quarta-feira, junho 12, 2013

A origem toponímica

         A toponímia, ao contrário do que se possa pensar, não se limita a dar nome às ruas e a colocar placas alusivas a esse nome, nos pontos mais estratégicos dos arruamentos.
            O estudo dos nomes de lugar, da sua origem e evolução, definem verdadeiramente a toponímia, que estuda também os nomes de cidades e outras localidades.
            Ao recolhermos informação sobre uma rua, muitas vezes, temos acesso ao nome anterior e conseguimos perceber a evolução associada, conseguindo datar a mudança e a nova designação. Temos como exemplo, a Rua da Liberdade, anteriormente designada de Marechal Carmona. Esta referência, associada à mudança de regime político em 1974, encontra semelhantes alterações um pouco por todo o país, em Avenidas, Praças, Pontes e outras obras públicas.
            A abertura de novos e modernos arruamentos, eliminando os existentes, provocou no passado o desaparecimento de alguns topónimos. Aqueles com mais relevância, serviram para batizar outras artérias, transferindo-se esse nome para outros locais das cidades, numa eterna homenagem. Não tenho de memória, exemplos lançados em S. João da Madeira, deste género, que possam ter provocado a eliminação, ou a transferência de nomes de ruas, para melhor exemplificar ao leitor, a evolução da cidade.
            Pelas ruas da cidade existem placas explicando os seus nomes: as homenagens da população a notáveis da terra, às profissões que marcaram a economia da cidade, a forasteiros ligados à política e às artes, além da referência à origem da povoação, nomeadamente invocando os seus lugares.
            Os lugares são a génese de qualquer localidade. Os lugares uniram-se por caminhos, estes deram origem a ruas, batizadas ao longo dos anos, conforme a vontade popular ou do poder político.
            Ao observarmos o nome dos lugares de S. João da Madeira, podemos perceber a sua história.
            Primeiro temos que perceber que vários desses nomes são comuns a várias localidades: Fontainhas, Devesa, Corgas, Espadanal, Vale, Fundões, Laranjeiras e Ribeiros. Estão associados à relação do homem com a natureza, neste caso, com cursos de água e aproveitamento agrícola (devesa significa campo fértil das margens de um rio).
            Os nomes Ponte e Travessas pressupõem a ação de travessia, neste caso do rio Ul, o que poderá indiciar o trajeto de antigas estradas, antes do traçado da estrada real.
            Lugares designados como Pedaço, Praça, Tapado, Volta e Vista Alegre são compreensíveis à luz do entendimento popular e das suas simples designações.
O mesmo já não acontece com Parrinho e Carquejido. Nomes sem paralelo no léxico português e de compreensão suposta, através da derivação de palavras associadas a produtos agrícolas, no entanto, como diria Agustina Bessa Luís, “não é qualquer filólogo que se atreve nos labirintos das origens fogosas do linguajar do povo”. Por isso...
Orreiro é definido no dicionário do Instituto Houaiss como “cavidade da trave do moinho de vento”. Assim sendo, ficamos com uma explicação para o nome do lugar e permite equacionar a tese de José Mattoso, sobre a designação tópica “da Madeira”, como localidade onde existiam oficinas de trabalhos em madeira: carpintarias e afins.
  Retrocedendo-se na história, chegamos à origem de outros dois lugares: Quintã – significa grande quinta, surgindo na documentação medieval. Anterior a essa época, ainda em período da reconquista cristã, é a utilização do termo casal – significando pequeno povoado, ou conjunto de casas, ou até mesmo limites de uma propriedade. Casaldelo e o seu oponente Casal Novo devem provir desta época.
Por fim, temos a Mourisca. É aceite pelos historiadores que o termo “mourisco” era utilizado pelos populares para designar tudo o que fosse antigo. Na década de 50 do século passado, procedeu-se a escavações arqueológicas neste lugar da cidade, não se tendo encontrado nada de significativo. O termo popular ficou. A utilização do morro pelos mouros, como ponto de vigilância dos movimentos, de norte para sul, das tropas cristãs é perfeitamente aceitável. O princípio de comunicação com a cidade a defender seria o de atalaias separadas vários quilómetros entre si, dispostas ao longo das principais vias / estradas e comunicando através do fumo, provocado por grandes fogueiras acesas nesses pontos elevados. Efetivamente, da Mourisca tem-se um campo de observação privilegiado sobre toda a envolvente.
Do período Visigótico, já escrevi em texto anterior, que existe um documento que refere S. João da Madeira e um nome de lugar – Ascarigo - de origem germânica, embora para mim, apenas interessado e não estudioso sobre o assunto, seja difícil fazer prova.
A via romana entre Coimbra e Porto teve que atravessar o rio ul, por isso à falta na cidade de vestígios do império, ficamos com uma noção histórica: quando estes chegaram à Península e encontraram os túmulos hemisféricos dos povos celtas, chamaram-lhes mamoas, por se assemelharam à forma de seio feminino.
A existência na cidade da Rua da Mamoínha, com todo o significado arqueológico e linguístico associado, prova que esta cidade foi habitada por povos celtas.
A toponímia permitiu essa revelação, perpetuada pela antiquíssima sepultura, demonstrando como é importante salvaguardar os termos e expressões populares, para se entender melhor a origem duma povoação.
 
(a publicar no dia 13/06/13)
 
 
 

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