quarta-feira, dezembro 04, 2013

Aquilo que não escrevi

 

            Ao ler o jornal da semana, não deixo de espreitar a página da necrologia. Ao deparar com uma fotografia, um nome, de alguém conhecido, de quem não fui informado do óbito, não deixo de expressar a surpresa.

            A particularidade de antever textos para a edição da semana seguinte, coloca-me perante o desafio de alinhavar umas linhas, ao jeito de homenagem para com um desses falecidos - o obituário com o meu cunho.

            A atualidade sobrepõe-se, na maioria das vezes, ao texto imaginado e adio a referência, escrevendo um texto diferente do inicialmente previsto, deixando para uma melhor oportunidade as palavras de tributo. Por vezes, sucedem-se os outros assuntos e as semanas passam, ficando tais textos por editar.

            Não vão enumerar as minhas omissões.

As publicações de agências funerárias de freguesias vizinhas, permitem recolher informações sobre muitos dos que por S. João da Madeira trabalharam.

Descobri outro interesse, nessas publicações.

A divulgação de nomes de lugares ou de ruas das freguesias vizinhas, que para a maioria dos leitores nada significa. A utilidade dessa informação é poder cruzar com outros dados de pesquisas históricas, a que me dedico de forma atabalhoada e por auto recreação, servindo muitas vezes, para explicar a toponímia da cidade, a sua história, a origem de alguns vocábulos, que por vezes, serviram para batizar lugares e as próprias localidades.

Ninguém se deve lembrar de um texto meu, intitulado Ascarigo, publicado a 19/01/2012. Resumidamente, nesse texto, mencionava que as Inquirições de 1251, no reinado de D. Afonso III, referem a existência de uma ponte terrenha em Ascarigo, aqui em S. João da Madeira.

Ascarigo, pelo que eu conheço de S. João da Madeira, seria um lugar cujo nome se perdeu com o tempo. “Asks” refere o historiador José Mattoso, remetendo para um estudo etimológico, é um prefixo bélico – heroico de origem germânica, significando lança de freixo.

E escrevi mais uma linha de considerações, pensando que o nome do lugar poderia ter evoluído, ou adaptando outro nome, ou eliminando a forma germânica, sugerindo implicitamente o uso popular da designação mais simples para o atual lugar da Ponte.    

Uma possível forma de evolução de Ascarigo, seria Escarigo, existindo, na época em que escrevi o texto, duas freguesias em Portugal com esse nome.

Algumas pessoas tentaram-me convencer que Ascarigo teria evoluído para Escariz e que eu estava errado na análise. Acontece que as mesmas Inquirições também referem aquela freguesia de Arouca, sem relacionar obviamente com S. João da Madeira.

Este ano, descubro nas referidas páginas de necrologia do jornal labor, a existência de uma rua em Milheirós de Poiares chamada precisamente de Escarigo. Pelo que pude perceber situa-se no lugar de Pereiró.

A proximidade deste Escarigo a S. João da Madeira permite relacionar os dois dados e claro, deduzir tratar-se do mesmo Ascarigo, mencionado nas Inquirições de 1251.

Este dado é interessante em termos históricos, para perceber qual o traçado da estrada real, ou mesmo da via romana, que atravessava S. João da Madeira, o que poderá ser útil para o estudo da evolução da povoação ao longo dos anos.

De qualquer forma, sem prejuízo para a freguesia vizinha, depreende-se do documento histórico, que os limites das duas freguesias, em Terras de Santa Maria, nem sempre foram os atuais.   

            Um argumento que poderia ter sido útil, nos dias que se seguiram ao referendo organizado em Milheirós de Poiares no ano passado.  

 

(a publicar no dia 05/12/13)