A semana passada não escrevi propositadamente sobre o centenário da República. Esperei para ver as celebrações e hastear da bandeira um pouco por todo o país. Por isso, escrevo apenas a posteriori umas singelas linhas.
Nada tenho contra o cinco de outubro, nem contra a República. Antes pelo contrário. Tenho que confessar que a república à portuguesa não é muito do meu agrado, por a considerar demasiada despesista, em matéria de órgãos de soberania. Assunto que não desenvolverei, abstendo-me de apresentar críticas em tempo de comemoração.
Atendendo à idade do regime, não compreendo a visão histórica de associar a implantação, com os anos da I República. Os argumentos apresentados – constantes mudança de governo, elevado défice público, desordem, só para citar alguns – são reais e foram apresentados durante décadas para justificar a mudança para o Estado Novo e branquear a ditadura militar.
Os portugueses tiveram alguma dificuldade em adaptar-se à monarquia liberal. A carta constitucional tardou a ser adaptada. Pelo meio, foram realizadas várias emendas e formados dezenas de governos, ainda durante o século XIX. No reinado de D. Carlos, verificamos que houve dez governos, um dos quais próximo da ditadura. Entre a data do regicídio e a implantação da república surgiram quatro governos, o derradeiro sinal de que a crise política, promovida pelo rotativismo dos partidos da época, era por demais evidente.
A cedência ao ultimato inglês de 1890 e nos anos sucessivos, os gastos excessivos da coroa, são unanimemente reconhecidos como os factores decisivos para o fortalecimento da causa republicana, com a consequente tomada de poder em 1910.
Para reforçar este ponto: o antes e depois da República diferenciam-se pelos ideais de alargamento das liberdades e a eliminação de privilégios.
A passividade do exército português no dia 5 de Outubro, com arsenal suficiente para derrotar as hostes republicanas, continua por explicar, segundo vários historiadores. Desta forma alterava-se a história de Portugal e abria-se uma nova era, a dos militares.
Sidónio Pais, perdão, major Sidónio Pais, um republicano destacado, exercendo cargos políticos desde a implantação, liderou uma insurreição protagonizada pela Junta Militar Revolucionária, em 1917. Assumiu o cargo de presidente da República até às eleições do ano seguinte, que viria a ganhar por sufrágio directo. No final desse ano, infelizmente, seria assassinado.
Em 1919, Paiva Couceiro, perdão capitão, tenta a sua terceira incursão monárquica, com um movimento de tropas, depois de goradas as tentativas de restauração de 1911 e 1912. Da última vez, consegue proclamar a Monarquia do Norte, do rio Minho à linha do Vouga, chegando a ser hasteada a bandeira azul e branca em alguns concelhos, durante vinte e cinco dias. Ao fim desse tempo e porque D. Manuel II jamais mostrou interesse em regressar ao país, acabou a aventura.
Dois factos embora um tenha terminado de forma trágica e pouco democrática, da história da I República, demonstrativos que a desordem não provinha apenas da sociedade civil.
Depois, seguiu-se a ditadura militar. Quase meio século. Pelo meio, várias tentativas militares de mudar o regime. Até à revolta dos capitães. A revolução na rua, dois anos conturbados de disparates militares, por fim, um general eleito democraticamente Presidente da República.
75 dos 100 anos de República são condicionados directa ou indirectamente pela acção militar. Felizmente, prevaleceu o bom senso.
Ironicamente, no último quarto de século, as fronteiras foram abolidas e a integração Europeia trouxe um óptimo desenvolvimento a Portugal.
(a publicar no dia 07/10/10)
Sem comentários:
Enviar um comentário