quarta-feira, novembro 06, 2019

Taxas da água

A Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) divulgou, na semana passada, o Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses. Através deste estudo pode-se verificar uma série de indicadores financeiros de um total de 135 municípios. Os resultados operacionais, a capacidade de obtenção de receitas, as despesas e o endividamento de cada uma das Autarquias estudadas são escalpelizados. Neste item, as dívidas indicadas não se resumem apenas às do município, alargando o estudo ao endividamento das participações, ou seja, em empresas municipais.

S. João da Madeira foi um dos concelhos analisados. A dívida acumulada (município e empresas municipais) correspondia a 35% das receitas obtidas em 2018. Numa análise aos últimos anos, verifica-se que a partir de 2016 as receitas angariadas foram aumentando. A dívida que tinha descido bastante até esse ano, passou a ser tratada de outro modo, reduzindo-se de modo mais suave, ou seja, não acompanhou o aumento de receita. Em contrapartida, os resultados operacionais, tiverem um ligeiro acréscimo.

Uma situação financeira estável, conforme tem sido apresentado. No entanto, novos dados surgiram e tudo pode ser alterado.

Pedro Silva, diretor do jornal labor, na sua coluna editada na última edição alertou para a possível resolução de alguns processos judiciais, que poderão provocar uma penalização da Câmara Municipal de S. João da Madeira, tendo como consequência o pagamento de indemnizações, que caso não tenham provisões asseguradas, provocará o aumento da dívida municipal. 

Apesar de não quantificada, já não é a primeira vez que o assunto é comentado, em tempos o Presidente da autarquia, Jorge Sequeira, já tinha indicado a necessidade de haver precaução, melhorando a capacidade do gabinete jurídico, para responder de forma eficiente ao contencioso e aos imbróglios criados.

Enquanto não são conhecidos mais pormenores, existe uma interrogação que fica deste processo, deve a autarquia continuar com o nível de impostos e taxas sobre os seus munícipes ou pelo contrário, pode de alguma forma aliviar a coleta municipal?

Recordo que no mês passado, defendi nestas páginas, que era importante um sinal de mudança ideológico do executivo e que essa vontade deveria ser expressa através da fatura da água, pela redução de uma das taxas cobradas aos munícipes.

Nem de propósito. Na mesma semana em que o jornal labor publicou o meu artigo, o presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia anunciou uma redução das taxas associadas à fatura da água. A justificação de Eduardo Vítor Rodrigues, autarca eleito pelo PS, prende-se pelo esforço que os seus munícipes tiveram com a cobrança de impostos, para reduzir o passivo da autarquia, sendo agora necessário compensá-los, com esta redução. Segundo a OCC o município de Gaia reduziu nos últimos 10 anos 150 milhões de euros à sua dívida, permanecendo ainda assim, como o terceiro concelho mais endividado de Portugal. Para quem não está familiarizado com o município Gaiense, informo que a água nesse concelho é distribuída por uma empresa municipal, com o total do capital pertencente ao município.

Bom exemplo vindo de um concelho parceiro na Grande Área Metropolitana do Porto.

Por algum motivo, Eduardo Vítor Rodrigues é reconhecido no seu Partido como autarca modelo. Em tempos Manuel Castro Almeida recebeu o mesmo elogio dentro do PSD.

A afinidade partidária entre S. João da Madeira e Vila Nova de Gaia abre esperança para que o processo de cobranças de taxas (disponibilidade, resíduos sólidos) pela empresa Águas de S. João seja alterado, permitindo aos seus munícipes ficarem com a carteira um pouco mais aliviada.

                Para rematar este assunto, uma apropriada questão, atendendo à redução dominical na recolha de lixo, esta alteração não deveria ser refletida no imediato na taxa de resíduos sólidos urbanos cobrada?

 

 

(a publicar dia 07/11/19)

quarta-feira, outubro 30, 2019

Estatutos da AEJ - revisão 2020

A semana passada terminei o artigo, gentilmente publicado pelo jornal labor, informando que a Associação Estamos Juntos (AEJ) estava a preparar uma revisão aos seus Estatutos.

Ao longo da sua história, a AEJ procedeu uma vez à alteração dos estatutos, no ano 2000. Nesse ano a revisão, aos originais de 1986, surgiu como imperiosa. Isto porque até aquela data a AEJ tinha desenvolvido a sua atividade, liderada pelos seus sócios fundadores. A organização de Campo de Férias e as secções desportivas eram lideradas por fundadores, salvo raras e pontuais exceções. 

A revisão de 2000 permitiu a abertura do clube a sócios. A obrigação da realização de Assembleias Gerais Ordinárias, pelo menos, duas vezes por ano, tornou a gestão da AEJ mais clara e dotou-a de uma maior capacidade atrativa, que lhe possibilitou acompanhar os primeiros anos do novo milénio, de um modo mais eficiente, elevando o seu patamar de qualidade desportiva e organizacional.

Desde esse ano, houve várias tentativas de proceder à revisão dos estatutos da AEJ, mas houve sempre alguma lacuna que não permitiu a sua concretização.

Em 2018, ao assumir a Presidência da Mesa da Assembleia Geral, tracei dois objetivos para o mandato:  o primeiro, precisamente, proceder à revisão dos estatutos da AEJ e o segundo de atualização do ficheiro de sócios – o que virá a seu tempo.

Na proposta de revisão, que os sócios podem consultar na sede da AEJ, apresenta-se duas estruturas de ideias, por um lado manter a tradição da orgânica nos órgãos sociais e por outro, redefinir as competências de cada órgão.

Os órgãos sociais sofrem alteração de nomes. A antiga Comissão Coordenadora passará a designar-se por Direção, tendo por competências a gestão do clube, incluindo a formação e regulamentação das secções desportivas e outras atividades, assim manter atualizada a lista de património do clube; o Conselho Fiscal permanecerá intacto e surgirá a Mesa da Assembleia Geral, com algumas alterações. A principal diz respeito à sua Presidência, até hoje só poderia ser eleito um sócio fundador, no início de cada Assembleia Geral. No futuro qualquer sócio elegível poderá assumir um mandato de dois anos. A tradição do clube permanecerá com a continuidade do Conselho de Fundadores, formado pelos sócios fundadores, só que será um órgão auxiliar ou coadjuvante, que servirá para fazer vigilância à atividade do clube, dando pareceres sobre a mesma, ou podendo ser chamado a intervir caso seja chamado por algum órgão social.

Na sugestão de alteração ficarão definidos critérios de elegibilidade e de incompatibilidades para os órgãos sociais (destacando-se neste capitulo a impossibilidade de prestadores de serviços, incluindo treinadores, serem diretores do clube). Haverá limite no número de mandatos que os diretores poderão assumir.

Poderá ser sócio, quem for aceite pela Direção, mantendo o estatuto se cumprir os regulamentos e pagar as quotas. A perda da qualidade de sócio, poderá ser por autoexclusão, ou por decisão da Assembleia Geral.

Para os leitores que acompanham estes meus textos, em particular para os que nos últimos anos foram lendo os meus desabafos pela situação vivida na AEJ, encontrarão coerência nesta proposta de revisão dos estatutos, que procurará inverter os anos de menor fôlego deste clube.

É com esta mensagem de esperança que pretendo rematar este artigo. Se em 2000, a mudança estatutária foi uma das ferramentas fundamentais para catapultar a AEJ para os resultados desportivos conhecidos, espero que à entrada na segunda década deste século a próxima revisão consolide de vez o projeto associativo que é a Associação Estamos Juntos.

Se o leitor for sócio e pretender inteirar-se dos futuros estatutos da AEJ, encontrará a sua redação afixada na sua sede social, na Rua de Ribes, Complexo Desportivo Paulo Pinto. A proposta terá que ser aprovada em Assembleia Geral Extraordinária, até lá, a consulta é pública e permitirá aos sócios ficarem com a consciência de quais serão as alterações.

 

(a publicar dia 31/10/19)

terça-feira, outubro 22, 2019

AEJ - um ano depois

Por estes dias faz um ano que os atuais órgãos sociais da Associação Estamos Juntos foram eleitos.

