quarta-feira, novembro 13, 2013

A Estátua de Cosme Damião

                Eu voto em Lisboa.
                Não como eleitor, como é óbvio.
(Reconheço que gostaria de votar em António Costa. Aguardo a oportunidade, esperando que tal aconteça num futuro próximo).
Voto no orçamento participativo da capital.
Vou explicar porquê. Estou na rede de contactos de uma Organização Não Governamental (ONG). Recebo uma série de comunicados e em outubro do ano passado, fui convidado a votar no projeto dessa ONG, inserido na iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa, intitulado Lisboa Participa. Por curiosidade política, procedi à minha inscrição no site da Câmara e procedi ao meu voto. Fiquei incrédulo com a facilidade encontrada. 
Em janeiro deste ano, tive a oportunidade pública de confessar o meu ato, sem contrição, à vereadora da edilidade lisboeta, Graça Fonseca. A possibilidade de qualquer cidadão espalhado pelo país votar do orçamento participativo de Lisboa, foi assumido pela referida vereadora como um risco calculado, significando apenas 5% dos votos totais.
Na interpelação, alertei para o facto, de posteriormente ao orçamento de 2012, essa mesma ONG ter promovido uma petição para impor um estudo de impacto ambiental a um investimento imobiliário e ter recolhido 20.000 assinaturas, o que poderia significar que em próximas edições, o orçamento participativo poderia estar sujeito à capacidade de mobilização de cada projeto concorrente, podendo conseguir-se votos maciços e externos a Lisboa. Como tal jamais tinha acontecido, nas anteriores cinco edições, tal situação não foi encarada como um fator adulterante do processo.
Na edição de 2013 voltei a repetir a graça. Processo idêntico. Recebi o apelo da mesma ONG, acedi ao projeto proposto para este ano. A edição deste ano tinha uma novidade, o voto por SMS gratuito, procedi à votação calmamente.
A participação facilitada trazia maiores riscos, pois a origem de alguns votos não podia ser controlada. Fiquei curioso para saber os resultados. Estes foram divulgados a semana passada.
Houve vários vencedores, dois para valores acima de 150.000 euros e catorze para a categoria até ao mesmo valor.
Nenhum deles recebeu o meu voto.
Segundo a Câmara Municipal de Lisboa foram contabilizados 35.952 votos, a maior participação de sempre.
Entre os projetos vencedores, na categoria com menor orçamento, encontra-se a estátua de Cosme Damião. Para os mais distraídos, Cosme Damião é o fundador do Sport Lisboa e Benfica. Importa referir a oportunidade proporcionada por esta iniciativa da autarquia lisboeta e aproveitada pelos adeptos do referido clube, através de pouco mais do que 1.000 votos, o que motivou uma reação de protestos de clubes antagónicos.
Uma sovinice, poderia defender o adepto Ricardo Araújo Pereira, ou como em tempos escreveu António Lobo Antunes, continua-se com falta de sentido estético.
A deturpação do orçamento participativo surgiu por onde eu menos esperava. A participação de projetos associativos é um risco a calcular, podendo este exemplo servir de alerta, para quem quer lançar-se em atos semelhantes de envolvimento da população na gestão do município.
 
(a publicar no dia 14/11/2013)

Sem comentários: