quarta-feira, junho 30, 2010

Sombreros

            Um interruptor é substituído por um sensor de movimento, permitindo a respectiva poupança de energia eléctrica. Solicitei essa melhoria durante anos e apesar de saber da alteração, não consigo deixar de observar à distância se as lâmpadas estão acesas. Não se trata de desconfiança, apenas um prudente hábito de economia, de tal forma enraizado no meu inconsciente, não me permitindo deixar de proceder a essa verificação a cada passagem por esse local.

            Após nove meses de ano lectivo, os meus filhos ficam de férias. As rotinas diárias alteram-se. Novos horários, sem a menor preocupação com os seus afazeres escolares. No entanto, nestes primeiros dias das suas férias, ainda me preocupo com a hora de deitar, mesmo sabendo que no dia seguinte os horários a cumprir serão apenas para os progenitores.

            Dezoito dias a seguir o campeonato do mundo de futebol, a fazer contas como defini em crónica anterior, à espera das surpresas. Entusiasmo com o excesso de jogos, sempre em dias sucessivos e de repente… surgem os primeiros dias de descanso.

            Fica uma sensação de abstinência.

            Daqui para a frente, falta a selecção portuguesa mas, mais do que isso, faltam os jogos diários. Começam as paragens no calendário, os jogos rareiam.

            Os resultados diários dão lugar às discussões antigas: as imagens vídeo para avaliar lances duvidosos; a prestação do futebolista português mais mediático no colectivo nacional; o calendário pré-definido que colocará frente-a-frente algumas das melhores selecções do campeonato, ainda nos quartos de final.

            Os próximos jogos serão mais apetecíveis, restando a dúvida se será desta que uma selecção europeia vence um campeonato do mundo, em prova disputada fora do seu continente. As outras questões como saber se o Uruguai será campeão 60 anos depois? Ou a Argentina, 24 anos depois da mão de Maradona? Ou até a própria Alemanha, 20 anos depois do penalti de Brehme? Ou se pelo contrário, o Brasil conquista o hexa? Podem criar emoção mas, nada se compara com a ideia do próximo campeão mundial ser um novo conquistador.

              O futebol é jogado nas quatro linhas. As estórias associadas ao fenómeno, por vezes têm origem em locais estranhos, perdurando no tempo. Longe da África do Sul, num dos países injustamente afastados desta fase final, a Irlanda, surgiu a reacção mais divertida ao afastamento da França. Para quem não se lembra, a França conseguiu o apuramento frente à Irlanda com o golo procedido de mão. Após a derrota da selecção gaulesa frente ao México e ficando praticamente eliminada, os festejos nas ruas e bares de Dublin foram alargados para a televisão, com um dos apresentadores a aparecer com um sombrero.

            E é isto! Na próxima semana termina este Campeonato e outros assuntos merecerão atenção.

 

(a publicar no dia 01/07/10)

quarta-feira, junho 23, 2010

Redução

            Ao escrever sobre a actividade do concelho, em particular, as opções e os projectos do executivo autárquico, não consigo deixar de emitir opinião. A maioria das vezes desfavorável quando verifico que não existe suporte técnico que permita que as intenções dos políticos sejam financeiramente viáveis. Esta foi sempre a minha posição, sobre o transporte vai e vem projectado pela Câmara Municipal de S. João da Madeira para a linha do Vale do Vouga, entre dois apeadeiros localizados a norte a sul da cidade. Em Novembro de 2008, nas páginas do labor escrevia sobre isso mesmo: “Até hoje nunca li um argumento válido para a instalação de tal transporte. Nem percebi em que estudos se baseou a autarquia para verificar qual a sua viabilidade económica e o interesse público de tal obra. Tenho sérias dúvidas sobre a competitividade deste transporte: pela sua extensão (no máximo terá dois quilómetros, com três paragens – ou seja, cada paragem distará da seguinte menos de um quilómetro); pela rigidez dos carris, que não servem a totalidade da população nas suas deslocações internas (numa cidade em que existem transportes colectivos rodoviários a atravessá-la de norte a sul, de este para poente); e considerando que o preço a pagar por um bilhete, será obrigatoriamente barato, tornar viável tal investimento será difícil. Mesmo que esse valor seja reduzido, ou até comparticipado, suportar os futuros custos de exploração de tal transporte não será nada fácil. “