Uns dias antes dessa eleição, o jornal labor fez uma reportagem sobre o estado em que se encontrava a AEJ, devido ao encerramento compulsivo e prematuro da sua secretaria e à dificuldade inerente em muitos sócios pagarem as suas quotas e outros inscreverem-se pela primeira vez. Nessa notícia fui citado. Às perguntas do jornalista Nuno Santos Ferreira respondi que enquadrava as atitudes do anterior presidente, como uma tentativa de encerrar o clube. Exemplificava com as cisões dois anos antes na secção de ténis –revertida com dificuldade - e no ano anterior, com o afastamento de Luís Ferreira como técnico de Natação, implicando a saída de uma série de nadadores, incluindo a multicampeã nacional, Ana Rodrigues. Culminando na finalizada pré-época, na qual um conflito com o técnico de Natação havia posto em causa o resto da secção.

Depois da tomada de posse ficou mais claro qual o propósito dos anteriores diretores do clube.

Previamente, antes do ato eleitoral, ao pedido do anterior presidente do Conselho Fiscal para elaboração de relatório de contas para encerramento do mandato, nunca foi enviada resposta.

À necessidade de transmitir informação de gestão e de património aos diretores eleitos, apenas foi entregue a chave da sede, sem qualquer comunicação. Neste ponto, atendendo ao meu passado como sócio, em que várias vezes frequentei a sede, nomeadamente para dar apoio à equipa de xadrez em jogos importantes, ao regressar à sala da secção no dia das eleições, constatei a falta de alguns tabuleiros, jogos de peças e relógios - com que se pratica a modalidade - e que durante anos, tão faustosamente eram exibidos na sede e nas reportagens fotográficas na imprensa local.

À intenção em encerrar a secção de Xadrez, promovendo a debandada de todos os jogadores, apesar de estarem no seu direito associativo, não se deu oportunidade aos novos diretores de fazerem a sua apresentação e explicassem o seu projeto para o clube, dialogando com jogadores ou com os seus pais (no caso de jogadores menores), para se encontrar uma solução de gestão para a secção. Quando a nova direção da AEJ agendou uma reunião com todos os interessados, um novo clube de xadrez já estava formado, curiosamente com os antigos diretores da AEJ.

A isto, acrescente-se o cenário ruinoso encontrado pela nova direção: contratos sem termo com três técnicos do clube, realizados uns dias antes das eleições, assinados pelos diretores que passado quinze dias se propuseram a fundar um novo clube na cidade. Só para exemplificar e para os leitores perceberem melhor qual a dimensão dos contratos, se não tivesse havido bom senso por parte dos técnicos, a AEJ teria ficado insolvente no inicio do presente ano.

Este foi em traços gerais o panorama encontrado. Para dar um rumo à AEJ e contrariar as surpresas descobertas, ou o campo minado, houve um enorme esforço da nova direção, liderada por Joaquim Fial, para dignificar o nome do clube e criar uma nova forma de gestão, baseada em pilares de rigor e transparência.

Um ano depois, a AEJ está diferente. Há alterações nas suas secções: desapareceu o Xadrez, iniciou-se o Triatlo; a Natação tem novos técnicos: Luís Monteiro e Mariana Marques; o ténis continua igual, porque as instalações municipais estão num impasse e por isso mesmo, em muito mau estado, não sendo atrativas para os praticantes e não se podendo desenvolver nenhum projeto desportivo ambicioso. Em contrapartida, houve obras na sede, permitindo torná-la mais airosa, com melhor capacidade para albergar as atividades como fitness ou outras semelhantes. Ainda antes do final do primeiro ano de mandato, após o balanço da atividade, houve tempo para convidar uma nova coordenadora para o futuro Campo de Férias, substituindo a anterior por Dulce Lima.

Soluções que demonstram a preocupação da nova direção e restantes órgãos sociais da AEJ em agradar à comunidade em que está inserida, tornando-se um parceiro credível no concelho. Reconhecimento já demonstrado pela Junta de Freguesia de S. João da Madeira, que no passado teve uma parceria com a anterior direção da AEJ, com o desfecho conhecido de má gestão do espaço público pelo clube, com o caso a transitar para o contencioso. Revolvido o conflito no mandato atual, a Junta de Freguesia tem novamente a AEJ como parceiro  verosímil.

Nestes próximos meses, as mudanças associativas vão continuar. Com base na experiência dos últimos sete anos, de má memória, há uma proposta de alteração de Estatutos, para ser analisada e aprovada, para entrar em vigor no próximo mandato. A sua redação estará patente na sede da AEJ para consulta pelos sócios interessados, até à Assembleia Geral Extraordinária a agendar para breve. 

 

(a publicar no dia 24/10/19)

terça-feira, outubro 15, 2019

Por uma questão de ideologia

As obras na Praça vão reiniciar-se, segundo o anúncio do executivo municipal, no primeiro trimestre de 2020.

Ao assumir o projeto sem trânsito na Praça, o Partido Socialista rompe com o anterior executivo e opta por uma situação mais conservadora, mantendo a ideia do final dos anos 80 do século passado.  A grande diferença relativamente à transformação operada inicialmente, será a altura da água. No passado descia pela “chaminé” e molhava tudo e todos, no futuro sairá do chão. As molhadelas para quem circula, ou por quem por ali permaneça, só serão descortinadas quando a obra estiver terminada.

A rotura com o anterior executivo deve ser salientada. Pela diferenciação pretendida.

Ao analisar-se os dois anos de mandato, cumpridos neste mês de outubro, constata-se uma continuidade de conceitos e iniciativas. Deve-se salientar uma melhoria geral na comunicação, com mais transparência. Realçando-se igualmente o cuidado na divulgação de eventos e um importante foco na visibilidade do trabalho dos técnicos municipais. Estas foram as principais alterações deste biénio, que importa destacar num balanço apropriado. Contudo, a tudo isto faltou a componente política. Uma marca de partido de esquerda é pouco visível nestes dois anos.

Mesmo na futura intervenção da Praça, não há nenhum assumo de ideologia. A história da localidade não é reposta, antes pelo contrário. Fizeram-se imensos remendos, nas últimas duas décadas, à zona pedonal e nem assim, esta se revitalizou. O regresso ao original formato, da meia lua (agora pedonal) e a outra metade com circulação automóvel, seria recuperar o património humano da antiga vila e ajudaria a reanimar o centro da cidade, em dias em que não haja festas, ou outras romarias.

A falha ideológica é mais visível na relação com privados. Em primeiro lugar no negócio da água. Mesmo não havendo vontade de reverter o acordo com o parceiro privado da empresa municipal, não é lógico apresentar os resultados do exercício (lucrativo) e nada fazer para dar folga aos sanjoanenses. A posição maioritária na sociedade, permite à Câmara Municipal rever as taxas que cobra através do serviço de distribuição de água e deste modo repor os rendimentos dos seus munícipes. Até porque além do lucro deste serviço, a Câmara Municipal terminou o exercício anual, com verbas a transitar para o ano seguinte, permitindo-lhe não recorrer a empréstimos bancários para o curto prazo. Atendendo a esta situação financeira favorável, a alteração no preçário das taxas seria um sinal claro, por parte do executivo municipal, de uma mudança política e de aproximação à sua base ideológica.

A segunda questão está relacionada com os bens municipais. A hipotética futura ocupação do Palacete do Conde Dias Garcia, ao abrigo do programa REVIVE - programa nacional de abertura do património ao investimento privado para o desenvolvimento de projetos turísticos -, seria uma boa solução se não houvesse outra hipótese para aquele edifício e área envolvente. Recordo algumas das promessas eleitorais das eleições de 2017, nomeadamente, da criação da Casa da Memória. Existe uma ligação afetiva dos sanjoanenses com o denominado Palacete dos Condes. Além de ali ter estado instalado, durante décadas, entre outras valências, o Registo Civil - que permitia a toda a população aceder ao Palacete para renovar o documento de identificação -, este espaço albergou as urnas nas primeiras eleições democráticas em S. João da Madeira. Colocar esta memória coletiva na mão de privados é a amputar a cidadania dos habitantes locais. O que fica em causa, no futuro do Palacete do Conde Dias Garcia, é o acesso garantido pela instalação de uma Casa da Memória, ou a sua restrição através de um negócio privado.  

