terça-feira, abril 30, 2013

Turismo complementar

O Turismo Industrial, lançado nos últimos anos pela Câmara Municipal de S. João da Madeira, evoluiu da fase embrionária - com a criação do conceito, a adesão de empresas, o estabelecimento dos circuitos pelo património industrial, até uma nova fase, de aproximação da cidade ao conceito turístico, transformando as empresas em palcos de concertos, ou em locais onde se declamou poesia e claro, dando oportunidade aos seus trabalhadores de exprimirem as suas capacidades artísticas, como foi o caso do grupo coral da Heliotextil.
Os números divulgados, por ocasião do primeiro aniversário do Turismo Industrial, permitem classificar esta iniciativa de sucesso, com nota muito boa. No entanto, está por estudar o impacto deste turismo na economia local, nomeadamente ao nível dos canais tecnicamente designados por HORECA – Hóteis, Restaurantes e Cafés. Sem esquecer o comércio, de qualquer tipo.
Existe uma barreira entre o Turismo Industrial e o turismo familiar, que apenas aos fins-de-semana e nas suas férias tem oportunidade de viajar - dispondo de tempo para visitar outros locais. A incompatibilidade de horários é um problema.
O grande objectivo do turismo é atrair mais visitantes à cidade.
Para isso é necessário criar um efeito diferenciador, com base em harmonia entre as iniciativas a promover e o conceito turístico.
É sobre este eixo que é necessário complementar o conceito de turismo industrial. Suportando-se no posicionamento exclusivo do conceito e dos vários produtos. A tradição industrial do concelho, os seus produtos esquecidos na história: cera, máquinas de costura, banheiras, torneiras, colchões, além dos artigos de chapelaria, passamanarias e calçado, entre outros, permitem alargar o envolvimento comunitário, potenciando qualquer evento de recriação histórica que se ouse organizar. Para se conseguir uma cobertura mediática positiva, é preciso um certo exotismo, algo conseguido com a utilização maciça pela população de um dos produtos exclusivos atrás mencionados, por exemplo, os chapéus.
A extensão do conceito de turismo industrial à gastronomia tem sido utilizado, através da realização de um festival num único fim-de-semana, no entanto, seria preferível incluir na ementa semanal de alguns restaurantes, tal como é utilizado, com outros pratos típicos da região. A oferta gastronómica pode ser desenvolvida com inovação, com a introdução na comunidade de nomes dos produtos industriais. Exemplificando, as pastelarias locais poderiam concorrer para a criação de bolos chamados capeline ou tamanquinhos, de tamanho apropriado, com formatos iguais aos produtos.
Em matéria de novas “portas” de entrada na cidade, utilizando-se as potencialidades do concelho, em tempos idos, confidenciei a pessoas amigas um conceito a explorar, directamente ligado ao turismo do conhecimento. Relacionava-se com a instalação de um borboletário nos jardins do Palacete dos Condes, propondo ainda uma ala para estudo das traças, essa praga associada ao têxtil e obviamente à chapelaria.
O conceito de turismo na natureza, em ambiente urbano, poderia desencadear através de uma parceria, com um investidor privado, na criação de uma pista permanente de downhill na zona dos antigos moinhos de Casaldelo, podendo-se estender os divertimentos a slide assim para o gigantesco, aproveitando-se a encosta deste lugar para nascente.  
Ideias desenvolvidas nos últimos meses, que optei por divulgar em exclusivo aos leitores do labor e que completam os meus textos alusivos ao turismo, que fui publicando neste jornal.
 
(a publicar no dia 02/05/2013)

