consegui perguntar a Manuel Cruz, qual o caminho para o asteróide 612. Com certeza que desde criança que o conhece. Na sua adolescência soube explicar-nos os pormenores deste pequeno planeta. Eu e outros que durante anos, dedicámos o nosso mês de Julho à AEJ, mantivemos a nossa nave em órbita.

A minha, entretanto, aterrou.

 

(a publicar no dia 10/07/08)

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