Estes são os apontamentos registados do último ano. Caberá ao executivo fazer a sua reflexão ideológica e verificar se pretende ficar na história da autarquia de S. João da Madeira, como um partido de esquerda democrática, ou pelo contrário, como um partido hibrido, que deu continuidade aos 38 anos de liderança de direita.

 

(a publicar no dia 17/10/19)

 

quarta-feira, outubro 09, 2019

Temas antigos, para não serem esquecidos.

As eleições para a Assembleia da República permitiram a quatro candidatos, oriundos de S. João da Madeira, serem designados deputados. Enquanto não é apresentado o novo Governo, Pedro Nuno Santos, André Neves, Moisés Ferreira e João Almeida têm a certeza que podem ser parlamentares, durante a próxima sessão legislativa.

Há quinze dias, elaborei uma série de questões relacionados com a cidade para serem colocadas a futuros deputados, em texto editado a 26 de setembro neste jornal. Obviamente que não vou repetir as mesmas, apresentando apenas um resumo por matéria, para contextualizar os leitores menos assíduos do jornal labor.

Os temas eleitos estavam relacionados com Património (devoluto do Estado, potencial ocupação de outros espaços por algumas valências do Estado); Educação (no sentido de se verificar a subocupação das escolas Secundárias); Saúde (na perspetiva do Estado como arrendatário do Hospital da Santa Casa da Misericórdia); Infraestruturas (reconversão da linha do Vouga, ligando-a à Estação de S. Bento e viabilidade económica do concessionário da autoestrada A32); Habitação (aplicação do programa de arrendamento acessível a contratos antigos de rendas de baixo valor); Administração Interna (com a necessidade de os eleitores do concelho elegerem deputados pelo círculo eleitoral do Porto, região com a qual têm mais afinidade).

Há outros temas que devem merecer atenção, alguns dos quais muito antigos e outros ainda que mais recentes foram sendo afastados dos temas predominantes do quotidiano local. Um conformismo ou resignação que interessa contrariar.

Nada melhor do que o início da legislatura para recordar aos reeleitos e novos deputados, alguns desses temas antigos, para se conseguir deliberações que permitam melhorar a vida dos habitantes locais.

O primeiro lembrete é de âmbito ambiental. O cheiro a “Casqueira” não pode ficar esquecido. Depois de anos e anos de incómodo, o assunto deve merecer acompanhamento e claro, encontrar-se uma solução, que permita à empresa emissora continuar a sua laboração, mantendo os seus postos de trabalho. As possíveis coligações, para uma nova maioria parlamentar, podem agregar ambientalistas com o partido vencedor das eleições e permitir um entendimento que possibilite a resolução deste problema antigo.

Outra questão que ficou mal resolvida prende-se com o Tribunal de S. João da Madeira. O mapa judicial aprovado em 2014 retirou-lhe secções e apesar do Ministério da Justiça do último Governo (XXI constitucional) ter efetuado ajustamentos pelo país, este concelho continua com as (boas) instalações do seu tribunal subaproveitadas. Enquanto isso, na comarca distrital há tribunais em prédios ou armazéns alugados. Um desperdício de recursos e uma centralização no mapa judiciário, que contrariada, permitiria uma proximidade dos cidadãos à justiça.

A indexação da freguesia de Milheirós de Poiares ao concelho de S. João da Madeira poderá nos próximos quatro anos ser conseguida, fruto da posição favorável assumida anteriormente por dois dos partidos com assento parlamentar, PS e BE. Com o número de deputados já eleitos, 106 e 19 respetivamente, a maioria parlamentar está conseguida. Haja novo acordo e a vontade da população de Milheirós de Poiares, expressa no referendo realizado em 2012, pode finalmente ser concretizada.

Em questões de acessibilidades, o concelho ficou mais próximo de autoestradas. Terminada a empreitada na EN223, reduzindo o tempo de ligação ao nó da A1, em Santa Maria da Feira, será necessário encontrar uma solução reivindicando um acesso ao IC2 que sirva o norte do concelho. Em especial, agilizando a entrada ou saída da Zona Industrial das Travessas. Uma ambição antiga, amputada na construção deste itinerário e infelizmente não concretizada na empreitada dos acessos à A32. O retirar de veículos pesados da entrada central de S. João da Madeira e da própria Vila de Arrifana permitiria uma melhor acessibilidade ao lado nascente da cidade, facilitando a fluidez do trânsito nas artérias atualmente sobrecarregadas.

Um último parágrafo para abordar uma questão ligada à Educação e que já em tempos apresentei nas páginas do jornal labor. Atendendo ao esforço municipal de apetrechamento de espaços culturais, nos últimos 20 anos, seria conveniente a criação de massa crítica em torno dos equipamentos, não apenas na perspetiva do espectador mas, na ótica do produtor ou criador. Haverá várias formas de lá chegar. Uma solução será através da evolução do ensino articulado, procurando-se através do ensino integrado ou profissional dar continuidade a esses estudos na cidade, em áreas como teatro, artes de rua, dança e música, nas mais diversas áreas. Uma resolução do Ministério de Educação poderá ajudar, preenchendo com mais alunos, as escolas municipais, o que responderia à minha questão recuperada no terceiro parágrafo deste texto.

Muitos assuntos para a próxima legislatura. Haja vontade em as resolver.  

 

(a publicar no dia 10/10/19)

quarta-feira, setembro 25, 2019

Umas perguntas aos futuros deputados

No boletim de voto das eleições legislativas do próximo dia 6 de outubro, para o distrito de Aveiro, constarão vinte partidos / coligações ou movimentos políticos.

Face a esta oferta é difícil conhecer o programa eleitoral da totalidade das forças partidárias. Muito menos, ficar com a noção se é apresentada em concreto alguma medida específica para o distrito. Do mesmo modo, saber quem são elementos que constituem cada lista é uma tarefa penosa e de pouca utilidade. Consegue-se obter facilmente o nome dos cabeça de lista de cada um dos partidos candidatos, só que ainda assim, há vários nomes perfeitamente desconhecidos para a maioria dos eleitores do distrito.

Neste capítulo, o concelho de S. João da Madeira está bem representado nos partidos / coligações atualmente com assento parlamentar. Particular destaque para os cabeças de listas do PS, BE e CDS-PP, respetivamente Pedro Nuno Santos, Moisés Ferreira e João Almeida, que têm fortes ligações à cidade.

Uma relação próxima com os futuros deputados permite solicitar-se ações. O mais frequente é os eleitores pedirem: ajustamentos da carga fiscal (nomeadamente do IVA na conta da eletricidade para 6%); melhor saúde pública (redução do tempo de espera para consultas); melhor ensino, melhorias na habitação, entre outras questões mais genéricas, que procuram promover um bem-estar da população.

Sem especificar o visado, nem tendo como alvo qualquer um dos futuros deputados, existe uma série de assuntos divergentes relacionados com a cidade que gostaria de colocar. Obviamente que não espero resposta, faço apenas este exercício para exemplificar ao leitor para que serve a proximidade de um deputado, ou se quisermos para ensaiar o que seriam os círculos uninominais e como poderia o eleitor exigir uma resposta a determinadas questões, sabendo que mais cedo ou mais tarde teria oportunidade de as cobrar ao eleito deputado.

A minha primeira questão está relacionada precisamente como círculo eleitoral. Apesar da proximidade geográfica à cidade do Porto, da inserção de S. João da Madeira na Grande Área Metropolitana do Porto, os eleitores de S. João da Madeira continuam a ter que eleger deputados por Aveiro. A pergunta que fica para a posterioridade é saber se na próxima legislatura este anacronismo será retificado?    