            É a perspectiva de melhoria do concelho que me atrai. A crítica construtiva, com sugestões sobre os mais variados assuntos, tendo em conta que a intervenção é meramente debitada enquanto cidadão. O balanço desta actividade nunca é efectuado. Os assuntos vão-se sucedendo e várias vezes o tempo prova que a razão não é propriedade de ninguém. O importante é conseguir argumentos fortes, obrigando a que as decisões oficiais sejam baseadas em estudos concretos e que a demagogia eleitoral seja superada a bem do concelho e da sua população.

             A falta de receitas da autarquia passou a preocupar o executivo municipal. A redução da despesa, a melhor e mais sensata opção, foi a decisão tomada e como medida simbólica meteu-se na gaveta uma promessa eleitoral de 2005, que aguardava financiamento comunitário.

            Aliás, a despesa do Estado - assunto na ordem do dia pelo país inteiro - e a sua redução têm alterado os propósitos dos partidos. Neste sentido, a redução do número dos concelhos passou para a agenda das prioridades. A reforma administrativa voltou a ser tema de discussão. A ideia é proceder a uma reforma idêntica à da Grécia que reduziu para um terço o número de autarquias do país.

            As mais variadas preocupações dos reformadores surgem pela imprensa: freguesias com menos de 500 eleitores e também concelhos com pouco mais de 2.000 eleitores são apontados como extinguíveis, ou passíveis de fusão. Nesta perspectiva, a hipótese de fusão de concelhos de grande dimensão populacional, como Porto com Matosinhos e Gaia e alguns da Grande Lisboa, não permite vida fácil a concelhos de freguesia única.

            O próximo censos populacional será em 2011. Se houver tempo, será com base nesse estudo que será efectuada a reforma administrativa. É extremamente importante dimensionar o número da população flutuante da cidade e daí demonstrar-se que os limites humanos do concelho de S. João da Madeira, há vários anos, não coincidem com limites físicos.

 

(a publicar no dia 24/06/10)

quarta-feira, junho 16, 2010

Cabo das Tormentas

            O mundial de futebol é composto por quatro fases de apreciação distinta.  

            A primeira, face ao calendário dos primeiros jogos, é a da indiferença e termina, no final da primeira jornada de todos os grupos. Alguns dos jogos não têm entusiasmo nenhum, são aborrecidos, estão em confronto selecções com pouca qualidade e por tudo isso, terminam com poucos golos, ou na pior das hipóteses sem golos, obrigando o assistente a questionar a sua perda de tempo.

            As contas para o apuramento ou o afastamento prematuro são a fase seguinte. Na segunda e terceira jornada de cada grupo, fazem-se previsões de resultados, assiste-se a desaires das mais variadas e impensáveis selecções. É a fase mais longa. É extremamente curiosa as facções de apoio às equipas de países desportivamente menos consagrados. Conscientemente ou não, trata-se de uma escolha “terceiro-mundista”, atendendo a que muitos desses países são economicamente mais desfavorecidos.

            O entusiasmo continua com a fase das surpresas. Não corresponde apenas ao apuramento de países descritos no ponto anterior. A isso, junte-se o resultado inesperado em jogos dos oitavos e dos quartos de final, ficando o campeonato ao rubro. É a melhor parte da prova.

            O que se segue, meia-final e final são a fase seguinte, a histórica. O registo para a posteridade do campeonato mundial, dos seus campeões e das selecções melhores classificadas. Erguer o troféu, proeza até hoje conseguida por um grupo restrito de países, é considerado um feito repetitivo e por isso, em cada edição do campeonato do mundo de futebol, os favoritos à vitória são sempre os mesmos. Esta fase é muitas vezes enfadonha, culminando com as marcações de grandes penalidades para decretar-se o vencedor.

