quarta-feira, novembro 19, 2008

Nem vai, nem vem

A propósito do centenário da inauguração da linha do Vouga e consequente comemoração neste próximo fim de semana, voltou a ser referida a hipótese de adaptar-se sobre a mesma linha um transporte tipo vai e vem, servindo apenas a cidade de S. João da Madeira.

            Até hoje nunca li um argumento válido para a instalação de tal transporte. Nem percebi em que estudos se baseou a autarquia para verificar qual a sua viabilidade económica e o interesse público de tal obra. Tenho sérias dúvidas sobre a competitividade deste transporte: pela sua extensão (no máximo terá dois quilómetros, com três paragens – ou seja, cada paragem distará da seguinte menos de um quilómetro); pela rigidez dos carris, que não servem a totalidade da população nas suas deslocações internas (numa cidade em que existem transportes colectivos rodoviários a atravessá-la de norte a sul, de este para poente); e considerando que o preço a pagar por um bilhete, será obrigatoriamente barato, tornar viável tal investimento será difícil. Mesmo que esse valor seja reduzido, ou até comparticipado, suportar os futuros custos de exploração de tal transporte não será nada fácil.

            A implementação deste transporte foi uma promessa eleitoral. Não se conseguindo, até ao momento, apoio por parte da secretaria do Estado dos transportes, o executivo municipal avançou com as obras de modernização do Centro Coordenador de Transportes (CCT). Com a sua conclusão praticamente conseguida (mais pala, menos pala), a autarquia inverteu a lógica dos argumentos. Aplicando a técnica do facto consumado, quer-se fazer crer que, as melhorias efectuadas no CCT só estarão completas caso o transporte vai e vem seja uma realidade.

            Esta obsessão relembra-nos os tempos de promoção da Circular Externa, que durante anos agitou a política local e deu em nada, se não considerarmos o pontão do Orreiro, nem o aumento da dívida da autarquia.   

            A linha do Vouga tem merecido outro tipo de atenção ao longo dos últimos anos. O seu actual estado de conservação é péssimo – vários troços foram encerrados por falta de segurança –, são imensas as passagens de níveis “sem guarda”, várias estações e apeadeiros estão ao abandono. Deste estado decrépito só as automotoras se salvaram, ao serem substituídas por outras, mais modernas, transferidas da linha da Póvoa.

Por vários motivos, o número de passageiros transportados tem vindo a aumentar. Apesar da ausência de conservação e da relutância em modernizar a linha, os habitantes da região voltaram a utilizar o comboio, entre as várias paragens existentes no troço entre Espinho e Oliveira de Azeméis. Perceber esta atitude, verificar as causas para este regresso ao transporte ferroviário, ajudaria a projectar uma melhor solução para a linha do Vouga, optando-se por um remate que sirva os reais interesses da população.

            Nestas páginas, defendi por várias vezes a ligação da linha do Vouga ao Metro do Porto. Da primeira vez que o fiz - em 2005 – até hoje, houve vários factores conjunturais que se alteraram: o preço do petróleo, a crise económica e consequentemente a revisão de alguns investimentos importantes para esta região, como a não transferência da Exponor para Santa Maria da Feira, evitaram que surgissem elementos externos capazes de alavancarem um projecto desta natureza.

            A extensão do Metro para sul do Porto é uma reclamação dos autarcas desta região. Prevendo-se no médio prazo, o alargamento dessa rede até ao cimo da Avenida da República de Gaia, é natural que se pensem em várias soluções, para se conseguir satisfazer as necessidades das populações dos concelhos a sul e a vontade dos seus autarcas.

            A grande vantagem da linha do Vouga, para ampliação do metro para sul, é o aproveitamento do seu actual traçado, permitindo reduzir os custos de expropriação. Contudo, a ligação de Espinho para Norte será sempre onerosa e por isso, só provavelmente a muito longo prazo é que será uma realidade.

Não queria terminar sem referir e recordar a opinião de vários especialistas em transportes, que defendem ser a melhor solução ferroviária para o sul do Porto, a criação de linhas suburbanas, devido às distâncias envolvidas, entre outras considerações técnicas.

A pouca disponibilidade de dinheiro para investimento público exige reequacionar-se os vários projectos definidos. A própria líder do PSD pressionada a esclarecer quais os pequenos investimentos públicos que não considerava necessários, foi peremptória ao apontar a futura auto-estrada Porto – Coimbra, precisamente a A32, como um disparate.

Dada a oportunidade, porque não pensar-se numa linha ferroviária para o traçado previsto para a auto-estrada, aproveitando-o para a Alta Velocidade e possibilitando a circulação de outras composições de médio curso?

Em aniversário da linha do Vouga, voltar a falar-se em construir uma linha ferroviária, para servir uma vasta região, era o melhor presente para uma população que carinhosamente sempre tratou o seu comboio por “Vouguinha”.

 

(a publicar no dia 20/11/08)

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