A segunda questão diz respeito ao património do Estado existente na cidade. Sabendo-se que a descentralização de alguns Ministérios tem sido uma realidade nos últimos anos, com a consequente passagem de competências para a autarquia, o que gostaria de questionar é se nos próximos tempos, essa descentralização vai abranger as Escolas Secundárias? Preocupando-me a condição devoluta do edificado na antiga João da Silva Correia, além do número excessivo de estabelecimentos de ensino face à demografia atual.

Ainda nesta questão, atendendo à condição de arrendatário do Estado sobre o Hospital da Santa Casa da Misericórdia, uma incisiva questão, haverá um plano de conservação ou reconstrução para os próximos quatro anos de todas as estruturas, permitindo uma melhoria do serviço ao público e em simultâneo que o património desta instituição sanjoanense não se degrade por falta de cuidado do inquilino?

Neste ponto, numa perspetiva diferente, poderão as valências do Estado de atendimento ao público, nomeadamente o Centro de Emprego e a Segurança Social, serem transferidas, para permitirem a revitalização de espaços da cidade necessitados de aumentarem a sua atratividade, como, por exemplo, a Praça Luís Ribeiro?

Nas infraestruturas nacionais, duas questões: o que fazer para tornar a A32 uma autoestrada alternativa em preço à A29 e A1? E a segunda questão, já enquadrando a preocupação ambiental e a faculdade de movimentação no espaço da área metropolitana do Porto, através do passe social acessível, quando ficará ligada a linha do Vouga, em bitola apropriada, à estação de S. Bento?

Uma última questão, mais direcionado ao Programa de Arrendamento Acessível (PAA). Atendendo à proximidade da secretária de Estado da Habitação, Ana Pinho e do Ministro da tutela ser precisamente Pedro Nuno Santos, seria bom para a dinâmica do mercado das rendas, para garantir boas condições para inquilinos e senhorios que os contratos antigos ficassem enquadrados no programa atrás mencionado, para evitar processos de despejo, ou de outras situações melindrosas para ambas as partes. Neste sentido, não ficando apenas a pergunta para um determinado partido, apresento a questão genericamente, o que fazer para enquadrar legalmente contratos antigos e cumpridores parcialmente do PAA?

Mais haveria para perguntar, ficará para outra oportunidade.

 

(a publicar no dia 26/09/19)

quinta-feira, setembro 19, 2019

Rigor, competência e honestidade

             Discute-se por estes dias, se os portugueses receiam ou não as maiorias absolutas de um só partido no Parlamento.
O facto de, nos últimos quarenta e três anos, terem sido eleitos três governos nessas condições (dois do PSD e outro do PS) confere estatisticamente a perceção. Os acordos pós-eleitorais, com a criação de maiorias parlamentares de partidos com ideologia próximas, através das quais se formaram Governos, têm sido mais frequentes. Governos minoritários, ou seja, com apoio parlamentar expressamente de um único partido é também uma solução a que se recorreu algumas vezes, obrigando a negociações com outras forças políticas, ou com um deputado como aconteceu entre 1999 a 2001, com a aprovação de Orçamentos de Estado dos Governos PS pelo deputado Daniel Campelo.
A arte de negociar, tão carateristicamente portuguesa, só não prevaleceu no hemiciclo legislativo em 28% do período democrático. Ainda assim, o PSD repetiu uma maioria (à inicial de 1987-1991, seguiu-se a de 1991-1995) e o PS (de 2005 a 2009) não o conseguiu. Pelos resultados eleitorais, comprova-se que as maiorias absolutas só agradaram aos eleitores portugueses apenas uma vez, em 1991.
Neste ponto, havendo sondagens que perspetivam uma possível maioria para o PS como resultado das eleições do próximo dia 6 de outubro, a questão pode-se colocar de outra forma, o que leva este partido antes da campanha eleitoral a recusar esta responsabilidade? Ou equacionando a dúvida na ótica dos eleitores, os portugueses poderão confiar nas maiorias absolutas do PS?
A primeira pergunta tem resposta imediata, António Costa é um politico com gosto pela negociação. Uma carreira comprovada por essa capacidade, não lhe permitirá encarar um futuro de maioria absoluta. O risco de tédio parlamentar, pretende-se evitar. Contudo, poderá não ser assim. Adio o resto do raciocínio para o último parágrafo deste texto.
A segunda questão não tem uma resposta tão linear.
Ao verificarmos as transições dos anteriores Governos PS: o primeiro período correspondente ao liderado por António Guterres de 1995-2001 com eleições em 1999 e o período de 2005 a 2011, liderados por José Sócrates, com eleições em 2009 verifica-se uma reação diferente do eleitorado. Em 1999, o PS saiu beneficiado das urnas, passou de 112 deputados para 115. Já em 2009, verificou-se o contrário, dos 121 de 2005, o PS reduziu o seu grupo parlamentar para 97 deputados, ficando em minoria e completamente isolado no parlamento, sem qualquer hipótese de coligação.
Resultados diferentes que poderão ser analisados pelo princípio da causalidade. Em 1999, o contributo como Ministro tanto de Sousa Franco, como de Marçal Grilo, António Vitorino e Elisa Ferreira terão ajudado a manter o eleitorado e até a reforçar o grupo parlamentar. A máxima “no job for the boys”, anunciada nessa legislatura, embora pouco verificada na prática, ficou como chavão para a posteridade e finalmente, havia poucos escândalos associados a corrupção. Em 2009, em plena crise, com uma sucessão de pactos de estabilidade, tudo foi diferente. As finanças públicas estavam prestes a colapsar, as nomeações para cargos públicos pouco respeitavam a competência, dando-se preferência a dirigentes partidários, alguns envolvidos em processos complicados em anos anteriores, como por exemplo Armando Vara, que tinha sido forçado a sair do Governo em 2001, por sugestão do Presidente da República Jorge Sampaio.
Em 2019, para seduzir o seu eleitorado, o PS precisa de garantir que continuará com a mesma política de rigor nas contas públicas. A continuidade de Mário Centeno terá que ser certa e obviamente que Portugal precisará de manter défice orçamental nulo, ou de preferência, com saldo positivo e com alguma capacidade de investimento público. Neste capítulo terá que ser garantido que apenas gestores competentes assumirão o controlo de cargos de nomeação, à semelhança de Paulo Macedo na Caixa Geral de Depósitos. Por fim, a honestidade dos seus militantes. O eleitorado que vota frequentemente no PS está cansado dos esquemas de favorecimento de familiares em negócios com o Estado, ou de outros casos de corrupção de menor ou maior gravidade. O princípio colocado em prática por António Vitorino (autodemitir-se quando recaiu sobre ele uma suspeita) deve ser orientador para os membros de um futuro Governo.
A campanha eleitoral vai arrancar no próximo dia 22, os candidatos têm muitas oportunidades para esclarecer estas e outras dúvidas do seu eleitorado.
Para terminar de responder à questão que ficou em aberto, sobre a hipótese de tédio parlamentar, é importante verificar as listas propostas nos vários círculos eleitorais pelo PS. Existem várias fações políticas dentro do partido, o que permite antever muita negociação no grupo parlamentar, entre a área mais à esquerda do partido e os seus membros mais moderados. Não faltará animação, mesmo havendo maioria absoluta.         
 
