quarta-feira, dezembro 05, 2012

Parideiras

            Subir à serra da Freita é uma atividade por mim exercida regularmente.
Desde a infância, em passeio familiar, alcançando a serra por sinuosas estradas de terra batida. Na adolescência durante os períodos de férias escolares, alcançando a montanha a pé, ou à boleia, com a mochila nas costas. Mais tarde, já adulto, na fase pós urbana, percorrendo os trilhos da serra em viaturas motorizadas. Até me cansar e voltar a calçar as botas de montanha para caminhar.
A pé na adolescência percorri o triângulo formado pelas aldeias de Merujal, Albergaria e Mizarela. Várias vezes fui a Castanheira, voltando por carreiros de cabras, com a mochila carregada com pedras parideiras (pequenas amostras). Só mais tarde, já de automóvel cheguei a Cabreiros. Depois visitei as aldeias, o Rio Paiva, o monte de S. Macário. Quando dali vi ao longe os contrafortes da Estrela, percebi que de carro já não tinha piada e voltei às caminhadas, em jeito de atividade semanal. Abrindo mato, traçando trilhos, unindo aldeias e lugares.
A periodicidade atual é apenas trimestral. Em família, incutindo o gosto pela natureza e pela descoberta nos meus filhos. Aos poucos vou-lhes mostrando a serra, as suas paisagens, as suas pedras, os cursos de água, enfim, os seus pontos de interesse turístico. Neste despertar do interesse pela montanha, não ficam de fora os rebanhos, a vida nas aldeias e os achados arqueológicos.
Eu próprio, por vezes, sou surpreendido com novas descobertas. Vestígios no passado mal interpretados, ou por desconhecimento teórico, ou por falta de atenção. Caso dos restos dos troços da via romana, construída para ligar o Porto a Viseu, atravessando a serra da Freita e por mim percorridos vezes sem conta, sem me aperceber da disposição daquelas lajes, da largura da via e do seu significado. Em Manhouce, aldeia do concelho de S. Pedro do Sul, fez-se a preservação de um desses troços. Subindo em direção à Freita, são visíveis mais dois fragmentos, um deles, saindo de Gestoso para Albergaria das Cabras. À entrada desta aldeia, atrás do cemitério, a via romana foi destruída. Tendo-se alargado a via e colocado novas pedras, uns modernos paralelepípedos. Um arranjo de quarenta metros, para desembocar num trilho de montanha, apenas acessível a pessoas, animais e veículos não motorizados.
Este exemplo serve para demonstrar a série de atrocidades à preservação histórica e por arrasto ambiental, a que foi sujeita a Serra da Freita ao longo dos últimos anos. Conscientes desse perigo, tentando evitar um desastre ainda maior, as autoridades responsáveis vedaram com rede o complexo das pedras parideiras, conseguindo-se a sua proteção ao longo dos últimos vinte e cinco anos.
O interesse por este fenómeno geológico, mais a existência de fósseis de trilobites em Canelas, entre outros geossítios, levou à criação do Geopark de Arouca.
A evolução turística, com alicerces científicos e pedagógicos, associando-se a oferta do património histórico e religioso, bem como, os produtos gastronómicos da região, mais a possibilidade de praticar desportos de natureza, permitem enquadrar o concelho de Arouca como um moderno promotor de turismo.
À diversificação da oferta, junte-se uma outra questão, os horários alargados e adequados a todo o tipo de turistas.
Neste último domingo de manhã, no terraço da Castanheira, espreitava a queda de água da Mizarela e as diferenças litológicas do maciço envolvente. Na escombreira, aos meus pés, encontravam-se vários exemplares de pedras parideiras, restos de rochas removidas para fazer as habitações da aldeia. Apontei os binóculos para o litoral, distingui as cidades desta região, pelo seus prédios e à distância, percebi o quanto falta para fazer um produto turístico por aqui.
 
(a publicar no dia 06/12/12)
 

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