quarta-feira, abril 24, 2013

Memórias de um escritor

            Regressei a Aquilino Ribeiro.
Tinha obtido como referência tratar-se de uma obra imperdível - Um escritor confessa-se. Num final de noite, procurei-o na prateleira da sala lá de casa, na colecção de obras completas do escritor. Uma colectânea de romances, todos com a mesma capa castanha, com a lombada em numeração romana, distinguindo-se assim uns dos outros. Para obter o título de cada volume, tive que abrir a capa, para verificar no interior o seu nome. Um por um, procurei em vão. Voltei passado uns dias, com mais tempo e continuei sem sucesso. Não tinha visto mal e afinal faltava ali um importante título da obra de Aquilino Ribeiro.
Mal tive oportunidade, requisitei-o.
Uma das primeiras edições, de 1972, de tiragem reduzida, 350 exemplares, vendidos a duzentos escudos cada. 
No final do primeiro capítulo, percebi logo o que tinha entre mãos. Duma assentada, fiquei preso ao enredo da biografia do escritor. A sua autobiografia, os seus passos na sua instrução, a sua desilusão no seminário, os primeiros dias em Lisboa, o regresso à serra da Nave, de volta à Lisboa pré-republicana, a sua prisão e desterro à espera da revolução de 1910. Um consolo.
Em menos de quatro dias, mesmo cumprindo as minhas obrigações profissionais, pessoais, sociais, domésticas e claro, familiares, sorvi as palavras de Aquilino Ribeiro, mesmo aquelas que o caracterizavam, os neologismos, ou o seu português arcaico de inspiração popular. A coragem demonstrada em campanha revolucionária, a audácia na fuga da prisão e posteriormente o desmascarar dos hipotéticos regicidas são um excelente exemplo da capacidade narrativa do escritor. A isto junte-se o período em Beja, o regime hipócrita do seminário e a sua evidente falta de fé. Os argumentos teológicos expostos e a capacidade de os contrapor, através da metafísica, demonstravam a sua capacidade de estudo, de assimilação e oratória. Uma verdadeira tese, sempre importante para todos os que começam a ter dúvidas.
Outra vantagem de ler Aquilino, é ter um contacto com a evolução social e histórica das aldeias portuguesas, é perceber como durante séculos, nenhuma evolução por ali existiu, nada aconteceu, nem uma estrada foi construída a ligar as aldeias entre si, ou às vilas sede concelho. Perceber isto, é entender as rivalidades entre “os povos de cada aldeia”, segundo palavras do escritor.
Pelo meio da leitura, fui bombardeado pela notícia da semana: a saída do Dr. Castro Almeida para o Governo.
(Isto entra um pouco à pressão.)
Vão ser feitos vários balanços: as obras herdadas e concluídas, as obras lançadas e concluídas ou quase, pois também as há, assim como, as lançadas e não começadas, onde destaco a nova piscina interior.
Nem só de obra se faz um balanço do mandato agora interrompido.
Para quem, como eu, escreveu várias vezes, argumentando o melhor que sabia, opondo-me a algumas medidas, criticando opções, estudando e apresentando alternativas, lutando contra o unanimismo, nunca tendo sentido qualquer agressividade por parte do executivo, nem dos militantes do partido do poder autárquico, só posso realçar a convivência democrática.
A causa pública é assunto recorrente dos meus textos, a vontade em fazer-me ouvir, sem ninguém temer, permitem-me verificar que as palavras dos mestres da literatura nacional, que tanto aprecio, foram assimiladas a preceito.
 
(a publicar no dia 26/04/2013 )
 

quarta-feira, abril 17, 2013

Adeus Leopold Bloom

Aquela noite de 16 de Junho de 1904, tive-a entre mãos durante mais de cem noites. Todo o inverno, incluindo a quaresma, mais uns dias chuvosos a seguir à Páscoa. Noites essencialmente frias, aquecidas a chá, ou a café, com os olhos postos naquelas páginas. Linha após linha, sem grandes avanços, com o marcador fixado na mesma zona do livro. Virava uma folha, lia mais uma página, o marcador avançava esse tanto. Sozinho no estabelecimento comercial, deambulando pelas ruas de Dublin, elegi para bebida o Irish Coffee, mais apropriado à temperatura da narrativa. Sorvia o líquido, ficaram sempre as natas.
Adeus Shane Macgowan. Ébrio esquecido da adolescência. Agora com dentes novos e barriga saliente, a cantar sentado, sobriamente soletrando todas as silabas das canções. “Dirty old town” é uma memória desse período da vida, não a letra, com os acordes e arranjos musicais, é pelo contrário, toda a minha envolvência urbana, em ruas escurecidas, envolvidas pelos papéis, beatas e outras coisas deitadas para as calçadas, as paredes desbotadas, esburacadas e urinadas, velhos prédios com portas abertas libertando a humidade da escadaria para a rua. Adeus ruivos, adeus duendes, adeus O’Hara, O’Sullivan, O’Neill, O’Connor, O'Brien, Byrne, adeus gente vestida de verde, de copo na mão, entoando: “I am going where streams of whiskey are flowing”.
Adeus Trapattoni, velho crente. Fiquei agarrado uma noite a seguir a um jogo de futebol da Irlanda com a França, falseado pela mão de Thierry Henry, como se o italiano ainda estivesse em Lisboa. Não julguem que foi pela crença do italiano. Ainda não fiz a estrada de Damasco. Anúncio publicitário: Visite a Síria, se tiver dúvidas teológicas ou mesmo ideológicas, percorra a nossa estrada mais famosa. Vindo de Tarso, Saulo transformou-se em Paulo, o mais famoso convertido. Ainda temos explosões e clarões. Fim de anúncio.
A edição pela qual segui a noite de Leopold Bloom, dividia-se em 3 partes. Não tinha explicitamente os 18 capítulos. Tornou difícil a leitura. Requisição, prazos de entrega não cumpridos, mais uma requisição, cartas da bibliotecária informando prazo ultrapassado, tudo regularizado, até à leitura final. Uma odisseia literária. De ilha em ilha, até aos braços de Penélope e ao seu monólogo interior. Capítulo por capítulo, com os estilos de narração diversificados, os passos por Dublin de Leopold, os seus encontros com outros personagens, Stephen Dedalus, entre outros, e um final arrebatador com Molly Bloom e o seu Sim.
Adeus Joyce, James, escritor de Dublin, de Trieste, Paris e Zurique. Irlandês, portanto. Referência literária que só agora tive oportunidade de devorar. A fonte de muitos prosadores, o escritor eleito para tantos.
Adeus Leopold Bloom, judeu convertido ao catolicismo, irlandês indiferente ao nacionalismo, publicitário de profissão - o anti-herói, personagem principal do livro que me preencheu o inverno.
Adeus Ulysses. Voltar-nos-emos a encontrar. A próxima vez será na Odisseia, na de Homero. Com cantos explícitos, personagens e episódios da história da literatura, pelas ilhas e batalhas helénicas. Até ao regresso a Ítaca de Ulisses.
 