(publicado a 19/09/19)
 

quarta-feira, junho 19, 2019

Os sete ofícios

Com entusiasmo li o livro “Carlos Alberto da Costa – Um Olhar de São João da Madeira”, da autoria de Daniel Neto e José Duarte da Costa. 
A obra é um retrato do evoluir da localidade ao longo do século XX, aproveitando a perspetiva do trabalho fotográfico de Carlos Alberto Costa, o biografado. 
Sem complexos os autores retratam muito bem, a importância do lugar das Vendas no dia-a-dia da outrora aldeia de São João da Madeira. De tal forma, que a leitura do capítulo indicia que a perda da designação do nome do lugar em detrimento da Praça, surge não com o batismo toponímico atual, mas pela instalação naquele espaço do carro para aluguer de Francisco Luís da Costa, pai do homenageado. Aliás, aparece na página 30 do referido livro, um recorte de imprensa com a publicidade aos seus ofícios e num está um claro “Automóveis de Aluguer – Francisco Luiz Costa”, completando na linha de baixo “Praça – S. João da Madeira”. Um automóvel de aluguer era um carro de praça. Ainda hoje, em épocas de Uber e outras companhias, persiste esta designação provinciana para referir os táxis. A associação entre o carro de Francisco Luís e a Praça era tão grande que nas suas memórias, João da Silva Correia refere “o nosso Chico da Praça”, recordando a compra por este de um novo automóvel, numa passagem transcrita neste livro. Para completar este raciocínio, recorde-se que Luís Ribeiro faleceu em 1913 e que a atribuição do seu nome à Praça não deve ter sido imediata, por isso, a terminologia popular imperou, substituindo as Vendas pela nova função do automóvel de aluguer e vingou com a toponímia, impondo-se a verbalização de apenas a curta designação, sem referência ao benemérito sanjoanense.
A perspetiva de evolução da povoação é narrada no livro de um modo peculiar. Há as referências aos empreendimentos que envolveram a população e que imprimiram grande dinâmica urbanística a S. João da Madeira, incluindo a sua faceta industrial e empresarial, suportada pelas fotografias de Carlos Alberto Costa, mas há um cuidado em focar os momentos de lazer da população. Neste capítulo a referência às casas de espetáculo são obrigatórias: o teatro da Vista Alegre e anos depois as salas de teatro do Chico Folheteiro, o Cinema Central, culminando no Teatro Avenida. No livro de José António de Araújo Pais Vieira, “Manoel Vieira Araújo – a sua vida, a sua obra, a sua terra” havia referência às exibições de peças de teatro, encenadas e interpretadas pelos habitantes locais. O livro de Daniel Neto e José Duarte da Costa dá um enquadramento físico a essas apresentações, sendo um importante contributo para se perceber a história cultural da povoação. Mas, os autores não se ficam pelas primeiras décadas do século passado. Ao longo da cronologia que escreveram vão fazendo referências aos vários grupos amadores que foram surgindo no teatro, indicando as suas exibições e intenções de angariação de fundos.
Outro destaque do livro é a referência às eleições presidenciais de 1949. Não a perspetiva habitual de mencionar os apoiantes de Norton de Matos, ou a publicação dos documentos fotográficos dos comícios realizados no Teatro Avenida, cuja exploração estava a cargo de Carlos Alberto Costa. A curiosidade da referência é ter sido uma mulher a liderar a sessão. Conceição Silva Duarte teve coragem e determinação para assumir tão importante papel na reunião progressista. A referência de um dos autores do livro à sua avó materna, é completada por igual referência à sua avó paterna, Olívia da Costa Amorim e mesmo a sua mãe, Zulmira Duarte. Estas homenagens não se limitam à perspetiva da simples vida doméstica, antes pelo contrário, há a demonstração da participação ativa na vida empresarial, na sociedade local e com o exemplo atrás referido, um grande envolvimento de cidadania, com manifestações de preocupação de cariz social, nunca descorando a devoção cristã.
Estão de parabéns os autores por conseguirem imprimir tão importante documento para a interpretação da história de S. João da Madeira. Eu esperava encontrar os dados biográficos de Carlos Alberto Costa, os seus sete ofícios, as suas fotografias - tão importantes retratos da evolução da povoação (sem elas não havia boa memória), a menção aos seus filmes, com a exibição de alguns diapositivos e claro, a expressão da sua sensibilidade artística, pelas fotografias da ria a preto e branco e também pela construção dos seus trabalhos em pedaços de madeira. É certo que encontrei tudo o que esperava, mas as expectativas superaram-se quando vi outros aspetos em relevo, os quais atrás mencionei. 
No livro, há uma recolha de vários e importantes depoimentos acerca da vida e da obra de Carlos Alberto Costa. Há uma questão implícita que propositadamente fica por abordar, será que já se fez tudo para homenagear o fotografo de S. João da Madeira? Será o livro do seu filho em coautoria com Daniel Neto o último capítulo?
Em novembro de 2017, no rescaldo das promessas da campanha eleitoral para a autarquia, nas páginas deste jornal lancei o assunto de forma indireta. Ao compromisso do eleito presidente da Câmara Municipal de S. João da Madeira, em desenvolver a “Casa da Memória”, relembrei o espólio de Carlos Costa, os seus filmes, suas fotografias, acrescentando agora, os seus trabalhos em raízes secas, além de acervos de outros privados que se encontram dispersos pela cidade. Este livro pode ser a “primeira pedra” para apetrechar a “Casa da Memória”, porque o património humano da população deveria ter um espaço próprio e condigno, para preservar a memória coletiva.
 
(publicado a 19/06/19)

quinta-feira, junho 06, 2019

A última aula.

Armando Margalho chegou a S. João da Madeira para jogar basquetebol na Associação Desportiva Sanjoanense. Quase em simultâneo, ficou indexado pela antiga Direção Geral dos Desportos, como técnico de Natação, no Tanque Piscina construído nas traseiras da Escola Primária do Parque. Durante a década de 70 e princípio da seguinte, várias crianças, jovens e alguns adultos tiverem Margalho como professor, monitor, ou técnico de natação. A longevidade neste ensino permitiu-lhe ensinar a nadar a pelo menos duas gerações de sanjoanenses. Aproximando-se nalguns casos, a três gerações.
Amante da atividade física, do desporto, Margalho - como o próprio gostava de ser conhecido e tratado, sem o titulo de professor, procurando o relacionamento próximo – procurou envolver-se na comunidade local. Apesar de atleta da ADS, foi um grande impulsionador do associativismo, estando no grupo dos dinamizadores d’os Kagados, quando a atividade desta coletividade era em torno do Parque da Nossa Senhora dos Milagres. Nos anos 80, foi um dos fundadores da Associação Estamos Juntos e seu primeiro presidente. No final do século, foi um dos grandes incentivadores para ser criada a Associação É Bom Viver.
 Ainda neste capítulo, recordar a alegria que emanava nas suas de aulas de adaptação ao meio aquático, junto das crianças do infantário e a criatividade ao idealizar os exercícios, em que à falta de equipamento adequado, surgiam soluções incríveis, para as crianças fazerem os mergulhos e habituarem-se a ter a cabeça debaixo de água. Assim também era nas aulas de “ginástica“ no infantário (IOS), onde era incentivada a flexibilidade e agilidade de movimentos. Abro umas linhas, para recordar umas aulas no antigo Jardim do Sol, numa cave e com uns colchões, onde se aprendia a dar umas cambalhotas e outras piruetas e às vezes, o Margalho levava-nos em grupo a passear pela Vila. Fui assim que conheci os caminhos do açude até ao Parrinho, o monte das Travessas, um belo pinhal no Espadanal, os moinhos dos Fundões e os da encosta de Casaldelo, quem desce para o Roupal. 
No desporto, tudo mudava. Margalho era um técnico exigente fisicamente. A doçura que transmitia às crianças, transformava-se em dureza. A responsabilidade era diferente. Assim treinou os jovens basquetebolistas da ADS e também os nadadores do mesmo clube, ainda no Tanque Piscina. Anos mais tarde, quando abriu a piscina municipal das corgas, liderou uma equipa da AEJ. Nessa época, 1988, atendendo à melhoria das condições de treino, preconizou que S. João da Madeira haveria de ter um atleta Olímpico. 24 anos depois, Ana Rodrigues conseguiria esse feito. Apesar de se ter afastado dos treinos de Natação, Margalho manteve-se como treinador de basquetebol e enveredou pelo hóquei em patins, durante umas épocas. É no basquetebol, antes da viragem do século que recupera a mística da ADS, organizando um torneio de homenagem ao malogrado Cassiano Inácio e aproximando antigos jogadores ao clube, condição em que tem funcionado a direção da modalidade, desde essa época.
Margalho é claramente recordado como atleta de basquetebol. Na ADS foi capitão de uma equipa que em 3 épocas subiu da 3ª à 1ª Divisão. Ainda foi jogador da AEJ e voltou a jogar como Master na ADS, já nesta década.
Pelo exposto, há várias formas de perceber a importância que Armando Margalho teve no Desporto e na atividade física em S. João da Madeira. 
Há ainda duas vertentes que importa referir para perceber a sua total participação na comunidade. A ocupação de tempos livres no período de férias escolares, sendo um dos  primeiros dinamizadores do Campo de Férias Estamos Juntos, atividade pioneira na região surgida em 1982. A outra menos conhecida, é a de divulgação cultural. Além de um programa de rádio, Margalho foi um dos organizadores do festival de artes Adeus ao Verão, realizado em 1989, na Praça Luís Ribeiro, onde se exibiram durante um dia vários artistas da cidade, das mais variadas expressões musicais, além de dança, teatro e pintura.
Na passada sexta-feira, dia 31 de Maio, pelas 17 horas, realizou-se a última aula de Natação de Armando Margalho. Milhares de pessoas foram seus alunos. Mais de 40 anos a trabalhar no desporto local, não deixam ninguém indiferente. 
Felizmente, escrevo esta homenagem sabendo que Margalho irá continuar ligado à comunidade. 
Haverá, no futuro, outros assuntos para serem descritos.
Se não for pela sua dinâmica desportiva, será certamente pelo acompanhamento familiar aos seus três filhos, ou então, aos netos e netas.
 