            Nos campeonatos em que Portugal é apurado, tudo muda. A emoção sobrepõe-se a qualquer racionalidade e o interesse principal dos adeptos portugueses é a prestação da selecção nacional.

            Em quatro participações de Portugal - duas esporádicas, a primeira na década de 60, outra na década de 80 e as outras duas correspondentes às últimas edições deste campeonato – existem dados coincidentes curiosos. Os bons desempenhos em território europeu, em 1966 em Inglaterra e em 2006 na Alemanha, 3º e 4º lugar, respectivamente. Eliminações, ainda na fase de grupo, em 1986 e em 2002, no continente Americano e Asiático - em que Portugal venceu o primeiro jogo, perdendo os outros dois a seguir. Outra coincidência, nos bons resultados, a selecção de Portugal foi sempre orientada por um seleccionador de nacionalidade brasileira. Com um seleccionador português, os resultados foram o que sabemos.

            Este é o histórico da participação de Portugal no mundial de futebol. A deste ano por ser ímpar vai desempatar os bons dos maus desempenhos. Os antecedentes históricos da selecção não auguram nada de positivo: campeonato fora da Europa e seleccionador de nacionalidade portuguesa. O único ponto atenuante para contrariar a história foi o empate no jogo inaugural.

            Nos próximos dias veremos se Bartolomeu Dias, navegador português, que ultrapassou pela primeira vez os limites do Oceano Atlântico, entrando em águas do Oceano Índico, baptizando esse promontório como Cabo das Tormentas, profetizou por vários séculos o encontro do seu povo, com o extremo a sul do continente africano. Ou pelo contrário, se a orientação do Rei D. João II, dando-lhe o nome que permaneceu até à actualidade - Cabo da Boa Esperança, é que estava certa.       

 

(a publicar no dia 17/06/10)

terça-feira, junho 08, 2010

Contraste

            S. João da Madeira passou do “concelho mais cuidado” para “o melhor para se viver”, segundo o estudo divulgado pelo jornal semanário Sol, em parceria na elaboração com o Intec – Instituto de Tecnologia Comportamental. A evolução, da edição do ano passado para a do presente, baseia-se nas respostas obtidas junto dos munícipes e em dados estatísticos do INE.      

            A “satisfação com a vida” dos sanjoanenses contribuiu em muito para a classificação obtida, segundo a análise do semanário, publicada na passada sexta-feira, dia 4 de Junho.

            Ao longo da divulgação do estudo foi evidenciado um contraste entre os dados subjectivos, correspondente à apreciação dos habitantes locais e os objectivos, referentes aos dados estatísticos. A título exemplificativo:

a)                  no item Diversidade e Tolerância, S. João da Madeira foi apresentada como liderante no campo dos direitos individuais – aspecto subjectivo positivo - e por outro lado, o aspecto objectivo negativo: “pouca diversidade de população estrangeira que solicita estatuto de residente e fraca proporção de casamentos celebrados entre indivíduos de nacionalidade portuguesa e nacionalidade estrangeira”;

b)                  em Urbanismo e habitação – um dos destaques do estudo – existem no concelho “os melhores espaços verdes, a maior limpeza de ruas e cuidado com os espaços”, segundo a apreciação dos moradores e em contrapartida neste parâmetro S. João da Madeira não aparece classificado entre os melhores 10 concelhos, dos vinte analisados, motivado pelo parque habitacional devoluto;

c)                  no parâmetro Acessibilidades e Transportes, S. João da Madeira lidera devido ao cuidado com a sinalização das estradas. Em contrapartida, o fraco acesso à rede de auto-estradas nacionais e o péssimo estado da rede ferroviária não foram considerados.