(a publicar no dia 18/04/13)
 
 

quarta-feira, abril 10, 2013

Um produto integrado de Turismo

Coloquei duas questões nas páginas do labor da semana passada, referentes ao Turismo da região do Entre o Douro e Vouga, prometendo responder-lhes na presente edição: Existem produtos estratégicos para ocupar um turista durante pelo menos um fim-de-semana? Existem produtos regionais para serem comprados pelos turistas, incluindo produtos gastronómicos?

Pode-se responder a ambas as questões, enumerando os pontos de interesse turístico dos vários concelhos, integrantes da região.

Assim, temos em Santa Maria da Feira: o altaneiro castelo, uma aldeia típica nas margens do Douro, os núcleos museológicos do papel e da cortiça, o exotismo ornitológico em Lourosa, o centro de ciência Visionarium e o castro de Romariz. Como oferta de produtos para os turistas, temos a doçaria regional, onde se destaca a fogaça.

Em Arouca temos o convento com o Museu de Arte Sacra, as águas do rio paiva e dos seus afluentes, o geoparque com as suas trilobites e as pedras parideiras, os passeios pedestres, a serra da freita, as aldeias típicas em xisto. A raça bovina arouquesa é o principal atrativo gastronómico do concelho, complementando-se com os doces conventuais, incluindo um pão-de-ló curiosamente húmido.

Em Vale de Cambra é menor a oferta turística, aldeias com casas de xisto onde existem percursos pedestres e praias fluviais a merecerem o maior destaque.

Oliveira de Azeméis esqueceu-se de modernizar o conceito da Casa Ferreira de Castro, no entanto, através de um produto regional único, o pão de Ul, tem sustentado a sua oferta turística. Primeiro através do parque molinológico, instalando percursos pedestres na povoação e mais tarde, transformando Ul em aldeia típica de Portugal.  

S. João da Madeira oferece o Museu da Chapelaria, os seus circuitos pelo património industrial e claro, a venda de alguns produtos incluídos neste conceito turístico.

Uma vasta oferta turística, todos juntos, os concelhos podem ser um produto de integrado turismo: património militar, histórico e religioso, turismo na natureza, núcleos museológicos, centro de ciência e conhecimento, além dos inovadores conceitos de turismo industrial e turismo educativo, este invocado pelo geoparque. Tudo encaixado pela oferta gastronómica da região, como atrás referido.

A proximidade geográfica permite a um visitante completar o seu programa de fim-de-semana, procurando outras experiências turísticas, com curtas deslocações e enriquecendo o seu tempo de lazer. Para isso, é necessário criar um conceito regional comum em termos de turismo, para os cinco concelhos do Entre o Douro e Vouga, à semelhança do trabalho a ser desenvolvido pela ADRITEM – associação de desenvolvimento rural integrado das terras de santa maria. Nada serve ter conceitos inovadores, senão tiverem escala. A escala regional só se adquire com objetivos comuns. Uma nova dinâmica para a Associação de Municípios desta região, que pode ser enquadrada num futuro quadro comunitário de apoio e daí se conseguir o financiamento necessário para articular o turismo regional e dotá-lo de outra dimensão.