(publicado  a 06/06/19)

quarta-feira, fevereiro 20, 2019

O Ministro

A notícia já era esperada mas, é sempre agradável ver um conterrâneo a tomar posse como Ministro. Pedro Nuno Santos é um dos muitos da diáspora sanjoanense, que encontrou, fora da sua terra natal, a oportunidade para exercer a sua atividade profissional. No seu caso a opção foi a carreira política.

                Na década passada, o agora ministro das Infraestruturas e da Habitação, ainda alternou entre S. João da Madeira e a capital, tendo exercido funções como Presidente da Assembleia de Freguesia local, seguindo-se a liderança nacional na Juventude Socialista, culminando com a sua candidatura a presidente da Câmara Municipal em 2009. Apesar de ter exercido o mandato de vereador, a partir de 2011, Pedro Nuno Santos optou pela política nacional, tendo sido esta escolha bem certeira. O seu percurso nos últimos cinco anos assim o demonstra: em 2014 apoiou a candidatura de António Costa à liderança do Partido Socialista; em 2015 toma posse como secretário de Estado do XXI Governo Constitucional, assumindo a pasta dos Assuntos Parlamentares; a sua capacidade de negociação com os partidos da coligação parlamentar fazem emergir o seu nome nos primeiros anos do Governo minoritário; em 2018 apresenta uma moção sectorial no congresso do PS, tendo defendido um posicionamento partidário mais à esquerda; em 2019, a oito meses das eleições legislativas, Pedro Nuno Santos chega a Ministro.

A expectativa em torno do futuro da sua governação é enorme.

O anterior ministro das Infraestruturas, Pedro Marques, apresentou um plano de obras ambicioso, sobretudo na ferrovia, embora alguma da sua execução, prevista para terminar ainda este ano, esteja muito atrasada. Se Pedro Nuno Santos seguir a cartilha deixada pelo seu antecessor, poderá, nos próximos meses e em futuro Governo, se for convidado para continuar na mesma pasta governamental, exercer um mandato tranquilo, já que existe um plano a médio prazo de várias e necessárias empreitadas até ao ano 2030. A acumulação da Habitação no mesmo ministério, área onde a igualmente conterrânea Ana Pinho tem vindo a promover alterações ao sector, tem também uma política a ser definida e traçada, podendo ser o complemento para exercer funções de Ministro de modo calmo e ambicioso.

Este Governo tem o mérito de lançar vários jovens como Secretários de Estado e Ministros, permitindo ao PS ficar com vários quadros com experiência governativa e com visibilidade na opinião pública, o que poderá ser importante para futuros confrontos políticos.

A entrada de políticos com pensamento ideológico bem vincado em determinadas áreas de governação, não tem propriamente significado continuidade com a política do anterior responsável. Há exemplos, não sendo importante personalizar, embora a título justificativo se possa analisar o mérito na capacidade de estudar e ponderar a política energética do novo Secretário de Estado com essa pasta, João Galamba.

                Atendendo ao perfil de Pedro Nuno Santos, ao seu passado partidário, à sua experiência governativa e parlamentar, não esquecendo a sua ambição política, não me parece que a cartilha de Pedro Marques vá ser seguida. O novo ministro deverá aproveitar esta oportunidade para ganhar um novo estatuto político, por isso, terá que ser capaz de criar uma política de investimento público mais dinâmica, precisando para isso de grande capacidade de reivindicação junto do Ministro das Finanças, sabendo que neste e nos próximos anos, a ideia será manter o défice perto de zero e de preferência diminuir a dívida pública de Portugal.

                Será neste exigente contexto, de rigor orçamental, com vontade de investir com poucos recursos financeiros, que Pedro Nuno Santos irá afirmar-se politicamente. Se for bem-sucedido, daqui a alguns anos, outros desafios políticos lhe serão lançados.  

               

 

quarta-feira, fevereiro 13, 2019

Desarticulação rodoviária

 

Na edição do dia 24 de janeiro do presente ano do jornal labor, ficou explicado o atraso para a finalização das obras da EN223. Apesar do prazo para a execução ainda não ter expirado, a suspensão da empreitada por várias semanas causou estranheza a quem percorre aquela estrada regularmente. Se as cativações governamentais foram a justificação para adiarem o início do melhoramento na EN223, já o impasse atual não sofreu de tal desígnio orçamental. Pura e simplesmente, o tempo frio e chuvoso foi o responsável pela paragem das obras.

Para quem viveu em S. João da Madeira nos anos 90, em que desde a idealização, até à construção de rotundas, tudo era executado a grande velocidade, verificar duas décadas depois que para instalar três rotundas em seis quilómetros numa estrada nacional serão necessários 400 dias, torna-se inconcebível.

Todo este processo, de uma ligação rápida de S. João da Madeira ao Nó da Autoestrada situado em Santa Maria da Feira, que sensivelmente há um quarto de século entrou nas promessas eleitorais, merece um pequeno comentário.

O que está projetado, evitar constrangimentos no fluxo de trânsito na EN223, era o que o comum do cidadão pensaria ser a solução desde que foi instalado um semáforo em Sanfins. As longas filas em ambos os sentidos, devendo-se acrescentar os engarrafamentos do entroncamento desta estrada com Arrifana e mesmo as restrições para atravessar esta vila, eram dificuldades para quem tinha que movimentar-se entre S. João da Madeira e o Nó atrás referido e o pretendia fazer de uma foram rápida.

A sucessão de melhoramentos nas infraestruturas rodoviárias reduziu o tempo de viagem, até aos dias de hoje. Só que este período, com a construção de duas rotundas, uma na vila de Arrifana e outro no entroncamento atrás citado, teve um incremento paralelo: a construção da autoestrada A32. Um investimento de 380 milhões de euros que devido ao preço praticado nas portagens não teve adesão necessária, não se tornando alternativa para desviar o maior fluxo de trânsito da A1, nem da A29.

Nesta última autoestrada (uma antiga scut), uma viagem de S. João da Madeira para o Porto tem um custo de portagem de 0,50 euros, para um veículo de classe 1, sendo possível fugir ao pórtico e nada pagar. Perante isto, não é de admirar que a empresa concessionária da A32 esteja em dificuldades, conforme a imprensa nacional noticiou na semana passada. Para explicar melhor, atente-se no preço das suas portagens: para o mesmo trajeto e o mesmo tipo de veículo custa 2,05 euros. Para o leitor menos familiarizado com os preços das portagens é importante referir que a taxa na A1, entre Santa Maria da Feira e o Porto, é de 1,5 euros. Três opções em viagem de autoestrada, com diferenças acentuadas de preço, somando-se uma quarta escolha, viajar pelo IC2 sem portagens. Percebe-se e considera-se natural que a via mais cara tenha menos movimento.

