quarta-feira, abril 01, 2015

Aqui há gato

                A edificação de quarteirões na zona central da cidade deixou marcas da evolução do urbanismo ao longo dos anos.

                Antes do planeamento urbano, das ferramentas apropriadas, os PDM, os plano de urbanismo e os planos de pormenor, os quarteirões centrais continham fábricas, moradias individuais, prédios de poucos andares e nalguns casos, alguns campos formavam uma das frentes.   

                Estes campos, outrora rasgados para dar lugar a ruas ou estradas, podiam conter hortas ou mesmo árvores de fruto, podendo no seu conjunto, apelidar-se de pequenos pomares. Muitas casas mantinham nas traseiras esses sinais dos tempos agrícolas da povoação. Embora houvesse terrenos em pousio, já à espera da evolução urbana, nesses quarteirões permaneciam os vestígios do passado pré-industrial da cidade.

                Posso enumerar alguns desses quarteirões e dos terrenos outrora agrícolas, hoje em pousio: na Rua Benjamim Araújo, nos dois lados da rua; atrás na Rua Sá Carneiro, temos mais um exemplar; o interior do quarteirão formado pela Praça Luís Ribeiro – Rua da Liberdade – Rua Júlio Dinis – Rua 11 de Outubro – Rua Padre Oliveira, hoje exposto pela demolição das moradias nesta última rua. A estes exemplos podia juntar-se até há 20 anos, a Rua João de Deus e mesmo a Rua do Dourado.

Quem percorrer as ruas centrais para o lado poente da cidade, sem dificuldade encontrará outros exemplos.

                Uma das características destes terrenos agrícolas era a existência de animais domésticos. Pombos, cães e gatos, perduraram mais no tempo. No caso destes últimos, pela sua capacidade de mobilidade, foram-se movendo de uns quarteirões para outros, ocupando as traseiras das moradias, ou de prédios de pequeno porte.

                Esta mobilidade, aliada à independência e à oportunidade de saltar das traseiras para a frente, permitia aos gatos circularam pelas ruas da cidade, a qualquer hora do dia.

                Hoje em dia, quando se entra na Praceta Júlio Dinis, é usual depararmo-nos com três gatos. Estendidos ao sol, indiferentes aos automóveis que por ali estacionam. Por vezes, um deles empoleira-se numa caixa elétrica, junto à entrada de um dos prédios. Pela observação diária, coincidente com a minha hora de almoço, apercebi-me que estão à espera da refeição, fornecida por mão humana e amiga. Antes ou depois do repasto, além da sorna, também é frequente vê-los em correrias, perseguindo-se uns aos outros, ou fintando as pernas dos transeuntes.  

                A Praceta Júlio Dinis, aterrada ao longo dos anos em cima de um terreno agrícola manteve uma ligação com o passado. A abertura para as traseiras de um prédio, sito na Rua do Visconde, permite visualizar os restos dessa época em que a construção não significava ocupação total da área de terreno. Ali ainda perduram árvores de fruto e uma nesga de terreno, que poderá ter sido cultivada no passado. São estes vestígios que enquadram os gatos.

                Os pequenos felinos, como animal de rua, atravessaram a modernidade da povoação. Por isso, merecem o reconhecimento como animal doméstico da cidade. 

                Posto isto, desejo boa Páscoa para todos.         

 

(a publicar no dia 02/04/15)