O texto já vai longo e por isso, a parte final desta dissertação sobre turismo, precisamente sobre a capacidade do Turismo Industrial se tornar ele próprio um produto integrado, ficará para uma próxima oportunidade. 

 

(a publicar no dia 11/04/13)

 

quarta-feira, abril 03, 2013

Turismo Regional

            A semana passada nas páginas do labor dissertei sobre o Turismo Industrial. Essencialmente, focando a necessidade deste produto ganhar escala, a nível da entidade regional de turismo onde o concelho está inserido, o Porto e Norte de Portugal.

            No enquadramento temático apresentei vários produtos estratégicos de turismo. Nesse texto genericamente demonstrei esses produtos, não entrando em pormenores exemplificativos por região, associação de municípios, ou mesmo por concelho.

           Ao turista, depois de se decidir por um destino, surgem sempre quatro questões: onde dormir? Onde comer? O que fazer? E o que comprar?

            Há concelhos pela sua capacidade de oferta, que respondem bem a todos estes requisitos. Outros estão mais limitados, servindo-se da vizinhança para completar a oferta.

            Exemplificando, com um pequeno passeio familiar, no nosso país. Uma manhã acordei em S. Martinho do Porto, percorrendo a enseada pela marginal. Desloquei-me para o interior, fazendo logo em Alfeizerão uma paragem para a obrigatória compra de pão-de-ló. Retomando a estrada em direção a Alcobaça, fui verificando a herança paisagística da ordem beneditina. Já na cidade, investi no mosteiro, visitando-o, revisitando os túmulos de D. Pedro e D. Inês de Castro. No exterior verificava a evolução turística da praça, as esplanadas envolventes, os arruamentos arranjados, espreitando no outro lado da colina a torre de prospeção petrolífera. Entretanto, a família entrou numa loja de produtos locais. Artesanato, acessórios de moda, louças, artigos de decoração, entre outros. Compra-se isto e aquilo.

O passeio prosseguiu tendo como destino a Batalha. Mais um Mosteiro, com pormenores arquitetónicos peculiares, vestígios históricos e explicações da dinastia de Avis, completavam a oferta dos túmulos da enclítica geração, ladeados pelos dos seus progenitores. Almoçamos ao ar livre, com vista sobre a estátua do Rei D. João I. Depois foi seguir para o Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota. O guia fez a receção histórica, encaminhou-nos para o auditório onde foi exibida a recreação explicativa da batalha. No exterior, percorremos o quadrado, a ala dos namorados, até alcançarmos a capela prometida, em caso de vitória, pelo Condestável, o Santo.

De regresso à viagem pelo automóvel, rumei para o interior. Passei ao largo de Porto de Mós, vendo ao longe as particularidades do castelo. Naquele momento só me interessava atingir Mira de Aire. Aguardamos pelo momento da descida às grutas e percorrendo os mais de 600 degraus, deslumbramo-nos com as paisagens subterrâneas. No final, a proximidade a Minde, obrigou a uma visita rápida ao seu mar, em época estival, sem qualquer vestígio de água.

Por ser domingo, o resto da visita foi adiada. Um dia retomarei Tomar (bela redundância), visitando os vestígios dos Templários, seguirei para Ansião para visitar os fósseis marinhos, continuarei para Penela, onde além dos sinais do passado humano, será obrigatório comprar um queijo do Rabaçal e terminarei o passeio em Condeixa, visitando as ruínas romanas em Conímbriga, procurando um pouco mais a sul, as Buracas do Casmilo, pelo seu valor geológico e paisagístico.

Em quatro parágrafos, fiz referência aos produtos estratégicos da região Oeste e Centro. Paisagens, património histórico e religioso, particularidades da natureza são os motivos da visita; produtos gastronómicos e outros produtos regionais são a oferta para venda. Verificando-se como a proximidade entre concelhos pode ajudar a complementaridade na escolha de um itinerário turístico.

Estes concelhos, por terem pontos em comum, promoveram uma estratégia de desenvolvimento regional ao nível turístico.       

            Neste ponto, é importante fazer a reflexão da capacidade turística da região Entre Douro e Vouga. Reconhecendo que ao nível da restauração e hotelaria, existem várias ofertas, praticamente para todos os bolsos.

            Convém então lançar a seguintes questões:

Existem produtos estratégicos para ocupar um turista durante pelo menos um fim-de-semana? Existem produtos regionais para serem comprados pelos turistas, incluindo produtos gastronómicos?

Estas e outras questões merecerão uma resposta na próxima edição do jornal labor. Na qual, procurarei ainda justificar como o Turismo Industrial terá capacidade para se tornar um produto integrado de turismo.

 

(a publicar no dia 04/04/13)