Chegamos ao ponto fulcral, o país gastou os milhões atrás referidos a construir uma autoestrada com pouco movimento, que não serve a maioria da população desta região, nem o trânsito de longo curso. Passado uma década e por pouco mais de dois milhões irá ser resolvido o problema de engarrafamento diário da EN223, com uma solução simples, há muito tempo idealizada, permitindo o acesso a duas autoestradas com preços mais reduzidos.

Imagine o leitor o hipotético cenário, para aumentar a competitividade da A32, os seus acionistas decidem promover um preço de portagem concorrente à A1, fixando a taxa por quilómetro em valor mais baixo. Suponhamos que praticam um preço em que o percurso entre o Nó de Milheirós / Pigeiros e o Olival (Gaia) fica por 1,5 euros, ou seja, com valor idêntico à A1 (na prática basta suprimir a portagem mais a norte da A32, que tem uma taxa de 0,55 euros). Muito provavelmente, num cenário destes, a A32 tornar-se-ia mais apelativa e o trânsito na EN223 entre S. João da Madeira e Santa Maria da Feira diminuiria.

Neste panorama, percebe-se que a falta de articulação entre o projetar de estruturas rodoviárias tornou-se dispendiosa para Erário Público e que as soluções que foram sendo construídas, muitas vezes não resolveram os problemas dos cidadãos. Referi estradas mas, haverá outros exemplos de investimentos desnecessários que obrigaram o país a endividar-se.

 

quarta-feira, janeiro 16, 2019

Porque voltei

                No ano de 2001, a poucos meses do final do meu mandato como presidente do Conselho de Coordenação (Direção) da Associação Estamos Juntos (AEJ), publiquei na impressa local um manifesto vaticinando que o futuro deste clube passaria, forçosamente, por ter a sua sede social nas Corgas.

                Para trás ficavam quinze anos de história da AEJ, com as suas secções a trabalharem de forma isolada e sem sede comum. Nos primeiros anos, a associação teve apenas duas secções desportivas, natação e basquetebol. Após três épocas desportivas, esta última encerrou e passado uns tempos surgiu a secção de xadrez. É com base no trabalho destas duas secções que a AEJ atravessa a última década do século passado. Com o xadrez a viver em salas emprestadas e a natação a utilizar a piscina para treinos (cada secção reunia os documentos em casa do seu diretor), ressaltavam os resultados desportivos alcançados, que permitiam ter uma máxima incomum “fazer-se muito, com nada”.

Durante estes anos o tronco comum da AEJ era a organização do Campo de Férias Estamos Juntos, que tivera início nas traseiras da Escola Primária do Parque, no ano de 1982. No final dessa década, aproveitando-se o facto do Complexo Desportivo das Corgas ter sido finalizado, este Campo de Férias passou a realizar-se nestas novéis instalações municipais. Pelo meio, para o leitor ter uma ideia da complexidade do clube, surgiu uma secção de automóvel, dando apoio ao piloto local, Pedro Correia. Ou seja, mais uma atividade competitiva que não precisava de partilhar instalações com as restantes secções.

Em 1999 assumi a presidência da AEJ, conforme referi no primeiro parágrafo. O clube passou a ter uma reduzida sede social, alteraram-se os estatutos, criou-se o ficheiro de sócios, realizaram-se Assembleias Gerais duas vezes por ano, mantiveram-se as duas secções desportivas (natação e xadrez), o campo de férias alargou o seu horário para a tarde, diversificando a oferta aos participantes e ainda houve oportunidade para a inscrição da AEJ como associação juvenil, no então denominado, Instituto Português da Juventude.

Aqui chegado, surgiu o manifesto “AEJ clube das Corgas”. Obviamente que para crescer, a associação deveria ter outras instalações, para oferecer outros serviços aos seus sócios e à comunidade local, nomeadamente na criação de secções desportivas. Ao pensar nas Corgas, o objetivo era concentrar nesse espaço a totalidade da atividade da AEJ e aproveitar para lançar sementes para a criação da secção de Ténis, já que existiam courts na cidade e estavam subaproveitados.

                Antes de terminar o meu mandato, a Câmara Municipal de S. João da Madeira acedia ao nosso pedido e cedia umas salas disponíveis no complexo desportivo das Corgas, mais a gestão dos courts de ténis. Apesar de realizado o desejo, já não seria comigo que a AEJ se mudaria para lá. O meu mandato terminava, não me candidataria a novo e entretanto, em Dezembro desse ano houve eleições autárquicas e novo Presidente da Câmara Municipal, o que significou que o processo de mudança para a nova sede demorou um pouco mais. Ainda assim foi bem conduzido pelo meu sucessor, Nuno Fernandes, que após meses de negociações, conseguiu a cedência das instalações atuais, com o alargamento das secções / atividades do clube a estenderem-se ao ténis, capoeira, karting, motociclismo.

                Este enquadramento histórico servirá para o leitor perceber o meu estado de espírito ao longo dos últimos seis anos. Quem me acompanha, na sua leitura semanal, certamente se recordará que a AEJ foi tema recorrente destes artigos. Aqui, fui traduzindo as minhas preocupações sobre a forma como o clube estava a ser conduzido, desde 2012.

Por ser sócio fundador, o que por inerência me permite ser membro do Conselho de Fundadores – que é um dos órgãos sociais do clube, nunca estive totalmente desligado da atividade da AEJ. Confesso que me preocuparam todas as picardias envolvendo as anteriores direções, que levaram ao afastamento de vários elementos: primeiro da secção de ténis, depois da secção de natação, mais tarde do Conselho de Fundadores e finalmente do que sobrava da secção de Natação. De igual modo, também me entristeceu que a AEJ não tivesse honrado os seus compromissos com a Junta de Freguesia de São João da Madeira, falhando na gestão do espaço de fisioterapia e não assumindo os seus erros, preferindo seguir a via litigiosa, em lugar de procurar dignificar o seu nome.

Foi nestas circunstâncias, em que fui convidado para assumir outro cargo nos órgãos sociais do clube, nas eleições decorridas no passado mês de Outubro. Ofereci alguma resistência, impondo algumas condições, uma delas era essencial: não haver conflitos de interesse dos novos diretores, promovendo o seu trabalho em regime de voluntariado em prol da Associação. Nas reuniões de preparação da candidatura, apercebi-me que a AEJ ia mudar. Deixaria de ser gerida por um homem só e passaria a ter uma equipa a tomar decisões. Ponderando tudo, decidi regressar ao associativismo mais ativo, embora limitado pela pouca disponibilidade pessoal.

Para terminar, aproveitando a gentileza do jornal labor, passo a usar o meu novo estatuto de Presidente da Assembleia Geral da AEJ, fazendo um apelo aos sócios que estão afastados do clube, para reconsiderarem e que a sua ligação afetiva à AEJ seja suficientemente forte para voltarem a aproximar-se e envolverem-se no dia-a-dia deste clube de S. João da Madeira. Uma nova dinâmica associativa, aumentará o número de associados e tornará a AEJ mais forte no futuro.

 

(a publicar no dia 17/01/19)

quarta-feira, janeiro 09, 2019

Duas saídas, novas oportunidades

No período de um mês a autarquia teve duas baixas importantes.

Anunciada pela imprensa na semana transata, a renúncia do Vereador Pedro Silva, causou admiração pela sua passagem fugaz pela atividade política. Eleito como quinto elemento na lista vencedora às eleições autárquicas, este Vereador passou como um meteoro pela política local. Sendo um profissional da Educação Física, esperava-se que o seu contributo para o desenvolvimento desportivo da Câmara Municipal de S. João da Madeira, alavancasse a Carta Desportiva do Município e se traduzisse numa significativa melhoria dos níveis de atividade física e desportiva dos cidadãos, em especial, os jovens. Infelizmente, a sua prematura saída, não permitiu perceber qual o seu legado para a cidade.

Aliás, a política desportiva da autarquia continua a basear-se - e bem - no apoio às associações locais, acrescentando-se a necessidade de aumentar (e melhorar) as infraestruturas desportivas, continuando a faltar o vetor de fomento quer desportivo, quer da atividade física da população.