            Na reportagem do Sol, efectuada nas ruas da cidade num sábado de manhã, evidenciou-se outra contradição entre o resultado do estudo e a percepção dos moradores, só que desta vez em sentido contrário: o desemprego é considerado elevado – quando a taxa de empregabilidade do concelho é das melhores, segundo o INE.

            O aspecto ambiental, um ponto fraco como mencionado na reportagem, não ficou esquecido. As lixeiras e as toneladas retiradas no Limpar Portugal pesaram mais do que as boas práticas promovidas pela autarquia e mesmo neste ponto, é importante realçar novamente a contradição, pois a percepção dos moradores como se leu no ponto b) é precisamente oposta.

            A estes pontos dúbios, de sensibilidade diversa, o estudo aponta alguns pontos fortes do concelho, onde não residem dúvidas, concretamente o parâmetro do Ensino e Formação, com a melhor taxa bruta de escolarização no ensino secundário e com melhores acessos às escolas, além do renovado parque escolar.

            Alguns parâmetros deixaram de ser preocupantes: a saúde – apesar da perda de valências do hospital, serviço de urgências incluído, teve como contrapartida a melhoria da oferta de serviços por parte do centro de saúde, veja-se o indicador número de utentes sem médico de família; o turismo – apesar de este parâmetro ter sido uma preocupação dos autarcas e não dos moradores, mais preocupados com a sua debandada da cidade no seu tempo livre, fim-de-semana e férias. 

            A Felicidade, por fim. A aceitação da sua vida, com o que é oferecido pelo meio envolvente é uma característica da população. A construção do Parque América e o assunto na ordem do dia, o “cheiro a casqueira” são exemplos de resignação. O grau de exigência é baixo. As pessoas contentam-se com o que recebem. Sentem-se satisfeitas com a vida e isso é que é importante.

 

(a publicar dia 10/06/10)

 

quarta-feira, junho 02, 2010

Silêncio

            A Câmara Municipal de S. João da Madeira, ao manifestar interesse em participar no período de consulta pública do processo de renovação ambiental da empresa Luís Leal, assume ser porta-voz de todos aqueles que têm “queixas do mau cheiro imputado aquela empresa”. Esta tomada de posição, junto da Agência Portuguesa de Ambiente, devido às dificuldades em recolher suporte técnico, poderá não ser suficiente para a resolução deste problema que afecta a qualidade de vida da população da cidade - não esquecendo os moradores da vizinha Arrifana e também de Cucujães, além de outras localidades como Fornos e Mosteirô. Não são apenas os mais 20.000 eleitores de S. João da Madeira que são directamente prejudicados, como se pode ver. Provavelmente é o dobro da população.

            Três concelhos vizinhos, que representam mais de 220.000 mil habitantes. Se fosse feito o protesto pelas respectivas autarquias, obter-se-ia uma maior legitimidade. Se tal acto fosse em conjunto, uma maior visibilidade junto da comunicação social e consequentemente na opinião pública, seria conseguido.

            Por agora, em concreto, só existe a intenção da autarquia local. Facto notável, em coerência com o discurso assumido no passado recente. A promoção da qualidade de vida no concelho não se compadece com atentados ambientais. O fedor do “casqueira” é, infelizmente, um mal-estar, com que os habitantes da cidade aprenderam a viver. Não pode ser eterno. Um péssimo “cartão-de-visita” da cidade.

            Com esta iniciativa, a Câmara Municipal além de assumir a defesa dos interesses da população, retira qualquer possibilidade de agenda política aos partidos da oposição. Nesta fase, qualquer silêncio é crucial e mal interpretado. Seria interessante não serem apenas as autarquias e associações ambientais a participarem na consulta pública. As concelhias partidárias deviam interessar-se, demonstrando estarem atentas aos problemas dos seus eleitores. O alheamento, ou qualquer outra forma de mutismo, acarretará desastres eleitorais nos próximos anos.

              

 

(a publicar no dia 03/06/10)