quarta-feira, abril 15, 2015

Paradoxos do desporto

                O Comité Olímpico Português (COP) decidiu abanar a estrutura do desporto nacional, ao apresentar aos partidos políticos com assento parlamentar e federações desportivas um retrato pouco animador.

                A estagnação do número de atletas federados e os escassos bons resultados obtidos em grandes competições são consequências de uma política desportiva mal delineada, segundo o COP. Com esbanjamento de dinheiro, na construção de excessivos centros de alto rendimento e com pouca articulação com o desporto escolar, conclui o documento.

                O mérito dos resultados recai completamente para atletas excepcionais e demonstra a pouca contextualização para a repetição dos mesmos, é subentendido no estudo.

                Convém recordar as medalhas portuguesas em Jogos Olímpicos nos últimos 40 anos: Canoagem – Londres 2012; Atletismo e Triatlo - Pequim 2008; Atletismo e ciclismo – Atenas 2004; Judo e Atletismo  – Sidney 2000; Atletismo e Vela – Atlanta 1996; Atletismo – Seul 1988; Atletismo – Los Angeles 1984; Atletismo e Tiro com armas de caça – Montreal – 1976. 

                Apesar do atletismo se prolongar premiado durante várias décadas, convém recordar as medalhas obtidas por disciplina: meio fundo e fundo em 1976, 1984, 1988, 1996 e 2000. Em 2004, Portugal ainda ganha uma medalha no meio fundo e curiosamente arrecada uma medalha nos 100 metros. Em 2008, a medalha foi conseguida numa prova de saltos, por definição mais técnica – o triplo salto.

                A dispersão por modalidade e uma evolução técnica dos desportos premiados em Olimpíada ficam demonstrados. A casualidade por atleta, ou o prémio pelo seu esforço e empenho poderiam ser objeto de análise, no entanto, nem este é o espaço certo, nem o propósito deste artigo.

                O outro indicador apresentado no estudo do COP é curioso: a estagnação do número de atletas federados. Existe a ideia, empírica, de os Portugueses estarem mais ativos, com mais horas dedicadas ao exercício físico e à vida saudável. Refletindo-se estas boas práticas com mais inscritos em provas populares de atletismo, entre outros eventos. Tal facto parece não corresponder a um aumento do número de atletas inscritos no desporto federado.

Existem mais atletas, mas não federados e ao mesmo tempo, surge outro paradoxo: existem atualmente mais atletas nas estradas (análogos aos corredores de meio-fundo e fundo) e os resultados desportivos internacionais nas disciplinas correspondentes são piores.

Nem tudo é mau. A melhoria no método de treino tem que ser reconhecida. E explica os bons resultados. Além da melhoria generalizada das condições de treino. Só que tudo isto não chega para a consistência de resultados internacionais.

O estudo do COP aponta para a má aplicação do investimento público, pela disseminação de centros de alto rendimento no país, 13 ao todo, quando em países com melhores índices económicos e sociais, apenas existem 5 a 6 desses pólos e esses países tem resultados desportivos mais consistentes. A viabilidade financeira destes centros, pela pouca ocupação, é hoje posta em causa.

O documento foca ainda a necessidade de articular o sistema escolar, com a identificação e captação de talentos desportivos e, não menos importante, pela criação de percursos escolares compatíveis com os estudos e a preparação desportiva, à semelhança do que existe nas artes, com o ensino articulado.

Como se prepara a Carta Desportiva do concelho, é importante que as conclusões do citado estudo estejam presentes, para evitar-se directrizes erradas (ainda há 8 anos se projetava a construção de um centro de alto rendimento em S. João da Madeira) e se tomem decisões mais consistentes com as necessidades reais do desporto local, baseado no ecletismo e no associativismo.

Nota final: Ana Rodrigues voltou aos resultados excepcionais e o regresso aos Jogos Olímpicos pode ter ficado assegurado. Para já, um mínimo B foi conseguido. Tal como há 4 anos, a história parece repetir-se.

 

(a publicar no dia 16/04/15)