A entrada em funções de Rosário Gestosa, à partida para assumir o Pelouro do Desporto, poderá ser uma lufada de ar fresco, pois à sua experiência como profissional no setor, deve-se acrescentar o seu passado como atleta e mesmo o seu interesse como adepta, o que poderá ser impulsionador de algumas melhorias na política desportiva da autarquia.        

Em contrapartida, a saída em dezembro da Chefe da Divisão Cultural da Câmara Municipal de S. João da Madeira, Suzana Menezes, para uma Direção Regional da Cultura, não é uma boa notícia para a cidade. É certo que o seu vínculo à autarquia, coincidiu com um forte investimento municipal em reabilitação de edifícios históricos da cidade e sua reconversão em espaços culturais. Tudo isto permitiu a recuperação de património industrial, da constituição de núcleos museológicos em torno de produtos icónicos da indústria local, devendo-se listar igualmente a abertura de salas para acolher espetáculos. Suzana Menezes não se limitou a gerir as novas oportunidades, procurou impor programação, com conteúdos diversificados (destaque para a Poesia à Mesa). A longevidade na sua ligação com a Câmara Municipal permitiu-lhe trabalhar com quatro presidentes da autarquia. Ambos os fatores deram um estatuto inédito na autarquia à antiga Chefe de Divisão e a cidade reconheceu o seu trabalho.

Pelo exposto, pode-se perceber que estas duas saídas têm um valor diferente para o funcionamento da autarquia, o que acaba por ser curioso, porque num dos pratos da balança está a definição de políticas municipais e noutro a sua execução (ou um plano bem delineado sem qualquer ligação partidária). Parece claro que a execução tem neste caso um peso mais elevado no quotidiano do município.

É tempo agora de cimentar o trabalho desenvolvido pela Câmara Municipal na área da cultura, nas últimas duas décadas. Devendo-se aproveitar a oportunidade de mudança de agente para apostar: na revisitação do património humano da cidade, incluindo uma pesquisa à arqueologia de ofícios e primitivas formas industriais; no fomento do associativismo exclusivamente cultural; na fidelização de público, para estar presente nos vários palcos dos eventos a promover; na produção sistemática de eventos culturais, tendo como base a população local (tendência nacional, com consequência visibilidade na imprensa especializada); finalizando as hipóteses de melhorias, pela criação de sinergias de programação com os concelhos vizinhos, de forma a atingir uma massa crítica mais numerosa.

      

(a publicar no dia 10/01/19)

quinta-feira, janeiro 03, 2019

Um quarto com vista para a Praça

                A programada intervenção autárquica na Praça Luís Ribeiro tem merecido um debate interessante na imprensa local. Vários conterrâneos expressaram a sua opinião, de acordo com a sua sensibilidade pessoal, muitos recordando a sua vivência em torno do espaço referido e outros tantos, idealizando-lhe um futuro de acordo com conhecimento adquirido ao longo de visitas a outras cidades, quer nacionais ou do estrangeiro.

Sempre olhei para a Praça, desde o lado nascente. A varanda do meu quarto era um bom observatório e dali fui assistindo às transformações da Praça e também da Rua da Liberdade, onde morei.

Cresci com a Praça confinada à meia-lua do lado nascente e atravessada a poente pela estrada nacional número 1 (EN1). Carros a circular, carros estacionados, paragem de autocarros, praça de táxis, comércio variado incluindo pensões, 5 cafés, farmácias, máquinas de diversão, barbearias, garrafeiras, tabacarias, loja de colchões e mobiliário fico-me por aqui para não ser exaustivo, nem omitir alguma memória.

A transformação a que primeiro assisti, foi ao início da construção do edifício Parque América. Até à sua finalização, ficou concluído o fecho a nascente da Praça, de prédios com fachada e altura iguais. No mesmo período, foi demolida a poente, primeiro o andar correspondente à Pensão Sanjoanense e mais tarde o piso térreo, no qual estavam instalados o Café Império e o Café S. João, que ainda funcionaram com as traseiras derrocadas devido às obras do futuro “arranha-céus”.

A abertura do atual IC2, na época o novo troço da EN1 era designado por variante a S. João da Madeira, condicionou o futuro da Praça. Também contribuiu para o seu desfecho, a receção ao Presidente da República de então, Mário Soares, com uma Praça fechada ao trânsito, o que era inédito na cidade.

                O encerramento definitivo à circulação automóvel foi a consequência imediata, juntando-se à nova zona pedonal, uma série de arruamentos adjacentes à Praça. Para o futuro ficariam os problemas de trânsito que ainda hoje perduram, como o condicionamento na circulação nascente – poente, na zona central da cidade, assim como, a transposição norte-sul que é tudo menos linear.

                Através do meu quarto assisti à construção do elemento arquitetónico, à inauguração do Parque América, à transformação da Praça em zona comercial, com animação nas noites de verão, até que um dia, deixei de ali viver. À distância, tomei conhecimento das obras enlameadas, do nascer dos chapéus de vidro, ao aumentar a zona pedonal para ruas sem comércio e o transtorno causado a todos, comerciantes, prestadores de serviços e moradores, teve o desfecho de desinvestimento e de mudança de residência.

                A descentralização, com toda uma política centrifuga promovida pela Câmara Municipal
durante a primeira década do presente século, transformaram a Praça num local decrépito. Vazio de dia e também de noite. Houve uma tentativa mal conseguida, por ser pouco ambiciosa em cortar com o passado, de revitalização, com a criação de estacionamento e a reposição de trânsito mas, uma má escolha de materiais, obrigou a nova intervenção e não houve oportunidade para pensar melhor na zona central.

                No ano que passou, voltei a acordar na Rua da Liberdade. Já sem “pirilau”, voltei a espreitar a Praça, como na minha infância. Ao ver o raiar do sol, a iluminar a rua até ao centro e a aquecer a calçada, ganhava alento para enfrentar o frio do Inverno e o pesadelo familiar. Em noites mal dormidas, voltei a ouvir aquele silêncio matinal, entrecortado pelos barulhos do abrir de persianas, das portas e portões de segurança dos comerciantes e com tudo isto, escutei o cumprimentar e o falar dos madrugadores.

Esta perspetiva pessoal é a forma como eu vejo a Praça, a meia-lua fechada ao trânsito, estendendo-se a interdição à parte superior da Rua da Liberdade, à Rua Padre Oliveira e ao largo Santo António. Para o seu lado poente, sou a favor da reposição automóvel, isolando o Parque América, permitindo os carros circularem em sentido único. No fundo, sou a favor do projeto aprovado pelo executivo municipal anterior, por entender, que os seus autores perceberam a essência da história da Praça e em certo ponto, da cidade. Ajustar a zona pedonal, atendendo à realidade económica da cidade e de certo modo, repor o princípio geométrico da Praça seria algo a atingir.

A reversão do conceito pelo atual executivo é uma outra forma de ver o problema. É querer esticar para o futuro uma conceção que infelizmente a cidade não conseguiu abraçar, em que a dinâmica económica retirou protagonismo comercial à zona central da cidade, transferindo-o para o eixo da Avenida Renato Araújo.

O dia-a-dia da Praça é com os seus poucos moradores, um comércio de proximidade e despojada de serviços. Esta realidade vai sendo invertida pontualmente com animação promovida pela Câmara Municipal. A projetada intervenção, pouca atratividade trará, perdendo-se com isso a possibilidade de revitalização do espaço, que dependerá sempre da complementar iniciativa privada.

Gostaria de viver anos suficientes para ver um final de tarde de Inverno, com os raios solares a bater na janela no meu quarto de infância. Sei que mesmo que isso aconteça, em consequência do processo de desocupação do prédio monstruoso da Praça, o acesso a esse lar já não me será permitido. Quando voltar haver invernos solarengos na Praça, será o momento para pensar-se em fechar a meia-lua e promover-se uma Praça circular.

         

(a publicar no dia 04/01/2019)